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Inconstitucionalidade das multas de trânsito eletrônicas

Uma vez mais lesiva e dolosa a conduta do Estado que mantém o cidadão no radar e afugenta milhares de interessados em frequentar locais turísticos e até mesmo entretenimento e lazer.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Atualizado às 14:46

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O Planeta Terra foi literalmente solapado em razão da pandemia, muitas mortes e destruições evidenciando a calamidade das políticas públicas de saúde e a necessidade de refletirmos sobre mudanças e implantá-las conforme os anseios da sociedade. No entanto, na contramão da história o Estado Brasileiro, em pleno caos, obcecado pela ideia de arrecadação, nos três níveis, com aumentos de impostos e demais tributos, não se deixou de lado o comportamento sempre presente das famigeradas multas de trânsito.

Somente para que se tenha uma ideia a Prefeitura de São Paulo arrecada anualmente 100 bilhões de reais, é lerda ao apreciar os recursos administrativos e contemporaneamente impregnou o sistema digital de multa, em poucos dias o interessado pode acessar porém a inconstitucionalidade é aberrante e salta aos olhos. Em primeiro lugar ocorre absoluta falta de transparência, não há foto do local e sequer de circunstâncias ligadas ao padrão do motorista ou condutor, as notificações virtuais não podem prevalecer e mais grave ainda a indústria de multa é um fator que tornou infernal a participação da indústria automobilística no país.

Ao comprar um veículo o cidadão paga metade do preço em tributos, faz o licenciamento, é obrigado a pagar IPVA anualmente, zona azul e multas de trânsito, pesado custo no bolso que tem feito a modificação do comportamento do cidadão o qual prefere usar da mobilidade ou mesmo locar veículos. A política estatal de transformar não apenas o carro, mas também a propriedade privada em sinal de arrecadação desmesurada contempla um ambicioso plano de distanciamento da sociedade dos seus bens essenciais. E qual o fundamento da maioria das multas dirigir a 40 ou 50 km/h em perímetro urbano no qual há faixas para bicicletas, passam caminhões, ônibus e motos, o que mais uma vez encerra a total desagregação do transporte e aquele ainda incipiente qual seja o transporte público.

Não se perca de vista que diante de um meio modal público precário e de valor elevado o cidadão não pode fugir da segurança do carro. As multas eletrônicas lançadas no sistema aderem à sinalização da total perda de espaço do papel, acontece, porém, que muitos estados da federação ainda não estão dentro do convênio o que impede descontos de até quarenta por cento no valor da infração. Resumidamente, portanto, gritantes são as inconstitucionalidades das multas de trânsito eletrônicas, a saber pela falta de transparência, ausência de comprovação, exiguidade documental, prazo de apresentação defesa, transformando tudo na ambiciosa pretensão do agente estatal de querer manter a indústria da multa em detrimento da cidadania e correndo o risco o infrator de perder sua carteira em total descompasso com as alterações do Código de Brasileiro Trânsito. E mais delicada ainda a situação de aderir ao sistema apenas e tão somente para suprir o envio da multa em papel e recursos, mas não permitir que os descontos sejam automaticamente praticados.

Uma vez mais lesiva e dolosa a conduta do Estado que mantém o cidadão no radar e afugenta milhares de interessados em frequentar locais turísticos e até mesmo entretenimento e lazer. A Prefeitura de São Paulo terceirizou o sistema da zona azul, agora toda a cidade virou uma praça de pagamento, no qual para estacionar você precisa pagar e um viatura passa constantemente para flagrar a infração e lançar no sistema. Não há estacionamento público de prédios verticais, tudo a favorecer a indústria da multa e tornar o cidadão, não bastasse a pandemia, refém da conduta do gestor público que durante a campanha fala algo, porém após eleito aumenta salário e retira direitos adquiridos da terceira idade.

Não é sem razão que no primeiro mundo as velocidades são bem superiores e na Europa e EUA as estradas são de velocidade acima de 200 km/h, disse Collor que tínhamos carroças na década de 90. Hoje a indústria, que começa a sair com razão do Brasil, fabrica e importa potentes máquinas, mas não se esqueçam temos que dirigir a 30 ou 40 km/h pela conveniência exclusiva do gestor de querer multar, além do que muitas vias em São Paulo, por causa das chuvas, viraram crateras, buracos que tem o condão destrutivo nos veículos.

Agora que chegamos ao ponto de um carro de boa qualidade as ruas são de péssimo padrão e as estradas não nos permitem velocidade acima de 120 km/h, tudo a significar que estamos bem longe do padrão internacional e continuaremos enquanto a sociedade organizada não agir e o Ministério Público, até com instauração de CPI para debelar a indústria da multa, sendo meros cidadãos de segunda ou terceira classe para pagar as despesas do Estado e salários absurdos dos nossos governantes. O Estado brasileiro é nossa pandemia, adoeceu e ao invés de reduzir a carga tributária para ajudar empresas e corrigir a tabela do Imposto de Renda em apoio ao cidadão marcha para enterrar as chances e oportunidades de um autêntico e verdadeiro Estado Democrático de Direito, cometendo injustiças para explorar 365 dias por ano e 24 horas/dia sem oferecer serviço público de qualidade, o indefeso estigma da cidadania.

 

Carlos Henrique Abrão

Carlos Henrique Abrão

Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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