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A obrigatoriedade da suspensão do julgamento da ação até decisão sobre o recebimento do IRDR

Diante dos novos institutos jurídicos contemplados no Código de Processo Civil, de 2015, ainda existem algumas incertezas sobre o procedimento, dentre eles, um dos mais complicados ainda é o Incidente de resolução de demandas repetitivas.

quinta-feira, 29 de julho de 2021

Atualizado às 14:11

(Imagem: Arte Migalhas)

1. BREVES COMENTÁRIOS ACERCA DO INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS

A lei 13.105/2015, que instituiu o Novo Código de Processo Civil, trouxe, nos artigos 976 a 987, o Incidente de resolução de demandas repetitivas, conhecido também como IRDR, como mecanismo de solucionar demandas reiteradas, assegurar higidez e segurança jurídica na jurisprudência dos Tribunais. Isso porque, as decisões proferidas em sede de IRDR constituem precedentes obrigatórios.

Diferentemente dos outros mecanismos de realização de precedentes obrigatórios, tais como as súmulas vinculantes, decisões em sede de recurso repetitivo, o IRDR pode ser requerido pelo própria Parte, também pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou pelo Juiz e Relator, desde que cumpram os requisitos de versarem sobre matéria unicamente de direito, com efetiva repetição de processos e havendo risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

O Superior Tribunal de Justiça, comungando com Enunciado 344, do Fórum Permanente de Processualistas Civis, também sedimentou, no AREsp 1.470.017/SP, outro requisito indispensável para o processamento do IRDR, a existência de recurso pendente de julgamento no tribunal.

Por outro lado, analisando os artigos 977 e 982, se depreende que o IRDR é formado por duas fases, sendo a primeira do pedido de instauração, distribuído ao órgão indicado na Resolução do Tribunal, onde será analisada a hipótese de sua admissibilidade, marco que será determinado o sobrestamento, ou não, dos processos pendentes de julgamento que serão afetados pela decisão.

Finalizando, a segunda Parte constitui no julgamento e lavratura do Acórdão, onde será fixada a tese que também será aplicada em todos processos individuais e coletivos que versarem sobre a mesma matéria, dentro da competência do Tribunal que julgou o IRDR.

2. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OS REQUISITOS DO IRDR

O artigo 976, do Código de Processo Civil, traz apenas quatro requisitos, a efetiva repetição de processos com a mesma controvérsia, a matéria unicamente de direito e o risco á ofensa e à segurança jurídica, além disso, é incabível o pedido de instauração do IRDR quando houver afetação em Tribunal superior a tese em recurso repetitivo.

Além disso, há o requisito intrínseco da necessidade de existir um processo ou recurso pendente de julgamento, sobre a matéria do IRDR, nos termos do Enunciado 344, do FPPC. Confira-se:

Enunciado 344. A instauração do incidente pressupõe a existência de processo pendente no respectivo tribunal

No mesmo sentido, sedimento o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. REQUISITO. EXISTÊNCIA DE PROCESSO EM TRÂMITE. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE. INVIABILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. INEXISTÊNCIA.
(...)

V - O cerne da controvérsia consiste em decidir se seria admissível a instauração do IRDR pela escolha de um caso que já tenha sido objeto de julgamento, mas cujos embargos de declaração ainda não foram julgados. Ocorre que, após o julgamento do mérito do recurso do qual se extrairia a tese jurídica, não há que se falar em pendência do caso para fins de instauração do IRDR, diante do obstáculo à formação concentrada do precedente obrigatório. VI - O cabimento do IRDR, condiciona-se à pendência de julgamento, no tribunal, de uma causa recursal ou originária. Se já encerrado o julgamento, não caberá mais a instauração do IRDR, senão em outra causa pendente; mas não naquela que já foi julgada. Nesse sentido, o Enunciado n. 344 do Fórum Permanente de Processualistas Civis. 
(...)
(AREsp 1470017/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/10/2019, DJe 18/10/2019)

Sendo assim, diante da impossibilidade de utilizar o IRDR como sucedâneo recursal, é imprescindível que o recurso ainda esteja pendente de julgamento.

Já no contexto da multiplicidade de processos, ainda não há uma definição exata de quantos processos corresponderiam a referida multiplicidade, sendo assim, o FPPC também editou o Enunciado 87, onde relativiza o cerne da multiplicidade em prol da isonomia e da segurança jurídica, nos seguintes termos:

Enunciado 87. A instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas não pressupõe a existência de grande quantidade de processos versando sobre a mesma questão, mas preponderantemente o risco de quebra da isonomia e de ofensa à segurança jurídica.

Portanto, há maior destaque quanto ao risco da quebra da isonomia e da ofensa à segurança jurídica.

Deste modo, os requisitos para o pedido de instauração do IRDR constituem a existência de um processo "piloto" pendente de julgamento, a existência de multiplicidade de processos sobre a mesma matéria, a questão controvertida ser unicamente de direito, houver risco à isonomia e à segurança jurídica e a matéria não ter sido afetada em tribunal superior em recurso repetitivo.

3. O MAGISTRADO É OBRIGADO A AGUARDAR A DECISÃO DE RECEBIMENTO DO IRDR?

Inicialmente, é oportuno enfatizar que o Código de Processo Civil pouco nos traz acerca do procedimento da primeira fase do IRDR, notadamente, destaca-se, à luz do artigo 981, que após a distribuição do IRDR, o órgão colegiado competente analisará sua admissibilidade.

Enquanto isso, o Magistrado a quem compete o "processo piloto", que originou o pedido de instauração do IRDR, é obrigado a aguardar a decisão de sua admissibilidade?

Pois é, diante da inexistência de regulamentação do tipo, essa matéria foi alvo de impetração de Mandado de segurança, número 0722659-58.2021.8.07.000, perante a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, contra ato omissivo do Desembargador Relator que deixou de analisar o pedido de suspensão da Apelação enquanto fosse analisado o procedimento de instauração do IRDR e designou pauta para o julgamento do recurso.

No Mandado de segurança o Impetrante defendeu a aplicação do Princípio da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, haja vista que, na hipótese de admissão do IRDR, o órgão competente também estará analisando os fundamentos recursais inerentes ao processo.

Além disso, trouxe a preocupação quanto ao requisito da existência de processo pendente de julgamento, como pressuposto de admissibilidade do IRDR.

O Desembargador Josaphá Francisco, Relator do caso, concedeu em Tutela de urgência a segurança para determinar o sobrestamento do Recurso, comungando com os fundamentos da aplicação do Princípio da inafastabilidade da jurisdição, da segurança jurídica e do requisito da existência de processo paradigma pendente de julgamento para admissão do Incidente de repetição de demandas repetitivas.

Portanto, podemos concluir que, intrinsicamente, há uma obrigatoriedade de o Magistrado sobrestar o Processo até o resultado da admissão, ou não, do Incidente de resolução de demandas repetitivas, diante da necessidade de haver pendência do recurso a ser julgado, e como modo de prevalecer a inafastabilidade da jurisdição e a segurança jurídica, sendo o último inerente ao próprio IRDR.

Leonardo Thadeu Pires

Leonardo Thadeu Pires

Advogado em Brasília.

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