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Violência doméstica e a possibilidade de afastamento do trabalho

Yara Leal Girasole title=Yara Leal Girasole e Aline Ramia

A mulher que sofre violência doméstica e entra com processo criminal contra o agressor, pode pedir como uma das medidas de proteção de sua integridade física e moral.

terça-feira, 25 de abril de 2023

Atualizado em 26 de abril de 2023 13:15

A Lei Maria da Penha foi sancionada com a finalidade de criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, trazendo disposições sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, bem como alterações legislativas (Código de Processo Penal, Código Penal e Lei de Execução Penal).

A Lei Maria da Penha visa garantir assistência e proteção à mulher em situação de violência doméstica e familiar e, em alguns casos, autoriza o afastamento da mulher do trabalho, sem a perda do emprego.

Essa medida de proteção consta no art. 09°, §2°, inciso II da Lei Maria da Penha (lei 11.340/06, o qual dispõe que o afastamento do trabalho poderá ocorrer pelo período de até 6 (seis) meses e o vínculo de emprego deve ser mantido, sem que a empregada sofra qualquer punição do empregador pela sua ausência:

Art. 9º: A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso. [...]

§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: [...]

II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. - grifos nossos

Na prática, o Superior Tribunal de Justiça entende que se aplica o mesmo procedimento do afastamento previdenciário comum por motivo de doença, ou seja, os primeiros 15 (quinze) dias devem ser pagos pelo empregador e os dias e/ou meses subsequentes, serão pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Isso porque, diante da falta de previsão legal, a jurisprudência conclui que incide o auxílio-doença no período de afastamento do trabalho, quando referido afastamento decorre de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher.

Ainda, necessário pontuar que o Juiz competente para determinar o afastamento do trabalho é o Juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade, o juízo criminal.

Trata-se de uma apreciação de pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, em razão de afastamento do trabalho da vítima da violência doméstica e familiar. Ou seja, o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher.

E para visualizar bem o cenário apresentado, copiamos abaixo fragmento de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. [...] AUXÍLIO-DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. [...]
1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista [...].

2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar [...].

3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha.

4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica.
(REsp 1757775/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 02/09/2019)

Portanto, a mulher que sofre violência doméstica e entra com processo criminal contra o agressor, pode pedir como uma das medidas de proteção de sua integridade física e moral, o seu afastamento do trabalho, sendo que se deferido, também lhe é garantido meio de subsistência enquanto pendurar o afastamento (limitado a 6 meses), pois equipara-se a afastamento previdenciário por motivo de doença comum.

Yara Leal Girasole

VIP Yara Leal Girasole

Sócia responsável pela área de Direito do Trabalho no escritório HSVL Advogados. Formada pela Mackenzie, com Pós-graduação na PUC/SP.

Aline Ramia

Aline Ramia

Advogada no escritório HSVL Advogados.

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