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A revisão do decreto de prisão preventiva

Se o debate leigo, emocional e sem juridicidade, se presta a olhares aleatórios e tendenciosos, imperativo que as expressões do Direito reposicionem as discussões, focando-as em seus aspectos fundamentais.

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Atualizado às 10:12

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Disposição recente do Código de Processo Penal determina que o órgão emissor da decisão que decreta prisão preventiva deverá revisar a necessidade de sua manutenção a cada noventa dias, sob pena de tornar a prisão ilegal (art. 316, CPP, redação dada pela lei 13.964/19).

A aplicação desse dispositivo em caso concreto despertou discussões e críticas, como se tivesse surgido permissão legal para que criminosos agora se tornem imunes à prisão, e mesmo nos meios jurídicos se coloca a regra como salvaguarda contra privação preventiva da liberdade. Particularmente penso que se trata de norma menor, detalhismo da lei em questão com proteção constitucional muito mais ampla e legítima, que é o princípio constitucional da presunção da inocência.

Trata-se somente do reconhecimento de que qualquer prisão anterior a uma condenação definitiva é excepcional e que o processo penal serve exatamente para definir a culpa do agente e permitir sua punição nos limites da lei.

Entende-se que para a população em geral essa expressão legal e interpretações favoráveis aos acusados pareçam indevidas ou injustas, muito embora outra deva ser a dimensão do debate.

A presunção de inocência protege a todos porque exige um processo regular e concluído como premissa para uma punição. Não é, todavia, obstáculo a prisões cautelares, dado que permite exceções e pode e deve ser usada nas situações definidas na lei que tornem necessária essa cautelaridade.

Normas como esse artigo do CPP apenas ensejam engessamento do sistema, traduzindo em números uma ideia, maior, de que deve essa prisão perdurar exatamente o tempo necessário e compatível com sua natureza provisória. Detalhar essa ideia só traz prejuízos, viabilizando leituras equivocadas e gerando dúvidas diversas, como relacionadas à competência para esse juízo revisor e sugerindo que, dentro do prazo legal, está assegurada a legalidade, a qual pode ainda ser renovada, incontáveis vezes, perpetuando o que é temporário.

Se o debate leigo, emocional e sem juridicidade, se presta a olhares aleatórios e tendenciosos, imperativo que as expressões do Direito reposicionem as discussões, focando-as em seus aspectos fundamentais.

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 *Mauricio Lins Ferraz é advogado criminalista. Fundador do escritório Lins Ferraz Advocacia.

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