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O paradoxo da necessidade da prisão para execução de pena privativa de liberdade e o direito do sentenciado a regime mais benéfico pela execução conjunta de todas as suas penas

Verificando que a condenação definitiva não importará em cumprimento de pena em regime fechado, esse juízo deverá adequar o regime da condenação à prisão que se projeta em juízo definitivo (aquela que deverá ser imposta em execução com a soma ou unificação de penas).

terça-feira, 18 de maio de 2021

Atualizado às 17:15

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Controvertida pode se mostrar a situação jurídica de condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime inicial fechado, e que respondeu ao processo em liberdade, o qual, com o trânsito em julgado da decisão condenatória, tem determinada sua prisão como pressuposto para a expedição da guia de recolhimento visando à execução (artigo 105, da LEP). Suponha-se que, hipoteticamente, esse sentenciado tenha cumprido outras penas e, se considerado o tempo total em que esteve preso, já perceptível que, em execução, quando houver a soma ou unificação daquela pena com as cumpridas, será reconhecido seu direito a benefícios prisionais imediatos como o regime aberto ou o livramento condicional. Essa soma ou unificação de penas, contudo, é de competência do juízo da execução de penas. O juízo do processo de conhecimento somente cuidará do comando inflexível da condenação, determinando assim a prisão do sentenciado e estabelecendo esse marco como requisito para a expedição da guia de recolhimento.

Perceba-se o limbo em que se encontra esse sentenciado. Sua situação jurídica, avaliada como um todo (todas as condenações reunidas), implicará inserção em regime aberto ou mesmo que permaneça condicionalmente em liberdade. Essa conclusão, contudo, somente poderá ser conhecida e julgada pelo juízo da execução. Para isso, relativamente à ultima condenação, necessária se mostra a prisão, como requisito para a expedição da guia de recolhimento.

Por esse raciocínio, a solução legal será que o sentenciado seja preso, então expedida a guia de recolhimento e encaminhada ao juízo da execução, e esse, por soma ou unificação, irá concluir que o regime inicial é o aberto ou que tem direito ao livramento condicional. Só então o sentenciado, que aguardou preso toda essa tramitação que envolveu dois juízos, poderá usufruir do direito a não ser encarcerado, ao menos não em regime fechado.

Colocada essa questão, que é de cunho constitucional e trata do direito à liberdade e do acesso à Justiça, a controvérsia sobre a competência trava o debate. O juízo do processo de conhecimento só pode se posicionar sobre a pena nesse último imposta. O juízo da execução ainda não pode avaliar também essa última condenação, porque ainda não expedida a guia de recolhimento.

Parece evidente que a única opção inadmissível é prender o sentenciado para então permitir a ele postular que não seja mantido preso. Mas nenhum dos juízos se dispõe a essa avaliação e o dilema, por vezes, tem sido resolvido com o cumprimento do mandado de prisão.

Essa solução é de todo inconcebível e deve ser superada à luz do princípio da proporcionalidade, aplicável em matéria de prisão provisória. O juízo do processo de conhecimento ainda é o competente enquanto não houver o cumprimento do mandado de prisão. Verificando que a condenação definitiva não importará em cumprimento de pena em regime fechado, esse juízo deverá adequar o regime da condenação à prisão que se projeta em juízo definitivo (aquela que deverá ser imposta em execução com a soma ou unificação de penas). Ainda que cautelarmente, em juízo provisório, deverá definir que, de imediato, seja o sentenciado inserido no regime menos rigoroso (o aberto), e nesse excepcionalmente mantido e assim cumprida a ordem de prisão, o que viabilizará a expedição da guia de recolhimento e seu encaminhamento ao juízo da execução para posicionamento definitivo sobre as penas a serem cumpridas.

Questionável essa conclusão, possivelmente permitirá que melhores alternativas sejam construídas. Não, contudo, a simples negação do exercício de um direito fundamental ao condenado sob o pretexto, de um lado, do não cumprimento de um requisito (cumprimento da ordem de prisão), e, de outro, a incompetência do juízo. Não, certamente, a negação da justiça.

Mauricio Lins Ferraz

Mauricio Lins Ferraz

Advogado criminalista. Fundador do escritório Lins Ferraz Advocacia.

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