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O que o caso da Itapemirim ensina sobre o mercado aéreo no Brasil

A única notícia que se tem até o momento é que o grupo Itapemirim promete retomar as decolagens pela companhia aérea no dia 17 de fevereiro. Será que as autoridades competentes permitirão novamente?

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Atualizado em 4 de fevereiro de 2022 11:26

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Mais de 133 mil passageiros ficaram sem saber o que fazer ao adquirirem passagens da companhia aérea Itapemirim. O pior: às vésperas do Natal e do Réveillon.

Se, por um lado, a interrupção abrupta das operações, a partir de 17 de dezembro, resultou em filas e protestos nos aeroportos, por outro, trouxe também reflexões a respeito da responsabilidade civil no setor aéreo, possíveis problemas regulatórios por parte da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e como amparar rapidamente os milhares de passageiros lesados.

Afinal, os reguladores permitiram a entrada no mercado aéreo de um grupo econômico que apresenta dificuldades financeiras de longa data. Desde 2016 o Grupo Itapemirim está em recuperação judicial. Como isso foi permitido?

Sobretudo diante de evidências de uma série de irregularidades, como atrasos de salários para funcionários e a falta de pagamento a prestadores de serviço e fornecedores?

O imbróglio vai além, com investigações envolvendo até possíveis fraudes envolvendo criptomoedas e esquemas de pirâmide com o sócio administrador e com o nome e reputação da viação. Tudo está sob a investigação no Ministério Público e dos devidos órgãos competentes, mas isso não impediu a Itapemirim de conseguir a licença para criação da companhia aérea.

Para tanto, o Judiciário foi fundamental, ao decidir de forma favorável pelo direito de outorga. A interferência acabou cobrando seu preço com poucos meses de operação da companhia, um prejuízo hoje arcado por dezenas de milhares de consumidores.

Enquanto órgãos reguladores e Judiciário analisam suas respectivas regras e decisões, ainda é preciso haver uma indenização compensatória justa aos clientes lesados. Diante do cenário atual apontando para a possível quebra da Itapemirim, certamente desaguará em prejuízo direto para os consumidores, tal como nos casos de Varig, Vasp, Transbrasil e, mais recentemente, Avianca.

Há na Justiça pedidos de bloqueio de bens do sócio administrador e pedido de declaração de falência do Grupo Itapemirim, mas mesmo que se decida de forma favorável, esses recursos podem demorar anos até que os consumidores sejam devidamente reembolsados ou, em um caso mais grave a se confirmar, nunca sejam compensados.

Em meio as incertezas, enquanto Anac e Procon sinalizam, ainda que tardiamente, multas, suspensões e proibições para a Itapemirim, resta aos consumidores entre as opções a via do Judiciário. Porém, como sinaliza o cenário, com baixas perspectivas de efetivo sucesso, sobretudo no recebimento de alguma compensação pelos danos já sofridos.

Por outro lado, é de se estranhar o silêncio da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e da ABEAR (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) sobre o assunto, considerando-se que ambas, desde 2019, atuam em conjunto, enérgica e publicamente, com o objetivo declarado de expulsar do mercado as chamadas lawtechs.

São empresas que atuam auxiliando consumidores lesados por companhias aéreas na busca de seus direitos ou adquirindo tais direitos por meio da cessão de direitos, com a Liberfly e a QuickBrasil.

Todavia, a despeito de não haver notícias de alguma reclamação por serviços eventualmente mal prestados por estas empresas por parte de passageiros e consumidores, o que se vê atualmente é a atuação efetiva da OAB e da ABEAR no intuito de impedi-las de prestar seus serviços e, até mesmo, de veicular informações sobre os direitos dos passageiros (existem ações judiciais em trâmite nesse sentido). Nesse sentido, não se percebe a mesma atuação aguerrida em defesa do mercado e dos consumidores com relação a companhias aéreas que causam danos enormes à sociedade brasileira, como em episódios como este da Itapemirim.

Com efeito, é de se estranhar a inércia destas entidades em episódios como este da Itapemirim, repetindo o mesmo comportamento letárgico que tiveram quando da saída abrupta e prejudicial aos consumidores da Avianca há três anos.

Enfim, os órgãos fiscalizadores e reguladores do transporte de passageiros, bem como as entidades que representam as companhias aéreas e tutelam o mercado de transporte aéreo de passageiros estão em débito para com os passageiros e consumidores, sendo necessário que se posicionem de forma mais clara, efetiva e eficaz sobre o assunto.

Milhões de usuários desse serviço, os quais amargam atualmente enormes prejuízos, merecem essa resposta.

Ante a tal situação, a única notícia que se tem até o momento é que o grupo Itapemirim promete retomar as decolagens pela companhia aérea no dia 17 de fevereiro. Será que as autoridades competentes permitirão novamente?

Juliana Ferrari

Juliana Ferrari

Advogada especialista em Direito das Startups pelo Insper

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