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O que falta para uma real integração do Mercosul?

As perspectivas do Mercosul para alcançar uma real integração e atingir o mercado comum.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Atualizado às 15:11

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O Mercado Comum do Sul (Mercosul1) nasceu com o Tratado de Assunção em 26 de março de 1991, completando, portanto, 30 anos de existência. O bloco foi estruturado institucionalmente em 1994 através do Tratado de Ouro Preto. O principal objetivo da Organização é a criação de um mercado comum de livre comércio na América do Sul. Segundo Gadelha2, "o Mercosul visa ao aumento comercial e o advento dos países participantes ao cenário mundial." contudo, passados 30 anos, o que se pode observar é que o bloco ainda está distante da tão sonhada integração e vem sofrendo questionamentos inclusive dos representantes de membros originários da organização intergovernamental.

As atuais divergências entre os governos do Brasil e Argentina, principais integrantes do bloco tem evidenciado uma grande tensão e questionamentos sobre a importância ou não do Mercosul para as Nações que a compõem.

Na última conferência do bloco, ocorreu ainda um atrito entre os presidentes da Argentina, Alberto Fernandez, e do Uruguai, Luis Lacalle Pou, reforçando ainda mais que a Organização não vive o seu melhor momento e vem sendo contestada até mesmo internamente.

Outro fator é o questionamento em relação às frustradas tentativas de conclusão do acordo Mercosul - União Europeia que seguem indefinidos sobretudo pelas divergências a respeito das medidas ambientais.

Dito isto, após contemporizar a atual situação do bloco, é necessário se debruçar em quais os motivos causadores dos problemas atuais vivenciados pela Organização e quais medidas podem ser adotadas para dar eficácia e atingir o almejado status de mercado comum que é o principal objetivo a ser alcançado.

Um dos principais desafios que o bloco vem enfrentando é o de alinhar os seus interesses quando os países integrantes, sobretudo Brasil e Argentina que vêm aplicando políticas externas opostas. O governo Argentino tem buscado mais diálogos sobre o aumento das relações e da importância do Mercosul, enquanto Brasil e Uruguai têm adotado uma política externa que visa a busca de outras ligações, em detrimento do mercado comum do Sul.

Além disso, há divergências quanto ao papel que deve ser exercido pelo bloco, uma vez que há integrantes, como a Argentina que defendem a utilização do mercado comum como uma forma de proteger e desenvolver as indústrias do bloco, enquanto os governos mais liberais tendem a enxergar a aliança como uma oportunidade para, de maneira integrada, abrir espaço aos investimentos do mercado internacional.

Isso se reflete nas constantes quebras de direcionamento do mercado comum a cada mudança da presidência rotativa Pro Tempore do Mercosul (PPT), o que permite a participação de todos os Chefes de Estado, porém, notadamente constituem uma interrupção e muitas vezes, mudança de direcionamento do bloco.

Com a mudança dos paradigmas adotados pelos governos dos Estados-Partes, a relevância de compreender os processos históricos e políticos que nos trouxeram ao atual momento é ainda maior3.

A América do Sul enfrentou também na última década muita instabilidade política interna de seus membros e associados, o que contribui para uma relegação da Organização devido a necessidade de resolução dos problemas ligados à política interna dos Países.

Os ambiciosos objetivos contidos no documento de constituição firmado em Assunção contrapõem-se ao reduzido prazo que havia sido previsto para sua implementação. A coordenação das mais diversas formas de políticas públicas devem ser entendidas como sendo uma dessas palavras pronunciadas facilmente, mas executadas com dificuldades. Significa que cada país deveria, por vezes, adotar medidas que não desejariam adotar4. Nesse sentido, já em seu início, houve um erro crucial de planejamento e de propositura de metas atingíveis.

Falta ao Mercosul a elaboração de objetivos a curto prazo, porém, sem se olvidar do propósito inicial do bloco que é criação do mercado comum de livre comércio na América do Sul, que venha também a propiciar à Aliança como um todo, uma melhor posição de negociação no mercado internacional.

Diferentemente da União Europeia, o Mercosul ainda não foi capaz de criar uma zona de livre circulação de mercadorias plena entre os seus membros. O bloco forma assim uma "união aduaneira imperfeita", uma vez que, apesar das reduções tarifárias, a Organização ainda possui muitas divergências que impedem a conclusão da integração em uma zona livre.

O que se verifica é a necessidade inicial de estabilidade econômica e política dos países integrantes, além de traçar metas práticas e tangíveis para tornar uma realidade o livre comércio.

É de suma importância também a convergência e simetria dos discursos e atitudes dos integrantes do bloco perante o mercado internacional e as organizações internacionais em busca dos melhores interesses da organização. É necessária uma constante interação entre os membros para chegarem em acordo e apresentar uma posição consolidada do bloco e não somente de cada país individualmente.

Não é uma tarefa fácil a integração diante de países tão singulares e com suas próprias dimensões, estruturas, legados históricos e culturais próprios, mas se esse é o objetivo do bloco, é necessário gerar espaços de diálogo para superar todos esses contrastes e alcançar a meta e a finalidade da Organização.

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2 GADELHA, Regina Maria A. F. MERCOSUL e Alba: caminhos da integração da América Latina. In: GADELHA, Regina Maria A. F. (Org.). Mercosul a Unasul -avanços do processo de integração. São Paulo: Educ, 2013

3 RIBEIRO, Elisa S.; PINCHEMEL, Felipe. Paradigmas da Atuação Brasileira no Mercosul. In: NEGRI, Camilo; RIBEIRO, Elisa S. (Org.). Retratos Sul-Americanos: perspectivas brasileiras sobre história e política externa. 1ed.Brasília: UniCEUB: ICPD, 2019, v., p. 733-764

4 THUROW, L. La Guaera del Siglo XXI. Buenos Aires, Ed. Vergara, 1992, p. 70

Ítalo Cardoso

Ítalo Cardoso

Advogado, Analista jurídico da defensoria Pública do Estado da Bahia, Pós-graduando em direito internacional e direitos humanos e integrante da comissão de direito internacional da OAB-BA.

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