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Pitos eleitorais e democracismos libertinos

É hora de instituições, entidades, partidos, empresas, imprensa e população agirem em abono à reação da Justiça Eleitoral, a qual deve ser rápida e, dessa vez, de fato "efetiva".

quarta-feira, 18 de maio de 2022

Atualizado às 11:11

Em meados de 2018, o então presidente do TSE, por mais de uma vez anunciou que a Justiça Eleitoral não iria admitir a disseminação massiva de "fake news" eleitorais. Prometeu-se combate "efetivo" a esse tipo de abuso1.

O resultado, entretanto, ficou distante do que pretendido pela Corte Superior Eleitoral.  

Por todos os que denunciaram a explosão dessa prática nociva, a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, liderou uma série de reportagens que mergulharam a fundo no submundo clandestino da produção, disseminação e impulsionamento de publicidade eleitoral irregular. Parte desse submundo, ficamos sabendo, mantinha-se sediado no exterior, em "bunkers virtuais" contratados pelos beneficiários locais. Estava, ali, sendo dada luz e forma àquele ambiente em que todos os que fazemos uso de rede social já nos afogávamos: um verdadeiro redemoinho de "notícias" falsas, montagens, vídeos e áudios forjados aos turbilhões para fins eleitoreiros torpes, visando a turbar o livre convencimento do eleitor. E que, em muitos casos, foram "efetivos"; invariavelmente, em seu aspecto destrutivo: afundaram reputações, criaram factoides demolidores, provocaram prejuízos financeiros incalculáveis, forjaram realidades paralelas insustentáveis...

Mas a reação das cortes eleitorais, como vimos, contidas no limitado mundo do Direito, infelizmente não foi tão "efetiva". Em 2018, os beneficiários dessas aberrações seguiram impunes; lépidos, faceiros...

Um problema dessa magnitude exige uma solução amplificada: todo o "sistema" tem que reagir para combater uma espécie de distorção que é sistêmica, fruto da nova realidade de comunicação em massa, desregrada, desregulada e (aparentemente) caótica. 

Assim como é necessário o concurso de todos os democratas, todas as instituições, para combater atos, condutas e massacres antidemocráticos.

Não foi nada bom ver que, mais de 3 anos após, admitindo a "inefetividade" de então, a Justiça Eleitoral se viu obrigada a "passar o pano" nos comprovados abusos - públicos, notórios, esfregados em nossa cara - ocorridos em 2018. Tornou-se famoso o verdadeiro "voto-pito" de um ministro do TSE: sabemos o que fizeram no verão passado; não os puniremos agora, mas se voltarem a fazer no próximo verão...

E eis que, em pleno outono, chegou o próximo verão!

Ainda na metade de maio de 2022, a imprensa já noticia impulsionamento espúrio de publicidade (pré) eleitoral de candidatura ao governo do estado do Paraná, por meio do aplicativo whatsapp. Fala-se de um vídeo editado com material eleitoral, em que determinado candidato se coloca como a melhor opção em detrimento de outros dois mais bem posicionados nas pesquisas. 

A escancaração do ilícito foi a ponto de a própria empresa whatsapp anunciar que baniu 2 contas identificadas como sendo a origem dos disparos em massa. Coisa que, na verdade, pouco ou nada resolve, já que essas contas são fantasmas, robóticas, temporárias. E, ao que parece, já cumpriram sua finalidade: o disparo em massa de publicidade eleitoral espúria. Outras podem surgir aos milhares; e desaparecer num piscar de olhos.

O pleito de 2018 revelou que antes de se cogitar desmoralização, a Justiça Eleitoral precisava, sim, era de cuidado especial. Ser ombreada por todas instituições; abraçada por toda população. Todos juntos para combater essa prática insidiosa e corrosiva. "Fakes" eleitorais não são contidas só com gogó ou ameaças. É preciso estrutura agregada, apoio interinstitucional, além do concurso de todos os atores do jogo eleitoral, inclusive - mas não só - da imprensa e das empresas de mídias sociais. Há que se separar a democracia dos "democracismos" oportunistas; a liberdade das libertinagens de conveniência.

O episódio de agora, mês de maio de 2022, 04 anos depois daquela mixórdia eleitoral, exige, mais que nunca, a tal "efetividade" como resposta.

É hora de instituições, entidades, partidos, empresas, imprensa e população agirem em abono à reação da Justiça Eleitoral, a qual deve ser rápida e, dessa vez, de fato "efetiva". A resposta há de ser contundente; um recado inibitório eloquente. Nossa vilipendiada democracia pode não suportar até o próximo verão...

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1 Notícia do Portal do TSE de 13/08/2018: https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2018/Agosto/ministro-luiz-fux-afirma-que-justica-eleitoral-faz-combate-efetivo-as-fake-news

Paulo Calmon Nogueira da Gama

VIP Paulo Calmon Nogueira da Gama

Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio, Desembargador do TJMG.

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