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Da necessária extensão do tema 918 do STF às demais atividades previstas no decreto-lei 406/68

Julgado do Supremo não deve ser restrito às sociedades de advogados, pela expressa indicação na formação da tese fixada.

quinta-feira, 22 de julho de 2021

Atualizado às 17:43

(Imagem: Arte Migalhas)

O decreto-lei 406/68, no artigo 9º, parágrafo 3º, prevê que que as sociedades que prestem determinados serviços constantes na lista anexa ao decreto-lei, seja por meio de sócio, empregado ou não, sob responsabilidade pessoal destes, recolherá o ISSQN por meio de alíquotas fixas ou variáveis em relação a cada profissional habilitado.

O referido decreto-lei, notadamente recepcionado pela Constituição Federal de 1988, não estabelece nenhum requisito que não a previsão do par. 3º do art. 9º e tampouco estabelece qualquer diferenciação entre as atividades ali descritas, para o recolhimento na forma chamada per capita.

O STF, ao julgar o RE 940769, pelo regime de repercussão geral, estabeleceu a seguinte tese: "É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional."

O leading case trata de um mandado de segurança coletivo, interposto pela OAB, seção do Rio Grande do Sul, em face do município de Porto Alegre, diante da imposição de requisitos impeditivos para a opção pela tributação fixa do ISSQN.

Muito embora a OAB tenha somente representatividade legitimada para propor a ação em benefício da classe que representa, fato é que, a declaração incidental de inconstitucionalidade dos artigos da legislação municipal de Porto Alegre, acabou por beneficiar todos aquelas sociedades que exercem as atividades constantes no par. 3ª do art. 9 do decreto-lei 406/68, visto que a declaração de inconstitucionalidade, por ora sem a modulação dos efeitos1, retroage até a edição da norma revogada, e assim, todas as sociedades que exerçam as atividades descritas nos itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa do referido decreto-lei, deverão deixar de sofrer os impeditivos constantes na legislação, tendo oportunidade de optar pelo recolhimento fixo anual do ISSQN, somente com base nos requisitos trazidos do decreto-lei 406/68.

Destaca-se que o voto vencedor, proferido pelo relator ministro Edson Fachin, em momento algum considera qualquer diferenciação entre as atividades listadas no art. 9ª, par. 3º do decreto-lei 406/68, o que seria feito, no caso concreto, trazendo à baila disposições constantes na lei regulamentadora da atividade da advocacia, lei 8906/94, que somente foi brevemente citada pelo ministro Luiz Fux, para justificar seu alinhamento ao voto vencedor. Aliás, tal diferenciação fugiria ao escopo de competência do STF, que analisa a legislação em consonância com a Constituição Federal, e tal análise, no caso concreto, se limitou à possibilidade de norma municipal, seja lei ou decreto, de estabelecer limites dissonantes daqueles impostos pela legislação federal instituidora da base de cálculo do tributo para a incidência deste.

Ressalta-se ainda que a 1ª seção do STJ, no julgamento do EAREsp 31.084, acaba por corroborar tal entendimento, ao afirmar que a relevância para determinar a possibilidade do recolhimento fixo é a forma pessoal da prestação de serviços, segundo prevê o decreto-lei 406/68, artigo 9º, em processo proposto por uma sociedade médica.

Portanto, mesmo que o tema 918 tenha sido firmado excepcionando as sociedades de advogados, isso de fato ocorreu por formalidade jurídica processual, diante da representatividade exclusiva da OAB quanto aos seus inscritos e à submissão do Supremo Tribunal Federal ao pedido formulado no processo.

Exemplificamente, no município de São Paulo, desde o ano de 2009, a prefeitura vem agindo no intuito de restringir a possibilidade de sociedades uniprofissionais recolherem o ISSQN pela tributação fixa, efetuando desenquadramentos em massa do regime de recolhimento fixo, baseado em requisitos impeditivos notadamente inconstitucionais, seja por meio de súmulas e pareceres administrativos ou por meio de leis e decretos municipais

A partir de do final do ano de 2015 e início de 2016, a prefeitura municipal de São Paulo intensificou seu trabalho pela extinção das sociedades uniprofissionais, por meio da lei municipal 16.240/2015, que instituiu a D-SUP - Declaração de Sociedade Uniprofissional,  declaração que deve ser preenchida e entregue por todas as sociedades que queiram recolher o ISSQN na forma prevista no art. 406/68 e por meio do parecer normativo SF 3 de 28/10/2016, que impõe ainda mais restrições à submissão pelo recolhimento fixo do ISSQN, além daquelas impostas pelo art. 15, §2º da lei municipal 13.701/03 e pelo decreto municipal 53.151/12, que regulamenta a lei anterior.

Na D-SUP, constam perguntas que devem ser respondidas pelas sociedades simplesmente com "sim" ou "não", e qualquer resposta "sim", excluirá a sociedade da possibilidade de recolhimento fixo do ISSQN, retroativamente à data declarada do início da ocorrência do "sim" assinalado. Em suma, é a consolidação das ações impeditivas e interpretações ilegais da prefeitura municipal de São Paulo ao longo do tempo, usadas para excluir indevidamente as sociedades do regime de recolhimento como uniprofissional, com a aparência de confissão, inclusive quanto a débito lançado retroativamente.

Já o parecer normativo SF 3 de 28/10/2016, sob a justificativa de estar interpretando o artigo 15 da lei municipal 13.701/03 estabelece ainda mais restrições para à possibilidade de recolhimento do ISSQN como sociedade uniprofissional, não dispostas na legislação, ferindo nitidamente o princípio da legalidade e da reserva legal.

Assim, quanto ao município de São Paulo, na mesma linha do julgamento da tese 918 do STF, o art. 19 do decreto municipal 53.151/12 e o art. 15, §2º da lei municipal 13.701/03, são notadamente inconstitucionais, por estabelecerem impeditivos não constantes no art. 9, §3º do decreto-lei 406/68, bem como é inconstitucional a utilização de normas constantes em parecer normativo para exclusão de sociedade do regime de tributação de ISSQN fixo. Ao nosso ver, a D-SUP não é por si só inconstitucional, como obrigação acessória, porém o desenquadramento de sociedades do regime de recolhimento do tributo como uniprofissionais, com fundamento em suas respostas, quando aplicando os dispositivos legais e infralegais acima destacados como inconstitucionais, seria igualmente contrário à Constituição Federal.

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1 O STF ainda não julgou o pedido de modulação dos efeitos, feito via embargos de declaração

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Consulte aqui o parecer normativo SF 3 de 28/10/2016.

Consulte aqui a lei 13.701/2003.

Consulte aqui o decreto municipal 53.151/12.

Consulte aqui a página da D-SUP.

Processo EAresp 31084.  

Processo RE 940769/STF.  

Lucas Micherif de Moraes

Lucas Micherif de Moraes

Sócio do escritório #amm.advogados.

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