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A população carente do DF necessita da advocacia dativa

A OAB/DF não quer confronto com a Defensoria Pública, mas sim a efetivação dos direitos da população e de profissionais que atuam como dativos.

quinta-feira, 26 de maio de 2022

Atualizado às 07:37

Aos 18 anos de idade, o advogado Mateus Costa Ribeiro realizou a sua primeira sustentação oral no Supremo Tribunal Federal (STF), consagrando-se como o mais jovem a subir à tribuna da Corte com tamanha responsabilidade. Isso foi amplamente noticiado, em 2018. Ele representava um partido político em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn 6036) contra uma lei estadual (12.285/05) do Rio Grande do Sul. Já em 2020, o plenário virtual do STF decidiu pela inconstitucionalidade da norma, por maioria dos votos. Aqui o objetivo não é retomar a causa, esse julgamento, mas trazer à lembrança o exemplo de um jovem advogado reconhecido em mídia nacional, efusivamente, por sua habilidade, competência e assertividade. Como Mateus, muitos profissionais iniciantes surpreendem e são imprescindíveis à administração da Justiça.

Feita a apresentação desse caso emblemático, de viva memória, este artigo quer reafirmar o posicionamento da Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF) de que a advocacia iniciante pode e deve apoiar de modo extremamente eficiente a sociedade em atenção aos que mais precisam, os hipossuficientes, aqueles que não têm recursos econômicos para enfrentar demandas judiciais, mas que sofrem por riscos evidentes de estarem marginalizados na prestação de serviços jurídicos. Isso já acontece e muito. No país, a advocacia dativa tem se mostrado apta e absolutamente necessária no trabalho complementar ao árduo exercício das Defensorias Públicas. 

Justamente pela relevância do apoio às Defensorias Públicas, no Distrito Federal, pela OAB, propusemos ao governador Ibaneis Rocha que a advocacia dativa fosse estabelecida em lei. A sensibilidade do governador - um advogado licenciado - foi tamanha que acolheu a iniciativa. A equipe do Governo do Distrito Federal (GDF) apresentou, depois, uma nova minuta de projeto. Debatemos, respeitosamente. Chegamos ao texto possível. Agora, tramita na Câmara Legislativa (CLDF). Nossa expectativa, após audiência pública realizada nesta semana, pela CLDF, e que trouxe os devidos esclarecimentos sobre as intenções da OAB/DF e do GDF, é de que os deputados distritais votarão o mais brevemente possível, convertendo esse texto em lei. 

Houve e continuam existindo resistências por parte de defensores. Inclusive, tivemos uma situação inadmissível, de a honra da jovem advocacia ser ferida nas argumentações de uma dirigente de entidade dos defensores públicos. Já estamos exigindo a retratação das ofensas proferidas sem quaisquer justificativas possíveis. O que resta a ser feito é um sincero e direto pedido de desculpas. Não podemos conceber que uma dirigente, dentre os defensores, venha "frisar" que o projeto estaria "precarizando de maneira absurda o acesso à Justiça", pois, ao se destinar a "advogados iniciantes", estar-se-ia "dizendo que a população (.) não merece uma defesa de qualidade". Divergências não significam tolerância a ataques. O entendimento da OAB/DF é de que deve haver retratação imediata, formal e proporcional às ofensas perpetradas contra a jovem advocacia.

Mas por que a advocacia dativa deve ser estabelecida em lei? Porque se trata de dar consequência a uma política de Estado em que se combate o desalento, o desemprego e a pobreza. A advocacia dativa não atende quem pode pagar, mas os que não têm quaisquer recursos para ter o direito à defesa técnica e ao amplo contraditório em casos que tramitam na Justiça. São claros esses comandos constitucionais no artigo 5º, inciso LV da Carta Magna. Há mais princípios que sustentam a iniciativa do projeto como os da isonomia e da efetividade da jurisdição, que estão contemplados no artigo 5º, incisos LXIII, LXXIV e LXXVIII da Constituição Federal. Ainda se argumenta que na hierarquia constitucional o sistema de Justiça e a organização judiciária instituem que a advocacia é indispensável à administração da Justiça (artigo 133).

A legalidade da atuação da advocacia particular na prestação de assistência judiciária está no artigo 2°, parágrafo 2° da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia). Também, os profissionais têm a previsão legal explícita no artigo 22, parágrafo 1º, da mesma norma, estabelecendo que ao patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, "a advocacia tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado".

Além de todo esse arcabouço jurídico que cerca o tema, é fundamental lembrar que a Defensoria Pública não consegue dar atendimento à integralidade de demandas que recebe. Como disse na audiência pública realizada na CLDF e aqui concluo: Se a Defensoria não consegue atender 100%, que ela atenda 60%, 80% ou até 95%, e a advocacia dativa fique só com 5%, não tem problema. No dia que a Defensoria Pública conseguir atender 100% dos casos, não será mais necessária a advocacia dativa, mas até lá a população não pode ficar desassistida e os advogados iniciantes não podem ser discriminados. Lutamos por isso! Afinal, a OAB/DF não quer confronto com a Defensoria Pública, mas sim a efetivação dos direitos da população e de profissionais que atuam como dativos.

Délio Lins e Silva Júnior

Délio Lins e Silva Júnior

Presidente da OAB/DF.

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