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A relevância dos direitos do idoso e a sua inefetividade

Luciana Carabagialle e Jamile A. Machnicki

A concretização dos direitos do idoso no Brasil está necessariamente associada a uma mudança cultural de aspecto social.

terça-feira, 28 de junho de 2022

Atualizado às 08:43

Envelhecer é inerente à condição humana. Faz parte da vida. De fato, só deixará de envelhecer, quem antes disso não mais estiver vivo.

Logo, é indispensável que o legislativo, o executivo e o judiciário se preocupem em contemplar, realizar e garantir os direitos dos idosos, sobretudo à proteção, à segurança, ao lazer e às oportunidades. Sendo igualmente importante que todos os cidadãos, enquanto sociedade, respeitem, acolham e deem espaço a essa população.

A Organização Mundial de Saúde (OMS), entende como idoso o indivíduo que tenha 60 anos ou mais. O conceito foi incorporado pelo Brasil e está contido no Estatuto do Idoso, mais precisamente em seu artigo 1º. 

De acordo com Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre os anos de 2012 e 2017, houve um significativo aumento da população idosa no país, na ordem de 18%. E, considerando fatores como o aumento da qualidade de vida e a expansão da mulher no mercado de trabalho (causa diretamente ligada à diminuição da natalidade em países desenvolvidos), esse número só tende a crescer.

No processo de envelhecimento, a vida do homem como ser social contempla, além de mudanças biológicas, mudanças socioculturais. Significa dizer que o envelhecer atinge não apenas o indivíduo, mas também a estrutura do meio em que está inserido, a saber: a família, as instituições públicas e privadas, a política, e toda a organização contida na sociedade. 

O que se nota, contudo, é uma grande ambivalência relacionada aos idosos. Se, por um lado, exalta-se toda a sua experiência e sabedoria, por outro desvaloriza-se a sua força de trabalho e capacidade contributiva, em decorrência da inerente e natural vulnerabilidade, fragilidade física e, por vezes, de uma maior dificuldade em acompanhar a desenfreada movimentação e inovações do mundo atual, ainda que o envelhecer ocorra de forma saudável e adequada.

E é nesse contexto que o tema se torna especialmente relevante para os poderes legislativo, executivo e judiciário, que possuem o "poder dever" de elaborar, exercer e garantir os direitos dos idosos em meio a uma sociedade que, em grande parte, não os percebe como verdadeiramente úteis e importantes.

No ordenamento jurídico brasileiro, diversos diplomas legais contemplam a defesa dos idosos, a começar pela própria Constituição Federal de 1988, a Política Nacional do Idoso (lei 8842/94), a Lei de Prioridade de Atendimento às Pessoas com Deficiência, aos Idosos, Gestantes e Lactantes (lei 10.048), o Estatuto do Idoso (lei 10.741), o Benefício de Prestação Continuada (decreto 6.214) e o Fundo Nacional do Idoso (lei 12.213); com o objetivo de assegurar e proteger o direito de envelhecer, o direito à vida, à saúde, à liberdade, à cultura, ao lazer, ao transporte, ao acesso à justiça, à previdência, ao atendimento preferencial, dentre outros.

Ainda, destaca-se a previsão do artigo 54-C, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, que veda o assédio ao idoso para qualquer tipo de contratação; e o artigo 55-J, inciso XIX, da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), recentemente publicada, segundo o qual o registro dos dados das pessoas idosas será efetuado de forma simples ao seu entendimento.

Porém, observando a prestação dos serviços públicos relacionados e o modo de pensar e agir de grande parte da sociedade, o que se constata é uma significativa discrepância entre o que está contido na legislação e o que vem sendo empregado na realidade. 

Segundo a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, a inefetividade das normas não está relacionada apenas à ineficácia das ações governamentais, mas também e principalmente ao preconceito contra a velhice e à negação social.

Isso ocorre porque histórica e culturalmente o Brasil não se planejou para atender as necessidades e a respeitar as características das pessoas idosas, de forma que o envelhecimento é tratado em geral como um problema para o Estado, para a família e para toda a sociedade.  

Neste sentido, de nada adianta termos vasta legislação, se não conseguirmos colocar em prática o contido nos textos legais, o que exige conscientização e verdadeiro comprometimento de todos.

Desta forma, conclui-se que a efetiva concretização dos direitos do idoso - que ainda engatinha em nosso país - passa pela necessária existência de leis, do exercício de políticas públicas e da proteção judicial, mas também está associada a uma necessária mudança cultural no aspecto social, abrangendo todas as instituições e a sociedade como um todo.

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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União; 10 jun.

BRASIL. Lei n. 8.842, de 4 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União 1994; 4 jan.

MONTEIRO, Ana Clésia Lisboa. et al. Envelhecimento populacional: efetivação dos direitos na terceira idade. Fev., 2018, v.12, n. 2, a 29, p.1. Disponível em https://doi.org/10.22256/pubvet.v12n2a29.1-8.

Luciana Carabagialle

Luciana Carabagialle

Advogada no escritório Popp Advogados Associados.

Jamile A. Machnicki

Jamile A. Machnicki

Advogada no escritório Popp Advogados Associados.

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