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Josefina Álvares de Azevedo e a defesa do voto feminino

Retomar os textos de Josefina Álvares de Azevedo é não apenas resgatar a voz de uma mulher notável, mas também resgatar um período político importantíssimo, no qual foram gestadas importantes conquistas sociais que viriam no período seguinte.

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Atualizado às 09:28

(Imagem: Arte Migalhas)

No dia 3 de novembro de 2021 completam-se 91 anos de instituição do voto feminino na legislação brasileira, data histórica para o movimento de mulheres que trava luta incessante pela garantia das liberdades civis e democráticas à parcela da população historicamente excluída dos espaços de poder.

Josefina Álvares de Azevedo foi uma personagem importantíssima desse movimento, viveu entre os anos de 1851 e 1913, e passou sua vida entre as principais cidades brasileiras daquela época - Recife, São Paulo e Rio de Janeiro - falecendo nesta última aos 62 anos. Foi escritora, jornalista, professora, poetisa, e poderia ter sido também advogada, dado seu empenho incansável na defesa dos direitos e causas femininas na segunda metade do século XIX e início do século XX.

Foi fundadora do jornal A Família, dedicado a questões relativas à família e à figura da mãe, em especial sobre a importância da educação e da emancipação femininas, sendo Josefina sua principal articulista, ao lado de textos de outras mulheres - o jornal era escrito apenas por mulheres, e foi editado entre os aos de 1888 e 1897.

Em seus textos, agora disponibilizados em edição pelo Senado Federal, Josefina Álvares de Azevedo dedicou-se à defesa intensa do sufrágio feminino, alinhada à primeira onda feminista que já agitava os países europeus e os Estados Unidos.

Apesar de não mencionar expressamente em seus escritos, Josefina Álvares de Azevedo trouxe para os leitores brasileiros de então o movimento considerado como a primeira onda do feminismo, o qual localiza-se temporalmente na segunda metade do século XIX, estendendo-se até meados dos anos de 1950, e desenvolve-se principalmente entre mulheres brancas, de classe média, que sentem a necessidade de expandir seus horizontes para além do lar.

As questões que norteiam essa primeira onda estão informadas pelos ideais liberais1 das revoluções burguesas ocorridas em França e Estados Unidos, e dizem respeito principalmente à igualdade de direitos entre homens e mulheres no que toca à propriedade, participação política, trabalho, destacando-se a luta pelo direito ao voto.

A luta política tem por base o contexto fático de separação dos espaços sociais em público e privado, e a restrição da vivência feminina ao lar, o que torna a política um ambiente extremamente masculino e refratário à presença feminina, relegando a segundo plano tudo que dissesse respeito às mulheres.

No entanto, os ideais revolucionários de liberdade, igualdade e fraternidade alcançam também corações e mentes femininos, que passam reivindicar, naquele momento histórico, os mesmos direitos então já garantidos aos homens.

No Brasil, Josefina Álvares de Azevedo encarregou-se de levar adiante a propaganda pela emancipação feminina, na visão dela calcada na educação e no direito ao sufrágio.

Os escritos públicos de Josefina Álvares de Azevedo afastam uma visão equivocada de que as brasileiras, nos idos do século XIX,  não possuíam voz na sociedade de então - cabe considerar que elas foram, no mais da vezes silenciadas pela historiografia oficial.

Os escritos de Josefina Álvares de Azevedo também dão a dimensão de uma mulher culta e bem informada sobre as tendências políticas da metrópole, preocupada em trazer para as terras brasileiras as lutas que já estavam ocorrendo na Europa e Estados Unidos.

Não se pode dizer, no entanto, que Josefina Álvares de Azevedo pretendesse uma ruptura com a ordem então vigente: ela postulava a emancipação, a educação e a igualdade de direitos para as mulheres, porém sem qualquer pretensão revolucionária.

A revolução que Josefina Álvares de Azevedo antevia na educação feminina dizia respeito ao engrandecimento nacional caso as brasileiras pudessem desenvolver livremente suas faculdades intelectuais nas várias áreas do conhecimento. Antevia também um grande futuro para a nação a partir do momento em que as mulheres tivessem igual voz política que os homens na escolha dos representantes políticos, na medida em que a isso corresponderia maior preocupação e comprometimento  - ao menos em tese - com as causas femininas, as quais seriam causas que, em verdade, beneficiariam toda a nação.

Josefina Álvares de Azevedo foi uma voz importante na defesa da emancipação feminina na sociedade brasileira do final do século XIX e início do século XX. Morreu sem ver conquistadas as causas que defendia. No entanto, seus textos fizeram o solo fértil para o crescimento do movimento sufragista de mulheres que despontou na década de1920 e culminou, após mais de uma década, na aprovação em 1930 do primeiro projeto de lei que previa o direito de voto às mulheres, garantido finalmente no Código Eleitoral  estatuído pelo Decreto 21076/1932, que estatuiu pela primeira vez na história o voto feminino no Brasil.

Retomar os textos de Josefina Álvares de Azevedo é não apenas resgatar a voz de uma mulher notável, mas também resgatar um período político importantíssimo, no qual foram gestadas importantes conquistas sociais que viriam no período seguinte. E também render homenagem à coragem e audácia de uma mulher que ousou defender o ideal da igualdade em uma sociedade até então pouco afeita à noção de democracia.

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Não por acaso a luta abolicionista desvela-se no mesmo período.

Patrícia Schoeps da Silva

Patrícia Schoeps da Silva

Graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Doutoranda em Direito pela Universidade de Salamanca. Advogada do escritório Arruda Alvim e Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica.

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