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Um ano de vigência da nova Lei de Franquia Empresarial

Pontos importantes no suporte jurídico da atividade da empresa franqueadora.

quinta-feira, 8 de abril de 2021

Atualizado às 16:55

O franchising (franquia empresarial) está sempre em expansão (aliás, importante expressão para o segmento). Este sistema é desenvolvido visando a autorização de uso marcas e outros objetos de propriedade intelectual, de propriedade de uma determinada empresa franqueadora ao franqueado (normalmente escolhido respeitando um perfil pré-fixado), juntamente com o direito de administração do negócio ou sistema desenvolvidos ou detidos pela franqueadora, com distribuição exclusiva ou não exclusiva, de produtos ou serviços (pode-se ter, ainda, o direito de uso de tecnologia de implantação e administração de um sistema operacional e outros elementos, variando de negócio para negócio), sempre mediante remuneração, direta ou indireta, por meio de taxas cobradas pela franqueadora e pagas pelo franqueado (art. 1º da lei 13.966/191 2).

Para exercer estas atividades, a empresa franqueadora certamente deve atuar por meio de seu corpo estruturado, contanto com devido apoio estratégico administrativo, financistas, estruturas de recursos humanos, operações e logística, dentre outros. E, naturalmente, deve a franqueadora contar com devido suporte técnico contábil ou jurídico. Seja uma empresa já franqueadora, seja uma empresa que se busca franquear a atividade percorrerá caminhos menos espinhosos. Este é o tema que pretendemos aqui tratar.

Primeiramente, é sempre importante ter em mente a distinção de que a atividade do franchising não necessariamente guarda relação direta com a atividade que se pretende (ou já se faz) franquear. Ou seja, uma franquia de corte de cabelo infantil não é gerida ou tem a mesma estrutura jurídica ou forma e tipo de preocupações com pontos que requerem atenção como um salão de cabelereiros. Mesmo raciocínio vale para imobiliárias (vender franquia de imobiliária não é a mesma coisa que ter ou gerir uma imobiliária), ou para uma loja de roupas ou produtos alimentícios (a venda do produto tem outra lógica comercial em oposição à venda de franquias de lojas de roupas ou produtos alimentícios).

Com isso, destacamos de pronto plano que a franquia empresarial é um segmento que possui uma estrutura de conhecimentos e aplicação lógico-jurídica complexa, exigindo que para além da garantia de uma eficaz formatação jurídico documental do negócio franqueado, para a gestão das atividades da franqueadora, é importante que o apoio das decisões ordinárias e extraordinárias, de cunho estratégico, seja profissionalmente adequado, realizado por profissional (ou profissionais) com relevante visão, conhecimentos e atuação multidisciplinar.

Em breve sumário, a atuação jurídica no franchising requer conhecimentos jurídico empresariais de diferentes leis e regulamentos comerciais, incluindo direitos de propriedade intelectual, incluindo-se proteção a segredos comerciais, modelos e princípios contratuais, direitos do consumidor, questões concorrenciais, normas fiscais e tributárias, e num passado bem recente, regras e legislação de proteção de dados pessoais, dentre outras que podem vir a se relacionar.Todo esse arcabouço e princípios legais afetam diretamente a relação legal e empresarial da franquia empresarial, e devem ser cuidadosamente avaliados, ponderados e inseridos no contrato de franquia empresarial, nos manuais de franquia, na documentação de suporte e nos demais procedimentos relacionados à gestão e suporte à rede franqueada.

A base de toda relação franqueadora / franqueados é a documentação legal que tem como elemento central a Circular de Oferta de Franquia ("COF"), que deve ser escrita em língua portuguesa, de forma objetiva e acessível (art. 2º da lei 13.966/193).

Mas antes mesmo de existir a COF, é vital que o processo de formatação do negócio para o modelo de franquia empresarial tenha sido devida e cuidadosamente desenvolvido, tanto por consultores habituados a avaliar requisitos (e por que não, possibilidade de) viabilidade de franqueamento do modelo de negócio, como por experts em temas apropriados a cada negócio. Neste ponto, o eficaz aconselhamento jurídico agrega solidez à construção de qualquer rede de franquia, visando maximizar as chances de sucesso a longo prazo e minimizar os riscos (frente à futura rede de unidades franqueadas ou mesmo em outras questões e responsabilidades futuras).

Assim, quais deveriam ser os pontos essenciais para seleção de uma consultoria eficaz para o processo de formatação e mesmo para seleção de corpo jurídico de suporte para todas as etapas e necessidades da empresa franqueadora? Vejamos.

O primeiro que nos salta como essencial é a comprovada experiência em processos de formatação e suporte a redes de franquia empresarial. Trata-se de requisito que não basta apenas "ouvir" do profissional, e sim, é importante conhecer exemplos de trabalhos "encabeçados" pelo profissional (e não simples participante remoto de equipes), buscando até mesmo feedback de clientes e outros profissionais da indústria. A experiência multissetorial é valiosa, pois um advogado de franquia criativo com esse tipo de experiência pode pegar as melhores práticas de um setor e aplicá-las a outro.

Importante questionar o profissional acerca das melhores práticas ou princípios da franquia, inclusive envolvendo questões éticas, e confrontar com pesquisas realizadas pelo time da franqueadora responsável pelo projeto. Tais melhores práticas e elementos principiológicos são parte importante que futuramente ajudará a incutir confiança para e na rede franqueada e deverá buscar garantir que a rede funcione de acordo com as melhores práticas estabelecidas (inclusive frente a melhores práticas de mercado).

Um ponto igualmente relevante é a experiência e especialização no tocante ao suporte apenas a franqueadores ou a franqueados ou ambos. Um consultor ou advogado com foco apenas em relações com franqueados inevitavelmente verá o relacionamento com a empresa franqueadora através de uma lente diferente do que outro com foco na franqueadora (mesmo se aplica a outros segmentos - o advogado trabalhista que apenas atua para empregados certamente tem uma visão distinta daquele que milita para empresas e vice-versa, dentre outros exemplos). Um profissional com conhecimentos de ambos os lados certamente pode proporcional uma visão mais holística e uma abordagem mais conciliatória para as disputas do que apenas buscar proteção integral de centros de interesse. Com isso, a avaliação da relação por diferentes ângulos pode, ou mesmo deve, se traduzir em conselhos práticos e eficazes, principalmente em relação à resolução de litígios. Em ambos os casos, naturalmente deve-se eficiente e eficazmente avaliar pontos de vista, posicionamentos (internos da rede, externos frente a consumidores e clientes, ou mesmo internos de cada empresa individualmente considerada) e várias relações jurídicas sob distintos enfoques para a melhor saúde e manutenção de uma rede de franquia empresarial.

Ainda nesta esfera de experiência, é importante conhecer campos amplos de atuação do profissional, se focado em litígios ou suporte extrajudicial e contratual (transacional). O peso a um lado ou outro pode ajudar a compreender e conhecer a área de prática primária. Por exemplo, um consultor fortemente combatente, principalmente com litígios, terá background para aconselhamento e estruturação da formatação de uma franquia empresarial, incluindo redação e implementação de contratos (e vice-versa)? O consultor tem enfoque multidisciplinar e competências essenciais ou necessita integralmente de consultores em distintas áreas para complementar conhecimento junto a outros colegas especialistas? Pontos outros tantos devem ser refletidos.

O conhecimento do setor (macro de franquia e micro da especialidade do negócio) é fundamental. O modelo de franquia empresarial comporta expansão que pode ser aplicada a quase todos os negócios, independente do setor. Mas é vital e importante que o consultor ou advogado, associado a um profundo conhecimento de franchising como um modelo de expansão de negócios (nível horizontal), tenha know-how (técnico e prático) no setor e mercado relevante do negócio (nível vertical), dado que cada segmento aplicará o modelo de franquia de maneira diferente (em distintos aspectos, tais como restrições de não concorrência, relação com consumidor, formas de captação de investimento inicial e de giro, sazonalidade, dentre tantos outros). Um consultor que não tenha tal espectro de visão e conhecimento pode desenvolver a formatação do negócio e documentos fora de um padrão esperado ou ótimo, corroendo tempo e dinheiro em pontos irrelevantes nas negociações e na implementação do projeto.

A necessidade de visão e conhecimentos multidisciplinares fica ainda mais profunda à medida que a rede de franquia cresce e amadurece. Com isso, novos pontos, problemas, dificuldades e soluções surgem, e possivelmente distintas questões jurídicas e comerciais serão levantadas de maneira mais sofisticada e variada. Neste ponto, o aconselhamento jurídico especializado em distintas áreas pode requerer que o consultor ou advogado seja um guardião do negócio e reúna bom time de especialistas - seja em litígios de franquia, proteção de consumidores, questões concorrenciais, proteção propriedade industrial e intelectual, questões físicas e tributárias, imobiliárias, de proteção de dados e até laborais / trabalhistas.

A união de forças e competências no entorno do especialista permite acelerar processos e tomada de decisões, minimizando riscos para o negócio, para a franqueadora, para a rede e até para fornecedores (além de outros stakeholders), priorizando seus objetivos estratégicos.

Cuidados especiais envolvem, ainda, uma fase mais avançada como possível expansão internacional, evitando problemas de início e armadilhas comuns. Esta etapa envolve uma série de novas questões a serem consideradas - desde conhecimento de mercado regulado local (tanto para a atividade de franquear um negócio como para a atividade fim propriamente dita), a busca por eventuais parceiros locais para a expansão (eventual modelo de master franquia), passando por questões regulatórias de restrições comerciais e concorrenciais, estruturação tributária, a necessária e primordial proteção da propriedade intelectual no exterior, e tantas quanto forem outras próprias ao cumprimento das leis regionais e locais.

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1 Lei 13.966, de 26 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o sistema de franquia empresarial e revoga a Lei nº 8.955, de 15 de dezembro de 94 (Lei de Franquia). Disponível em clique aqui . Acesso em 08.mar.21

2 Lei 13.966, de 26 de dezembro de 2019. "Art. 1º Esta Lei disciplina o sistema de franquia empresarial, pelo qual um franqueador autoriza por meio de contrato um franqueado a usar marcas e outros objetos de propriedade intelectual, sempre associados ao direito de produção ou distribuição exclusiva ou não exclusiva de produtos ou serviços e também ao direito de uso de métodos e sistemas de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem caracterizar relação de consumo ou vínculo empregatício em relação ao franqueado ou a seus empregados, ainda que durante o período de treinamento. § 1º Para os fins da autorização referida no caput, o franqueador deve ser titular ou requerente de direitos sobre as marcas e outros objetos de propriedade intelectual negociados no âmbito do contrato de franquia, ou estar expressamente autorizado pelo titular. § 2º A franquia pode ser adotada por empresa privada, empresa estatal ou entidade sem fins lucrativos, independentemente do segmento em que desenvolva as atividades.". Disponível em clique aqui . Acesso em 08.mar.21

3 Lei 13.966, de 26 de dezembro de 2019. "Art. 2º Para a implantação da franquia, o franqueador deverá fornecer ao interessado Circular de Oferta de Franquia, escrita em língua portuguesa, de forma objetiva e acessível, contendo obrigatoriamente: (...).". Disponível em clique aqui . Acesso em 08.mar. 21

Luís Rodolfo Cruz e Creuz

Luís Rodolfo Cruz e Creuz

Advogado. Sócio de Cruz & Creuz Advogados. Doutor em Direito Comercial pela USP (2019); Certificate Program in Advanced Topics in Business Strategy University of La Verne - Califórnia (2018); Mestre em Relações Internacionais pelo Programa Santiago Dantas UNESP/UNICAMP/PUC-SP (2010); Mestre em Direito e Integração da América Latina pelo PROLAM/USP (2010); LLM - Direito Societário, do INSPER (São Paulo) (2005); Bacharel em Direito pela PUC/SP. Autor do livro "Acordo de Quotistas - IOB-Thomson, 2007

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