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Ensaio doutrinário acerca do instituto da graça

O perdão concedido pelo presidente simboliza o sistema de freios e contrapesos na engenharia republicana.

sexta-feira, 1 de julho de 2022

Atualizado em 4 de julho de 2022 10:25

Segundo o inciso XII, do art. 84, da CF/88, compete privativamente ao presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei. Deve-se pontuar que as únicas limitações para a aplicação do referido instituto estão previstas no inciso XLIII, do art. 5°, da Carta Magna verde-amarela.

Entrementes, cabe mencionar que o ordenamento jurídico brasileiro não faz uma límpida distinção entre indulto e graça em sentido restrito.

Logo, cumpre-se diferenciar os dois institutos. O indulto é direcionado aos sentenciados que cumprem pena privativa de liberdade e que se incluem nas hipóteses condescendentes previstas no decreto presidencial, dentre elas, pode-se citar determinado tempo de encarceramento e satisfatório comportamento carcerário. O indulto é comumente praticado no Brasil, principalmente, na época do Natal.

Já a graça, é o perdão da pena de um condenado, sendo individualmente fixado. De acordo com Guilherme de Souza Nucci1 (2003, p. 487) a graça é a clemência destinada a uma pessoa determinada, não dizendo respeito a fatos criminosos. Cuida apenas de perdoar o infrator dos efeitos criminais determinados no decreto gracioso, logo limita-se aos efeitos executórios, não alcançando, portanto, os efeitos secundários, como a reincidência, por exemplo.

Para Maria Helena Diniz2 (DINIZ, p. 674) "a graça é o perdão concedido pelo presidente da República, favorecendo um condenado por crime comum ou por contravenção, extinguindo-lhe ou diminuindo-lhe a pena imposta".

Segundo Nucci3 (2003, p. 487), "A Lei de Execução Penal passou a chamá-la, corretamente, de indulto individual (art. 188 a 193), embora a CF/88 tenha entrado em contradição a esse respeito. No inciso XLIII, do art. 5°, utiliza o termo graça e no inciso XII, do art. 84, refere-se tão somente a indulto. Portanto, diante deste flagrante indefinição, o melhor a fazer é aceitar as duas denominações: graça ou indulto individual".

A graça pode ser total ou parcial, a primeira abrange todas as sanções impostas ao condenado, e a segunda alcança apenas alguns aspectos da condenação, a reduzir ou substituir a sanção aplicada.

Dado o exposto, torna-se fundamental informar que a graça não está submetida à validação de outro Poder, não passível de questionamento jurídico, nem legislativo. Tendo em vista ser um ato deliberativo exclusivo da presidência da República, pois configura-se como um ato de Estado e não como um ato administrativo.

Nessa lógica, ganha notoriedade a menção de Cezar Roberto Bitencourt4 (2021, p. 979) ao ensinamento de Maggiore, "anistia, graça e indulto constituem uma das formas mais antigas de extinção da punibilidade, conhecidas como clemência soberana, e justificavam-se pela necessidade, não raro, de atenuar os rigores exagerados das sanções penais, muitas vezes desproporcionais aos crimes praticados".

Desta feita, é possível compreender a utilização dos institutos mencionados como a representação do sistema de freios e contrapesos na República, o qual consiste no controle de um Poder por outro Poder. Entende-se que cada Poder teria autonomia para efetivar suas respectivas funções, todavia seriam controlados pelos demais. Portanto, conclui-se que o mecanismo supracitado tem por objetivo afastar eventuais abusos no sistema republicano.

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1 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. Página 487.

2 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico - Volume 1. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. Página 674.

3 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. Página 487.

4 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 27ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021. Página 665.

Humberto Camargo Brandão Neto

Humberto Camargo Brandão Neto

Estudante de Direito da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e estagiário de Direito na Camargo & Pagani Consultoria e Assessoria Jurídica.

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