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Da desistência da ação de mandado de segurança a qualquer tempo, recente decisão do STJ

O que fez o STF foi apenas impedir a revisão e alteração de jurisprudência firmada na corte

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Atualizado às 14:06

É sabido que a desistência de qualquer ação no sistema processual brasileiro só é possível, livremente, até a contestação da demanda. Após o oferecimento dessa importante peça processual, tal ato depende da anuência do réu.

Porém, em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (1), amparado em julgamento proferido com repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal (2), autorizou a desistência da ação de mandado de segurança até o trânsito em julgado da demanda.

Ou seja, é possível essa manobra processual até mesmo após a interposição e julgamento de alguns recursos, como a apelação, por exemplo, ainda que tais decisões sejam desfavoráveis ao impetrante.

Ao permitir isso, o STJ retira parcela de importância do fenômeno processual da coisa julgada, como também da preclusão, além de deferir ao impetrante o poder de "desfazer" julgados a qualquer tempo.

Sabe-se que o mandado de segurança se diferencia em certa medida das ações judiciais comuns. Porém, autorizar essa postura do impetrante, tende a perpetuar certas relações sociais, pois que podem vir a ser discutidas novamente, além de a autoridade coatora e o ente público manifestarem interesse na defesa e manutenção dos seus atos.

Ora, o próprio Código de Processo Civil afirma que a desistência de qualquer ação judicial, oferecida a peça de defesa, dependerá de anuência do réu (3). Além do mais, na legislação que rege o mandado de segurança, não há qualquer dispositivo que enseje conclusão diversa.

Digo mais, tal decisão concede o poder ao jurisdicionado de desfazer, inutilizar eventual pronunciamento de mérito, ainda que desfavorável, podendo, noutro tempo, rediscutir o mesmo ato coator, posto que a decisão homologatória da renúncia não adentra ao mérito da causa, por conseguinte não fazendo coisa julgada material.

A meu ver, em que pese o mandado de segurança se diferenciar das ações ordinárias, não pode desconsiderar toda a marcha processual e a autoridade das decisões anteriormente proferidas, ao bel prazer do impetrante, seja favorável ou não, a ele, o conjunto decisório.

A regra geral de anuência do réu para a desistência de qualquer demanda, tem um sentido muito claro, qual seja o interesse do demandado em ver aquela controvérsia definitivamente decidida pelo Poder Judiciário, inapta a futuras discussões.

Em que pese as peculiaridades do rito do mandado especial, não há razões processuais para diferenciar as regras procedimentais gerais. Poderiam sustentar que no mandado de segurança não há a figura do réu. Entretanto, há a presença da autoridade coatora, imitida na função de defender o ato supostamente ilegal, portanto, havendo certa litigiosidade.

O que fez o STF, naquela oportunidade vencido o Ministro relator, foi apenas impedir a revisão e alteração de jurisprudência firmada na corte, ao passo que o razoável se desvela na aplicação do CPC, onde não há motivos para interpretações colidentes noutro sentido.

Portanto, em que pese as sempre respeitáveis razões que embasam as decisões das Cortes de Vértice no Brasil, não há plausibilidade em permitir a desistência da ação de mandado de segurança pelo impetrante a qualquer tempo, seja a decisão favorável ou não a ele, por ofender diversos princípios processuais, dentre eles a preclusão, além de subverter a lógica processual, ao atentar contra a estabilidade e legitimidade das decisões judiciais.

Luís Eduardo de Resende Moraes Oliveira

VIP Luís Eduardo de Resende Moraes Oliveira

Advogado e especialista em direito processual civil. Membro da Associação Brasiliense de Direito Processual Civil.

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