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A correta utilização do banco de horas

O banco de horas exige uma administração muito atenta, tanto pelo empregado pelo empregador, sob pena de detrimento deste ou daquele se não utilizado de forma correta e o melhor modo de se mitigar qualquer questão é uma gestão transparente.

terça-feira, 30 de agosto de 2022

Atualizado em 31 de agosto de 2022 14:08

Muitos empregadores, sob o fito de evitar o devido pagamento de horas laboradas em regime de sobrejornada, optam por lançar mão do "Banco de Horas"; todavia, por não conhecer tal instituto com a devida clareza ou por utilizá-lo de forma inadequada acabam, não raras vezes, obrigados a responder pelas horas que equivocadamente julgou compensadas.

O Banco de Horas foi inicialmente previsto pela lei 9.601 de 21 de janeiro de 1998 - a qual trata do contrato de trabalho por tempo determinado e outras providências -, por força da qual os parágrafos 2º e 3º do art. 59 passaram a prever:

§ 2º Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de cento e vinte dias, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias.

§ 3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma do parágrafo anterior, fará o trabalhador jus ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão.

Perceba-se, referida compensação exigia a previsão em sede de acordo ou convenção coletiva de trabalho e estava limitada à jornada máxima de 10 horas, sendo também certo que, no período de 120 dias não se poderia superar as jornadas semanais.

Por ilustração, traga-se à baila decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Regiões:

PRESTAÇÃO DE LABOR ALÉM DE DEZ HORAS DIÁRIAS - NULIDADE DO BANCO DE HORAS - Ocorreu de o autor laborar além de dez horas diárias, o que conduz à nulidade do banco de horas, consoante artigo 59, § 2º, da CLT. Quanto ao pedido sucessivo, inaplicável a súmula 85 do TST, uma vez que não se trata de compensação semanal de jornada. (TRT-9 - ROT: 00002658720215090002, Relator: SERGIO MURILO RODRIGUES LEMOS, 3ª Turma, Data de Publicação: 9/12/21)

Ainda, o saldo de horas - ou seja, aquelas não compensadas - haveria de ser pago quando da rescisão do contrato de trabalho, tendo-se por base o salário à época da rescisão e respectivo adicional sobre a hora normal.

Ocorre, em 11 de novembro de 2017 entrou em vigor a lei. 13.467 - conhecida como Reforma Trabalhista - havendo considerável impacto sobre o instituto em comento, passando o artigo 59 consolidado a ter a seguinte redação:

CLT, art. 59 - A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

§ 1º A remuneração da hora extra será, pelo menos, 50% (cinquenta por cento) superior à da hora normal.

§ 2º Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias.

§ 3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma dos §§ 2º e 5º deste artigo, o trabalhador terá direito ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão.

§ 4º (Revogado pela lei 13.467/17).

§ 5º o banco de horas de que trata o § 2º deste artigo poderá ser pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses.

§ 6º É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês.

Uma primeira alteração que se nota é o ajuste da porcentagem de 20% (vinte por cento) do antigo texto, para 50% (cinquenta por cento) de remuneração superior à da hora normal, como previsto no art. 7, inciso XVI da Constituição Federal.

A obrigação de se pagar as horas não compensadas quando da rescisão do contrato de trabalho foi mantida pelo parágrafo 3º do artigo 59, não havendo qualquer alteração em relação à previsão legal antecedente.

O parágrafo 4º - o qual previa a vedação do empregado sob regime de tempo parcial de se efetivar em sobrejornada de trabalho - foi revogado em razão do artigo 58-A da Consolidação das leis do Trabalho, a partir do qual passou-se a prever a possibilidade de que tal categoria de trabalhador possa sim exercer horas em regime extraordinário:

CLT, art. 58, caput -A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais. (Redação dada pela lei 13.467, de 2017)

Importante mudança reside no parágrafo 5º do artigo em tela, pois passou-se a prever a possibilidade de que o Banco de Horas possa ser ajustado mediante acordo individual, sendo despiciendo haja autorização por acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Todavia, não conserva o empregador ilimitada liberdade para estabelecer o que e como desejar, vez que o próprio artigo 5º estabelece que as horas extras hão de ser compensadas no prazo máximo de 6 meses, o que importa em compreender que se não compensadas em tal período hão de ser pagas.

Outrossim, relevante ter atenção ao fato de que o legislador autorizou - conforme parágrafo 6º - que o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual poderá sê-lo tácita ou expressamente, para a compensação no mesmo mês. Em que pese a permissão de ajuste tácito, recomendamos que o acordo de compensação de horas seja feito expressamente, por escrito.

O encargo probatório em relação à escorreita fruição do banco e horas é da empresa, sendo recomendado que o empregado tenha como acompanhar seu saldo - positivo ou negativo - sob pena do empregador sofrer condenação, consoante a ementa que segue:

HORAS EXTRAS. NULIDADE DO BANCO DE HORAS. A condenação ao pagamento de horas extras, no caso, decorre da declaração de nulidade do banco de horas implementado pela ré. Com efeito, por se tratar de fato extintivo do direito do obreiro, era da ré o ônus de demonstrar o implemento das condições contidas em mencionada cláusula. Inteligência dos arts. 818 da CLT e 373, II do CPC. Em que pese a previsão normativa para a instituição de banco de horas, bem como a anotação nos cartões de ponto de que eventualmente o reclamante tenha usufruído folgas a tal título, não havia como o obreiro controlar de forma adequada o saldo do banco de horas. (TRT-2 10007279720215020074 SP, Relator: IVANI CONTINI BRAMANTE, 4ª Turma - Cadeira 5, Data de Publicação: 15/6/22)

Por cautela, ressaltamos que a existência de um "Banco de Horas" não deve autorizar a prática deliberada de trabalho além da jornada, pois as horas laboradas além da jornada terão sempre um custo ao empregador, seja com a compensação do empregado, seja em razão de seu pagamento.

Se não o bastante, o trabalho desenvolvido em condições insalubres pelo trabalhador, sem a licença prévia da autoridade em matéria de higiene do trabalho, implica a nulidade do banco de horas pois, a partir do cancelamento da Súmula 349 do TST, prevalece o entendimento de que as prorrogações de jornada só poderão ser acordadas mediante referida licença, ressalvado o disposto no artigo 611-A, inciso XIII da Consolidação das Leis do Trabalho:

CLT. art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho; (Incluído pela lei 13.467, de 2017)

Neste sentido, decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região:

BANCO DE HORAS. INVALIDADE. O labor em condições insalubres pelo reclamante, sem a licença prévia da autoridade em matéria de higiene do trabalho, implica a nulidade do banco de horas, pois a partir do cancelamento da Súmula 349 do TST prevalece o entendimento de que as prorrogações de jornada só poderão ser acordadas mediante referida licença, ressalvado o disposto no artigo 611-A, inciso XIII, da CLT. (TRT18, ROT - 0010576-10.2020.5.18.0104, Rel. GENTIL PIO DE OLIVEIRA, 1ª TURMA, 20/8/21)

Por fim, os empregados devem ter muita atenção para que o registro das horas extraordinárias esteja sendo feito corretamente, sempre mantendo-o sob seu controle, pois evidenciam-se casos em que horas trabalhadas simplesmente "somem" do Banco de Horas e casos em que a compensação não é de fato realizada.

Assim, certo é que o "Banco de Horas" exige uma administração muito atenta, tanto pelo empregado pelo empregador, sob pena de detrimento deste ou daquele se não utilizado de forma correta e o melhor modo de se mitigar qualquer questão é uma gestão transparente.

Fernando Borges Vieira

VIP Fernando Borges Vieira

Advogado desde 1997 - OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 - Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados, Mestre em Direito (Mackenzie).

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