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A dívida condominial exclusiva da construtora: Uma exceção à regra propter rem

O proprietário não é considerado condômino antes da efetiva imissão na posse do imóvel com a entrega das chaves. Logo, o imóvel adquirido diretamente da construtora não pode sequer ser penhorado por dívida condominial exclusiva desta.

segunda-feira, 1 de março de 2021

Atualizado às 09:11

 (Imagem: Arte Migalhas.)

(Imagem: Arte Migalhas.)

É comum nos depararmos com o seguinte caso: após um cliente comprar um determinado imóvel diretamente da construtora e se mudar para este novo bem, receber uma cobrança do condomínio das cotas condominiais em atraso e relativa ao período anterior a entrega das chaves e da efetiva imissão na posse do imóvel.

É importante ressaltar que a responsabilidade do novo proprietário do imóvel pelas cotas condominiais somente se inicia a partir da imissão na posse, consubstanciada com a entrega das chaves, sendo, portanto, inadmissível lhe atribuir a responsabilidade pelos valores relativos ao período quando ainda não era possuidor do imóvel, ou melhor, não era sequer condômino. Trata-se de uma exceção à obrigação propter rem que onera a unidade condominial. Assim sendo, no caso supracitado, a dívida anterior a imissão da posse no imóvel e da entrega das chaves é exclusiva da construtora.

De fato, o responsável pelo adimplemento das despesas condominiais é o condômino, ou seja, aquele que tenha a posse direta da unidade condominial. Esse conceito é extraído dos artigos 1.335 e 1.336 do Código Civil.

Segundo a primeira das regras mencionadas são direitos do condômino: "usar, fruir e livremente dispor das suas unidades" (inciso I); "usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores" (inciso II); "votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite" (inciso III). Já pela segunda das regras são deveres do condômino "contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas funções ideais, salvo em contrário na convenção" (inciso I).

Logo, conclui-se que o pagamento das despesas condominiais é obrigação exigível daquele que tem a posse direta do bem para que possa dele usar e fruir.

A condição de condômino não é automaticamente adquirida pela mera celebração de um compromisso de compra e venda, mas decorre da assunção da posse direta, permitindo o pleno exercício da seara de direitos inerentes as unidades autônomas que integram o condomínio, impondo, inclusive, o dever de contribuir para as despesas.

O jurista João Batista Lopes relembra que "a obrigação de pagar encargos condominiais decorre do só fato de o condômino integrar o universo condominial". E para J. Nascimento Franco, é a posse direta que torna o comprador responsável pelas despesas de condomínio.

É pacificado o entendimento jurisprudencial no Brasil de que é a efetiva posse do imóvel, com a entrega das chaves, que define o momento a partir do qual surge para o condômino a obrigação de efetuar o pagamento das despesas condominiais.

Como o novo proprietário não é considerado condômino antes da efetiva imissão na posse do imóvel com a entrega das chaves, o imóvel adquirido diretamente da construtora não pode sequer ser penhorado por dívida condominial exclusiva desta. 

Destarte, podemos afirmar que esta exceção à regra propter rem, impede também a penhora do imóvel por dívida exclusiva da construtora, ou seja, pela dívida condominial anterior a entrega das chaves e imissão na posse do imóvel pelo proprietário.

Gabriela Araujo Sandroni

Gabriela Araujo Sandroni

Advogada. Mestre em Estudos Internacionais pela UPV/EHU na Espanha, e especialista em Direito Europeu e em Direito Tributário pela Universidade do Minho em Portugal. Licenciada em Direito pela UMinho.

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