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A ilegitimidade do incapaz no juizado especial e o princípio da primazia do julgamento de mérito

Veja-se que o reconhecimento da ilegitimidade do incapaz e extinção do processo sem resolução de mérito ao final da fase instrutória penaliza as partes pela própria falta de atenção do juízo.

quinta-feira, 10 de junho de 2021

Atualizado às 12:10

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

A lei 9.099/95 traz disposições claras referentes as partes que não podem litigar no âmbito do Juizado Especial Cível, as quais se encontram no art. 8º do referido diploma, vejamos:

Art. 8º Não poderão ser partes, no processo instituído por esta lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.

Nota-se que o principal motivo da exclusão de tais pessoas jurídicas e físicas de figurarem como parte no âmbito dos juizados especiais deve-se em razão princípio da celeridade processual e da simplicidade, que são princípios essenciais trazidos pelo legislador para o julgamento das causas de menor complexidade.

Nesse prisma, merece atenção a figura do incapaz, o qual é classificado em duas espécies pela legislação civil: absolutamente incapaz (art.3º, CC) e o relativamente incapaz (art.4º, do CC).

No caso do art. 8º da lei 9.099/95, o mesmo se refere ao incapaz em sentido lato sensu, ou seja, englobando as duas espécies definidas pelo Código Civil.

Não obstante, é comum na prática processual serem encontradas ações tramitando nos juizados especiais, onde figura como parte o incapaz, sendo que, muitas vezes, tal fato somente é constatado quando da elaboração do projeto de sentença pelo juiz leigo.

Certo é que o reconhecimento da incompetência do juizado especial e extinção do processo sem resolução de mérito é a medida imperiosa prevista no art. 51, IV, da lei 9099/95. Porém, isso denota um formalismo processual e uma verdadeira injustiça para com as partes, contrariando o princípio da informalidade e da simplicidade.

Veja-se que o reconhecimento da ilegitimidade do incapaz e extinção do processo sem resolução de mérito ao final da fase instrutória penaliza as partes pela própria falta de atenção do juízo, o qual deveria ter verificado a incompetência no início do processo e evitado a prática de atos processuais e trabalho desnecessário do juízo, inclusive com a instrução do processo.

Nesse diapasão, não parece razoável ao juiz desperdiçar a prática de todos os atos praticados com extinção do processo e reconhecimento da incompetência com base no art.8º da lei 9.099/95.

Assim, para resolução do impasse, mostra-se necessária a interpretação teleológica e sistemática da lei 9099/95 pelo julgador em conjunto do ordenamento jurídico para que se tenha uma decisão de acordo com o devido processo legal.

Com o advento do novo CPC (lei 13105/15), o processo deixou de ser um fim em si mesmo e passou a ter uma base principiológica que deve ser respeitada pelo julgador, inclusive o princípio da primazia do julgamento do mérito. Vejamos:

"Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa."

Também é importante ressaltar que o reconhecimento da incompetência do Juizado Especial e extinção do processo sem resolução do mérito, além de ser medida extrema, não atinge a finalidade social do processo.

Nesse sentido o art. 8º do CPC:

Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

Portanto, com base na interpretação sistemática e princípiológica processual, o mais adequado é o aproveitamento dos atos processuais praticados e a remessa dos autos ao juízo competente cível, onde poderá ocorrer a intervenção obrigatória do Ministério Público, respeitando o princípio da primazia do julgamento de mérito e o devido processo legal.

Junior Cesar Carneiro

Junior Cesar Carneiro

Advogado Inscrito na OAB/PR 96279. Juiz Leigo do Juizado Especial Cível e da Fazenda Pública de Tibagi-PR. Pós Graduado em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes.

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