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Práticas toleradas no contexto da manipulação de mercado

Diante da dificuldade de determinação dos fatores motivantes de uma operação de mercado e, ainda que pesem contra o operador razoáveis suspeitas, haveria de se admitir determinados riscos que seriam, em última análise, inerentes à complexidade de funcionamento do mercado de capitais.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

Atualizado às 12:11

(Imagem: Arte Migalhas)

O mercado financeiro é, notadamente, um dos setores da economia de maior instabilidade, volume de negociação, liquidez e risco.

Milhões de negociações diárias com a movimentação de grandes montantes de capital, volatilidade no valor de partes fracionárias de sociedades empresariais e um considerável risco financeiro são características que definem o mercado financeiro de capitais, de forma que, naturalmente, surgem práticas não aceitas dentro do contexto mercantil a ser explorado, que deve se pautar pela boa-fé dos participantes.

Tais práticas podem assumir diversas roupagens e, a depender da intenção e dos instrumentos utilizados pelo operador, são consideradas pela legislação brasileira como crime contra o sistema financeiro nacional e o mercado de capitais, previstos na lei 6.385/76.

Todavia, é necessário que se pontue que a volatilidade, a constante modificação dos fatores regentes dos preços e o frequente aperfeiçoamento das técnicas de operação no mercado contribuem para a dificuldade na definição de quais práticas não seriam aceitas.

Portanto, a solução adotada pelo legislador pátrio foi enquadrar as condutas não aceitas em um elemento artificioso, punindo as condutas do agente que simula operações ou executa manobras fraudulentas com o fim de manipular o preço ou o volume de determinado ativo mobiliário, conforme previsão do Art.27-C da lei 6.385/76.

Neste contexto, é importante trazer a definição do elemento "fraude" descrito no tipo penal em comento o qual, de acordo com o Dicionário Oxford Languages, significa "qualquer ato ardiloso, enganoso, de má-fé, com o intuito de lesar ou ludibriar outrem, ou de não cumprir determinado dever; logro."

À vista disto, nota-se que o elemento central do crime de manipulação de mercado é de difícil definição e delimitação prática, tendo em vista que, em alguns casos, constitui-se quase em um elemento subjetivo, uma força motriz para a prática da conduta, sobretudo nas hipóteses em que o agente visa causar danos a terceiros.

Nesta linha, diante da dificuldade de determinação dos fatores motivantes de uma operação de mercado e, ainda que pesem contra o operador razoáveis suspeitas, haveria de se admitir determinados riscos que seriam, em última análise, inerentes à complexidade de funcionamento do mercado de capitais, tendo em vista que determinados comportamentos podem ocasionar movimentações bruscas de mercado.

É possível exemplificar algumas operações que ocasionam a acentuação de fatores de volatilidade no mercado de capitais, tais como o short selling, venda de valores mobiliários que não são de propriedade do operador, também chamadas de vendas cobertas ou descobertas, esta prática tende a diminuir o preço das ações.

Pode-se mencionar também os high-frequency tradings, tipos de negociações normalmente feitas por computadores e guiadas por um algoritmo que determina as situações em que será disparada uma ordem de venda ou de compra. Entretanto, por serem comumente realizadas por computadores (robôs) a velocidade dos processos é enorme, de forma que aumenta os riscos financeiros das operações, podendo sobrecarregar os sistemas e alterar o funcionamento do mercado.

Assim sendo, denota-se que haveria um limiar de tolerância para as práticas operacionais de mercado, adstrito aos riscos presentes no próprio cotidiano financeiro, de forma que o estreitamento das balizadas toleradas poderia comprometer o adequado funcionamento do mercado financeiro de capitais, devido à grande velocidade de operacionalização, volume de capital, volatilidade, diversificação e constante aperfeiçoamento dos métodos.

Leonardo Tajaribe Jr.

VIP Leonardo Tajaribe Jr.

Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]

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