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A altivez democrático - Republicana do STF no governo Bolsonaro

Para arrematar, cumpre advertir a respeito da imperiosa necessidade da democracia espraiar pelo mundo os seus poderes e valores, para conter o avanço da extrema direita ocorrido desde o início deste século, inclusive aqui no Brasil nos últimos quatro anos.

terça-feira, 8 de novembro de 2022

Atualizado às 13:18

Tem sido recorrente nas hostes bolsonaristas o entendimento de que o STF tem agido de forma antidemocrática, ao coibir manifestações atentatórias contra a Corte e seus ministros.

Como cediço, a república é um dos maiores esteios da democracia, esta sim  vocacionada à proteção das liberdades públicas e da igualdade, através de um governo da maioria, sem menosprezo das minorias. Já na república o que se almeja é o primado da lei e da Constituição, o respeito às instituições e à res publica.

No Brasil, notadamente no governo Bolsonaro, o que temos visto é um Poder Judiciário, em especial o STF, frequentemente desrespeitado e deslustrado por seguidores do Presidente, que, alegando um malfadado ativismo judicial da Suprema Corte, atentam mais contra a república do que contra a democracia.

Com efeito, Bolsonaro não é um ditador ou golpista, como pensam alguns menos avisados. Ele, malgrado viole algumas regras do jogo democrático, a exemplo de acusações infundadas de fraudes nas eleições, sempre -- durante sua vida de quase 30 anos como Deputado Federal e em 2018 eleito Presidente da República --- foi escolhido pelo voto popular.

Ele, inobstante tenha um perfil autoritário, nunca se apresentou como um ditador ou golpista, o que demandaria organização e o objetivo de enfeixar um poder centralizado e autocrático, do que está manifestamente desvestido.

O que o Presidente faz reiteradamente, de revés, é atacar as instituições da república, a Constituição e as leis, bem assim a res pública.

Efetivamente, ele rasga a todo tempo a Carta Magna, ao violar o direito a um meio ambiente sustentável e hígido, o direito à saúde e à educação, bem assim no que diz respeito à cultura, à ciência, à pesquisa e a uma universidade de qualidade, dentre outras coisas.

No que atina à deterioração das instituições  republicanas  e da coisa pública, basta atentar para a debilidade dos seus Ministérios, como sói acontecer com os da Educação, Saúde, com sucessivas trocas de Ministros, Meio Ambiente, onde cogitou, segundo a fala do respectivo Ministro da pasta, " passar a boiada",Relações Exteriores e outros.

Nesse diapasão, não é demasia recordar que o SUS, não fosse o seu sucesso na pandemia, estava prestes a ser privatizado, de acordo com o intuito do Presidente e de seu Ministro Paulo Guedes.

Por outro lado, a relação promiscua do Presidente com o Congresso, a exemplo do orçamento secreto, toma lá dá cá e quejandos, revela o seu total desapreço para com essa magna instituição da república.

Com o STF não tem sido diferente. De fato, os briosos e competentes ministros da Corte, tais como Alexandre de Moraes, Fachin, Fux , Barroso, etc, têm posto cobro às teratológicas investidas de correligionários do Presidente contra si e a Instituição , sob o colorido de uma pretensa violação da liberdade de expressão ou manifestação.

Como sabido, nenhum direito fundamental é absoluto, sendo certo que as liberdades de expressão e manifestação possuem limites imposto pela lei e pela CF, como sói acontecer com a vedação de agressões físicas ou morais, fake News etc a esse pretexto cometidas.

Não se pode olvidar, nesse particular, a antológica decisão do STF no caso da distribuição de competências dos entes federados na gestão da pandemia. Não fosse o aludido julgado, o Presidente da República concentraria em suas mãos plenos e absolutos poderes, o que geraria, pelo que se depreende de suas ações no trato do problema, um aumento considerável no número de mortos. 

Demais disso, as decisões tomadas pelo STF e TSE na condução do processo eleitoral, bem assim aquela referente à inconstitucionalidade dos Decretos  que liberaram os porte e a posse de armas de fogo são também merecedoras de aplausos.

Do que vem de ser exposto se constata que o STF, nas mãos firmes e determinadas dos seus eminentes ministros, é merecedor dos mais altos encômios, seja porque não se deixou deteriorar no enfretamento desses problemas, seja porque as suas decisões foram pautadas com fiel adstringência à Constituição.

Ademias, não se afigura uma distopia imaginar que se a eleição fosse vencida pelo atual Presidente as instituições republicanas, notadamente o STF, correriam risco de soçobrar nos quatro anos vindouros.

Nesse diapasão, impende assinalar que, não fosse a vitória do Presidente eleito, o atual Presidente enfeixaria em suas mão poderes absolutos, com um Congresso majoritariamente conservador e alinhado com o Executivo, e um Judiciário fragilizado, com mais dois ministros indicados por Bolsonaro, sem prejuízo de processos de impeachment contra ministros da Suprema Corte tramitarem com celeridade no Senado.

Por outro lado, calha afirmar, na contramão do que pensam os aliados do atual Presidente da República, que não se pode imputar ao Judiciário, em especial o STF, os crimes de hermenêutica e de ativismo judicial, posto que de crimes não se cuidam.

De fato, o conteúdo polissêmico e plurissignificativo da nossa CF dá margem a interpretações e decisões díspares no STF, não podendo isso ser considerado crime, mesmo porque ao mais das vezes fundamentadas. De outro lado, o ativismo judicial pode, em algumas hipóteses, ser salutar e necessário, como já tivemos a oportunidade de escrever nesse respeitável site jurídico, não podendo, de igual forma, ser considerado crime, mesmo porque praticado nos tribunais constitucionais e supremas cortes das maiores democracias do mundo.

Para arrematar, cumpre advertir a respeito da imperiosa necessidade da democracia espraiar pelo mundo os seus poderes e valores, para conter o avanço da extrema direita ocorrido desde o início deste século, inclusive aqui no Brasil nos últimos quatro anos.

Gustavo Hasselmann

VIP Gustavo Hasselmann

Procurador do município de Salvador/BA. Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Processo Civil e Direito Administrativo. Membro do IAB e do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo.

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