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Empresas do setor de eventos ficam sem pagar impostos até março de 2027

Com a crise sanitária que assolou o Brasil e o mundo foram propostas medidas para a consolidação de estabilizadores automáticos da economia por intermédio da tributação

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Atualizado às 09:57

1. INTRODUÇÃO:

O Brasil inaugurou em outubro de 1988 a mais recente era do seu Estado democrático de direito, promulgando constituição libertadora, social e que cumpriu com as aspirações da sociedade brasileira, após 19 anos de regime de exceção.1

A sistemática de estruturação da constituição foi muito assertiva ao elencar em seu primeiro artigo direitos fundamentais e sociais, apresentando como basilares a assistência à saúde, educação, moradia e lazer.

Em uma comunidade social, política e democrática a obediência ao sistema de normas e leis é fator preponderante e inevitável. Referido sistema é representada pelo Estado, ao qual compete atribuir direitos e deveres, e que busca efetivar direitos estampados na constituição, sendo obrigação que cada indivíduo arque com sua parte.2

No primeiro capítulo, pretende-se identificar o intuito de instituição da lei 14.148/21 e os critérios para transação tributária na legislação.  No segundo capítulo, busca-se analisar outras oportunidades descritas na lei do PERSE. Por fim, descreve os aspectos práticos dos benefícios descritos na lei.

2. A LEI 14.148/21 E A TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA

Com a crise sanitária que assolou o Brasil e o mundo foram propostas medidas para a consolidação de estabilizadores automáticos da economia por intermédio da tributação3, visando atenuar ciclos econômicos em fases de lentidão econômica.

Sendo necessário a avaliação e aplicação de plano de ação em cenário pós pandemia, com políticas públicas efetivas que sustentam a recuperação da economia4 (OECD, 2020, p. 36-44)

A tributação é uma das principais formas que o Estado possui para arrecadação de renda5, isto não pode representar perecimento dos indivíduos. Um dos setores mais afetados pela crise sanitária é o setor de eventos, além de casas de shows e bares.

Dito isto, a lei 14.148, de maio de 2021, instituiu Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos, PERSE, no qual pessoas jurídicas do setor de eventos obtiveram alternativas emergências e temporárias aos prejuízos e débitos inscritos em dívida ativa da União provocados pelos efeitos do coronavírus (COVID-19).

O setor de eventos é definido na própria lei 14.148/21, em seu art. 2º, que diz que se consideram pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente6

Muito se tem falado sobre a transação tributária, com data limite de adesão datado para o final de outubro de 2022, até o momento, que tem cobertura a todas as pessoas jurídicas adquirentes ao simples nacional, lucro real e lucro presumido.

Quanto a transação a legislação abrange todas as empresas do setor de eventos, estando com débitos inscritos em dívida ativa, referentes a tributos de competência federal, conforme dispõe o art. 3º7 da legislação excepcional.

Importante o esclarecimento, que para o enquadramento na transação tributária é fundamental que a empresa não tenha capacidade de pagamento alta ou que esteja em declínio financeiro, segundo critério adotado na Lei do Perse.

A transação do Perse representa ótima oportunidade para empresas em capacidade financeira reduzida o § 1º do art. 3º da lei 14.148 determina que: "aplicam-se às transações celebradas no âmbito do Perse o desconto de até 70% (setenta por cento) sobre o valor total da dívida e o prazo máximo para sua quitação de até 145 (cento e quarenta e cinco) meses, na forma prevista no art. 11 da lei  13.988, de 14 de abril de 2020, respeitado o disposto no § 11 do art. 195 da Constituição Federal".

Ademais, as empresas do setor de eventos têm garantido que não será exigido o pagamento de uma entrada mínima como condição para a adesão e que não será exigida a apresentação de garantias reais ou fidejussórias, inclusive alienação fiduciária sobre bens móveis ou imóveis e cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, títulos de crédito, direitos creditórios ou recebíveis futuros. Acrescenta-se que empresas que aderiram anteriormente a outra transação, ele só poderá ingressar nesta da lei 14.148 se desistir do parcelamento anterior

Por fim, o § 3º do art. 3º da lei 14.148, "o requerimento de adesão à transação implica confissão irrevogável e irretratável dos débitos abrangidos pelo parcelamento e configura confissão extrajudicial, podendo as pessoas jurídicas do setor de eventos, a seu critério, não incluir no parcelamento débitos que se encontrem em discussão na esfera administrativa ou judicial, submetidos ou não a causa legal de suspensão de exigibilidade".

Conclui que empresas que não aderiram a transação até a data descrita, caso não ocorra prorrogação, podem buscar outras transações não inclusas na Lei do Perse.

3. DEMAIS BENEFÍCIOS DA LEI 14.148 A EMPRESAS DO SETOR DE EVENTOS

A Lei Perse busca criar estabilizadores na economia com a utilização da tributação, embora a transação seja importante outro benefício é preponderante na norma a alíquota zero do Imposto de Renda (IRPJ), Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS e COFINS.

De acordo com o art. 4º da lei 14.148/21: "ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta lei", "as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta lei":

Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep) (inciso I); Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) (inciso II); Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) (inciso III); e Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) (inciso IV).

Esclarece que os referidos tributos são exigidos por empresas que estão nos regimes tributários do Lucro Real e do Lucro Presumido, não são pagos por quem está no Simples Nacional, que acabam pagando estes tributos de forma unificada.

Dito isto, qualquer que seja o privilégio fiscal concedido pela União não se aplica às empresas do Simples de modo automático podendo ser discutido apenas judicialmente, por ofensa direta ao art. 146 da carta magna.

Outra possibilidade, até mais viável, é mudança de regime, ainda que esteja abaixo do teto deste regime, as empresas optantes acabam adimplindo alíquota mais elevada estando no Simples, se obtiverem faturamento elevado e sendo exigido menos impostos (sobretudo IRPJ e CSLL) no lucro real ou no lucro presumido.

Importante esclarecer que a exigência de cadastro da empresa no Cadastur é inconstitucional, a lei 14.148 tão somente determinou que aqueles que se enquadrarem nos CNAEs listados pela portaria me 7.163 de 20218 poderiam ter direito à alíquota zero, sendo esta a única restrição, qualquer outra restrição representa violação da legalidade tributária.

Não houve autorização para criação de nenhum outro requisito além dos que já constavam na própria lei original. O prazo de 60 meses começou no início da vigência da norma que definiu a alíquota zero, indo, assim, até março de 2027.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se, que poder de tributação pode e deve ser exercido respeitando sempre os princípios e fundamentos do Direito tributário9 Dentre estes princípios, o da capacidade contributiva, é o mais relevante a ser observado pelos agentes do Fisco ao interagirem com o contribuinte10, neste sentido para garantir efetividade é dever estatal não criar entraves aos estabilizadores automáticos da economia.

O PERSE, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos é um programa que busca uma atuação estatal pautada em criar estímulos à recuperação da economia, para ajudar o setor de eventos, que obviamente restou paralisado em todo período de crise sanitária, resultando em prejuízos e várias dívidas, inclusive dívidas tributárias, não sendo possível apenas uma proposta abstrata, mas efetivamente benefícios reais a empresas do setor de eventos. Não importando seu tamanho, podendo se beneficiar de um bom planejamento tributário.

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1 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 13ª Ed. Atualizada por Mizabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro, Forense, 2015, pag. 877

BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direitos e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, pag. 150.

3  BRASIL, Câmara dos Deputados, A tributação em tempos de pandemia, junho de 2020, Brasília, Estudo Técnico.

4 OECD. Tax and fiscal policy in response to the Coronavirus crisis: Strengthening confidence and resilience.

5 MARRON, Donald. If We Give Everybody Cash To Boost The Coronavirus. Disponível em: https://www.taxpolicycenter.org/taxvox/if-we-give-everybody-cash-boost-coronavirus-economy-lets-tax-it.

6 I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios,shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos,buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; II - hotelaria em geral; III - administração de salas de exibição cinematográfica; e IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

Art. 21. Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo: I - meios de hospedagem; II- agências de turismo; II-transportadoras turísticas; IV - organizadoras de eventos; V - parques temáticos; e VI -acampamentos turísticos.

Art. 3º O Perse autoriza o Poder Executivo a disponibilizar modalidades de renegociação de dívidas tributárias e não tributárias, incluídas aquelas para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), nos termos e nas condições previstos na Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020.

8 Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021.

9 LAURENTIIS, Thais de. Restituição de Tributo Inconstitucional. São Paulo: Noesis, 2015. p. 271

10 Salvador Villagra Maffiodo sobre o direito administrativo paraguaio escreve: "Poco importa que el funcionario haya utilizado las atribuciones dei poder público o los medios dei Derecho privado al realizar el acto administrativo causante dei dano. Es indiferente que el Estado haya efectuado el nombramiento mediante un acto de Derecho público o en virtud de un contrato privado (F. Fleiner. op. cit., p. 224/226)" (Princípios de Derecho Administrativo. ed. EI Foro. Asuncion, 1981, p. 302).

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BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 13ª Ed. Atualizada por Mizabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

BRASIL. Lei n. 14.148, de 03 de maio de 2021. institui o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) e o Programa de Garantia aos Setores Críticos (PGSC). Brasília, 2021. Disponível em: < https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.148-de-3-de-maio-de-2021-317508601>. Acesso em: 19 outubro 2022.

BRASIL. Portaria n. 7.163, de 21 de junho de 2021. Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021. Brasília, 2021. Disponível em: < https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.148-de-3-de-maio-de-2021-317508601>. Acesso em: 19 outubro 2022.

BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direitos e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.

CORREIA NETO, Celso de Barros; ARAUJO, José Evande Carvalho; PALOS, Lucíola Calderari da Silveira e; SOARES, Murilo Rodrigues da Cunha, A tributação em tempos de pandemia, junho de 2020, Brasília, Estudo Técnico. Câmara dos Deputados, Disponível em: < https://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/40012>. Acesso em: 19 outubro 2022.

LAURENTIIS, Thais de. Restituição de Tributo Inconstitucional. São Paulo: Noesis, 2015

MARRON, Donald. If We Give Everybody Cash To Boost The Coronavirus. Disponível em:< https://www.taxpolicycenter.org/taxvox/if-we-give-everybody-cashboost-coronavirus-economy-lets-tax-it >. Publicado em: 18 mar. 2020. Acesso em: 19 outubro 2022.

OECD. Tax and fiscal policy in response to the Coronavirus crisis: Strengthening confidence and resilience. Disponível em:< https://www.oecd.org/coronavirus/policy-responses/tax-and-fiscal-policy-inresponse-to-the-coronavirus-crisis-strengthening-confidence-and-resilience/>. Acesso em: 19 outubro 2022.

SALVADOR, Villagra Maffiodo, Princípios de Derecho Administrativo. Assuncion: EI Foro, 1981.

Rejai dos Santos Pires

Rejai dos Santos Pires

Pós-graduado em Direito tributário pela Universidade Estácio de Sá. Advogado do escritório Jacó Coelho Advogados, com sede em Goiânia/GO.

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