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Por que a advocacia é tão desvalorizada?

Vamos à pergunta: por que não somos valorizados como os médicos são?

terça-feira, 20 de julho de 2021

Atualizado às 13:34

(Imagem: Arte Migalhas)

Hoje num grupo de facebook de advogados, do qual faço parte, vi uma excelente pergunta feita por um colega: "por que os advogados não são valorizados como os médicos?

Particularmente, nada tenho a reclamar da advocacia. É uma carreira que me deu tudo o que tenho e, se não sou rico, tenho uma vida razoavelmente confortável.

Ocorre, que não posso comparar a minha realidade à realidade da maioria dos advogados. Vamos à pergunta: por que não somos valorizados como os médicos os são?

Resposta fácil (e errada): há muitos advogados no mercado.

Sim, eu sei que temos muitos advogados no mercado; 1milhão para sermos precisos. Acontece, meus amigos, que o Brasil é a 5ª população do mundo. Em qualquer ranking, de qualquer coisa, no planeta o Brasil ocupará as primeiras posições.

Deixa eu contar uma coisa: os Conselhos Regionais de Medicina, pelo Brasil, contam com 500.000 médicos registrados. Também é muito, correto?

Dito isso, vamos ao ponto: dificilmente você verá um médico, com mais de 5 anos de formado, ganhando menos de R$ 10.000,00. Para muitos advogados, isso é um sonho inalcançável.

Apenas o número de profissionais em cada área não responde, satisfatoriamente, essa pergunta. Várias são as razões para essa desvalorização da nossa classe perante a sociedade, mas acredito que a principal delas seja porque nós mesmos nos desvalorizamos e nos sabotamos, a nós e nossos colegas.

Vocês já perceberam que boa parte dos Advogados têm verdadeiro êxtase para falar mal de colegas. Chamar colegas de ladrões, chicaneiros e incompetentes, para boa parte de nossa categoria [isso] é tão corriqueiro como tomar água.

Algum de vocês já viu médicos fazendo isso? Não. Médicos, ao contrário de advogados, se defendem. Recentemente ganhamos um processo de erro médico em meu escritório. Para achar um profissional da área médica que aceitasse o encargo de perito assistente foi um calvário. O perito judicial teve que ser substituído 3 vezes, pois tentava manipular o laudo para proteger o médico.

E foi um erro profissional crasso, ok. Agora, na advocacia, diria que um percentual enorme dos advogados têm verdadeira tara em difamar e caluniar colegas.

Vou contar algo que aconteceu comigo, certa vez. Estava vendo um processo no balcão do Fórum João Mendes Jr. (sou desses com orgulho, ok, advogado barriga no balcão) e um jurisdicionado, de outro caso qualquer, perguntou para o cartorário. "Por que o dinheiro da guia ainda não entrou?". Outro advogado, esse com minúscula mesmo, respondeu: "Teu advogado roubou teu dinheiro".

Sério, como alguém sem sequer ler o processo faz uma afirmação tão grave, tão leviana?

Não consegui ouvir aquilo e ficar quieto. Retruquei na hora: "como vc diz isso, Dr., você leu o processo?". Ele ainda respondeu que não sabia que "eu era o advogado do caso". Informei a ele que não, pois se eu fosse o advogado do caso ele, àquela altura, já estaria sem uns 4 dentes na boca. Ele, rapidamente, se retirou do balcão, sem falar nada.

Peguei o processo, li junto com aquele jurisdicionado, e "descobrimos" que a guia sequer tinha sido confeccionada. Histórias como essa são comuns. Então a resposta objetiva para essa pergunta é: Não somos valorizados pelo simples fato de não nos valorizarmos. Podemos mudar isso? Sim, temos que começar mudando nosso modo de agir. Não comentar processos sem os ler já é um bom início. Em meu escritório não aceito processo que já era de outro advogado, salvo duas condições bem específicas: a) o colega assim o quer; b) erro processual crasso.

"Ain, Paulo Paulo Antonio Papini, vc é inocente. Se vc não aceitar o caso, outro o fará..."

Tudo bem, durmo em paz com minha consciência. Se todos profissionais fizessem isso, os clientes iriam parar de mudar de Advogado quando percebem que o valor da indenização é de 1.000.000 e que o advogado ganhará R$ 300.000,00 de honorários.

Eu faço a minha parte, ok?! Sou uma voz no deserto? Provavelmente. O que eu sei é que enquanto os advogados não se valorizarem, fazer audiências por R$ 50,00 será a realidade de boa parte dos advogados do Brasil.

Paulo Antonio Papini

VIP Paulo Antonio Papini

Advogado em São Paulo. Me. e Doutorando em Direito pela Universidade Autónoma de Lisboa. Pós-graduado em Processo Civil. Especialista em Direito Imobiliário. Professor na ESA/UNIARARAS e ESD-Campinas.

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