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Conciliação na Administração Pública e o princípio da eficiência

A conciliação pode evitar, em diversos casos, o prolongamento de processos em que a chance de êxito do ente pública é pequena, a exemplo do que ocorre no âmbito das ações de saúde, e outras situações nas quais o resultado adquirido é menor do que custo dispendido.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Atualizado às 13:02

A Constituição Federal o acesso à justiça de todos, isentando do pagamento de custas e emolumentos as pessoas que não possuíam condições de arcar com as custas de um processo sem prejuízo do seu sustento.

Nesse sentido, desde 2004 com a promulgação da Emenda Constitucional 45/04 se objetivou o aprimoramento do Poder Judiciário, com o intuito de "buscar que enfrentam diretamente as causas, e não apenas os efeitos", nas palavras de Kazuo Watanabe (p. 30)

Ainda para o referido autor: "A função do Judiciário, que já vinha ampliando por força da mudança na própria concepção das funções do Estado Moderno, foi definitivamente modificada com essas alterações das leis material e processual. O Judiciário passou a solucionar não somente os conflitos intersubjetivos de interesses, segundo o modelo liberal individualista, como também a atuar como órgão calibrador de tensões sociais, solucionado conflitos de conteúdo social, político e jurídico, e também implementando o conteúdo promocional do Direito, como o contido nas normas constitucionais e nas leis que consagram os direitos sociais e protegem o meio ambiente, o consumidor e outros interesses difusos e coletivos." (WATANABE, 2019, p. 47)

Em 2010 o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 125/20 do Conselho Nacional de Justiça1 que tratou da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, a qual, segundo Kazuo Watanabe, buscou garantir o acesso à ordem jurídica justa2 e ainda "procura enfrentar a crise de morosidade da justiça, atacando suas causas, e não seus efeitos" (p. 101).

Com a edição da Resolução acima mencionada, os tribunais aumentaram as iniciativas no sentido, especialmente por meio da criação dos CEJUSC'S (Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania), os quais se expandiram e hoje abarcam áreas como direito de família e a execução fiscal.

Dentro desse contexto, as normas constitucionais abertas ampliam as possibilidades de atuação do Poder Judiciário, porém esse espaço, constitucionalmente garantido ao Poder Executivo encontra limites na própria Constituição Federal: quais sejam, os objetivos e conteúdos sociais presentes nela.

Assim, a conciliação pode ser entendida como uma garantia constitucional de solução consensual de conflitos, o que legitima sua aplicação em todos os ramos do direito, exemplo disso é a possibilidade de celebração de transação penal e do acordo de não persecução penal, ambos no âmbito do direito penal.

Dessa forma, vê-se que não há impedimento, pelo contrário, há incentivos legais para que a Administração Pública transacione.

Nesse sentido, já existem várias iniciativas na Administração Pública Federal, a exemplo do termo de ajustamento de conduta no âmbito das infrações cometidas por servidores públicos federais e as câmaras de conciliação no âmbito das contratações públicas federais.

A conciliação pode evitar, em diversos casos, o prolongamento de processos em que a chance de êxito do ente pública é pequena, a exemplo do que ocorre no âmbito das ações de saúde, e outras situações nas quais o resultado adquirido é menor do que custo dispendido.

Pelo exposto, é possível então verificar que a recusa da realização de acordos que sejam benéficos para a administração fere o princípio constitucional da eficiência, o qual exige que a Administração Pública alcance os melhores resultados da forma mais rápida e a um menor custo.

Assim, diminuir o tempo de tramitação dos processos, sem que haja prejuízos à Administração Pública, por meios da utilização de soluções alternativas de conflitos, é uma forma de observância do princípio da eficiência, insculpido no art. 37 da Constituição Federal.

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1 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2014/04/resolucao_125_29112010_23042014190818.pdf

2 "O direito de obter atendimento e orientação, não somente em situações de conflitos de interesses, como também em seus problemas jurídicos, em situações de dúvida e de desorientação. E, se é direito dos jurisdicionados ter a oferta desses serviços, o Estado tem, inquestionavelmente, a obrigação de organizá-lo de forma adequada (p.100).

Acácia Regina Soares de Sá

VIP Acácia Regina Soares de Sá

Juíza de Direito Substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Especialista em Função Social do Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Mestre em Políticas Públicas e Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Coordenadora do Grupo Temático de Direito Público do Centro de Inteligência Artificial do TJDFT. Integrante do Grupo de Pesquisa de Hermenêutica Administrativa do Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Integrante do Grupo de Pesquisa Centros de Inteligência, Precedentes e Demandas Repetitivas da Escola Nacional da Magistratura - ENFAM.

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