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Série decisão parcial: a necessidade de alerta do juízo sobre a prolação da decisão parcial?

Esse pronunciamento judicial de alerta sobre a percepção de preenchimento dos requisitos para a prolação de uma decisão parcial notadamente atrasa a prestação jurisdicional e retira o processo da conclusão e da análise do juízo para uma nova publicação e prazo para que as partes se manifestem.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Atualizado às 15:11

(Imagem: Arte Migalhas)

A série de textos sobre decisão parcial é fruto, como dito no primeiro texto da série, da defesa da tese de doutoramento no PPGD da UNICAP - Universidade Católica de Pernambuco sobre o Fracionamento Decisório, o que o ordenamento processual positivou como Decisão Parcial, com a possibilidade de fracionamento da jurisdição em si, com a resolução de parcela do que se pleitou, seja com mérito (art. 356 do CPC), seja sem mérito (art. 354, parágrafo único do CPC).

A partir disso, diversos assuntos paralelos e específicos sobre o tema não são debatidos e trazidos à tona, por vezes ficando de maneira lateral ou esquecida e, diante disso, criei a série de textos sobre Decisão Parcial e neste, o intuito é enfrentar se a decisão parcial, seja com resolução do mérito, seja sem resolução do mérito, pode ser prolatada de maneira surpresa, sem com que as partes sejam devidamente avisadas, com intimação pertinente, sobre a incidência da bifurcação cognitiva e a possibilidade de julgar antecipadamente parcela da jurisdição, em qualquer de suas possibilidades.

O momento em que o juízo tiver a percepção sobre a existência de uma bifurcação cognitiva, com os requisitos inerentes a uma prolação de uma decisão parcial deve julgar automaticamente ou alertar as partes para que possam se manifestar sobre a presença, ou não, dos requisitos dessa bifurcação? Essa é uma dúvida pertinente não somente para a bifurcação cognitiva, mas também para todo e qualquer julgamento antecipado, pelo fato de que as partes, a priori, não esperam que o julgamento seja antecipado, seja de modo integral, seja parcial, com a necessidade de que o juízo alerte sobre tal situação processual1, com abertura de prazo para a manifestação das partes sobre uma conclusão para a prolação de uma decisão parcial.

Esse ponto é importante e cooperativo, uma vez que as partes podem não ter a ciência de que a demanda está pronta para julgamento em sua parcela, com a grande probabilidade de causar surpresa às partes, justamente por não terem a mesma percepção judicial sobre os requisitos para a bifurcação cognitiva, visualizando uma necessidade de prova sobre determinada questão que o juízo entende já preclusa ou resolúvel.

Esse pronunciamento judicial de alerta sobre a percepção de preenchimento dos requisitos para a prolação de uma decisão parcial notadamente atrasa a prestação jurisdicional e retira o processo da conclusão e da análise do juízo para uma nova publicação e prazo para que as partes se manifestem.

No entanto, se as partes se manifestarem, pela concordância ou não pela percepção da bifurcação cognitiva e a viabilidade da decisão parcial, o ato do juízo em decidir parcial se torna mais completo, com o conhecimento, enfrentamento e cognição sobre eventual pedido de provas, se for o caso.

Se as partes demonstrarem que não há tal enquadramento, tampouco viabilidade para tanto, esse alerta seria benéfico para que não seja prolatada uma decisão parcial com alta probabilidade de reversão por error in procedendo. E, de modo inverso, se as partes ao serem intimadas sobre a conclusão para uma decisão parcial e a percepção judicante da presença dos requisitos autorizantes, não se manifestarem ou concordarem com tal prolação, há uma diminuição de argumentos impugnativos de error in procedendo, em eventual recurso sobre a decisão parcial.

O ordenamento não dispõe sobre tal necessidade23, porém a construção é possível diante dos princípios da boa-fé, cooperação e contraditório.

Obviamente que se as partes, em suas postulações, como o réu na contestação e o autor na réplica, pleitearem pelo julgamento antecipada, tanto total quanto somente sobre parcela da jurisdição, com ou sem resolução de mérito, não haveria nenhuma necessidade de uma decisão alerta sobre o julgamento antecipado e, igualmente, sobre a decisão parcial. Se o intuito é avisar as partes de que o processo está apto a ser cindido e decidido parcialmente, se estas pleitearam esse julgamento dessa maneira, não faria sentido essa decisão.

Todavia, é pertinente que se analise o pleito, se foi por ambas as partes ou somente uma e, ainda, se foi iniciativa oficiosa diante da percepção da bifurcação cognitiva e o fracionamento decisório da jurisdição.

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1 Falando sobre o assunto para o julgamento antecipado da demanda, o que podemos utilizar, igualmente, para a decisão parcial na demanda: "Em primeiro lugar, o princípio da cooperação impõe que o magistrado comunique às partes a intenção de abreviar o procedimento, julgando antecipadamente o mérito. Essa intimação prévia é importantíssima: i) evita uma decisão-surpresa, que abruptamente encerre o procedimento, frustrando expectativas das partes; ií) se a parte não concordar com essa decisão, sob o fundamento de que ela cerceia seu direito à prova e, por isso, invalida o procedimento, deve registrar o inconformismo." DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 17a. ed. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 774.

2 No sentido contrário, pela desnecessidade de decisão alerta: "Por isso, também, a desnecessidade de prévia consulta às partes para que o juiz possa emitir sentença parcial." AMBRIZZI, Tiago Ravazzi. Julgamento fracionado do mérito no processo civil brasileiro. São Paulo, SP, 2014. 231 p. Dissertação (Mestrado). Universidade de São Paulo. Programa de Pós-Graduação em Direito. p. 158.

3 Enunciado 27 da JDPC: Não é necessário o anúncio prévio do julgamento do pedido nas situações do art. 355 do CPC.

Vinicius Silva Lemos

VIP Vinicius Silva Lemos

Pós-Doutorando em Processo Civil pela UERJ. Doutor em Processo Civil pela UNICAP. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF. Professor de Processo Civil na FARO e UNIRON. Presidente do IDPR. Advogado.

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