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Renovação contratual como alternativa para o reequilíbrio das concessões de transporte público

O artigo destaca a renovação contratual como um caminho juridicamente possível para o reequilíbrio econômico-financeiro de concessões no setor de transporte coletivo de passageiros

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Atualizado às 13:19

Na concessão de serviços públicos regida pela lei Federal 8.987/95, diversos instrumentos podem ser utilizados para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro. Tais instrumentos podem ou não estar circunscritos ao âmbito interno do próprio contrato de concessão. Por tal motivo, podem ser classificados basicamente em dois grupos de mecanismos de reequilíbrio: internos e externos.

Na primeira categoria podem ser mencionadas a revisão da tarifa; a alteração dos encargos da concessionária; a alteração do valor a ser pago a título de ônus da outorga; a alteração do cronograma de investimentos; a exploração de receitas alternativas, acessórias e de projetos associados; ou ainda a prorrogação do prazo da concessão. Por sua vez, como mecanismos externos à relação contratual, são exemplos mais comuns os subsídios e o pagamento de indenização à concessionária.

Em geral, os instrumentos utilizados de modo recorrente para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro estão dispostos na legislação aplicável ao regime das concessões e na legislação setorial específica. A revisão tarifária, p. ex., consta do art. 9º, §2º da lei Federal 8.987/95, como instrumento da política tarifária: "Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro". Do que se extrai da lei geral, a revisão tarifária é o procedimento em si para manter o equilíbrio econômico-financeiro da concessão.

De um modo mais específico, o art. 9º, §12, da lei Federal 12.587/12 determina a regra para realização das revisões tarifárias no setor do transporte público coletivo, observados os seguintes requisitos: "O poder público poderá, em caráter excepcional e desde que observado o interesse público, proceder à revisão extraordinária das tarifas, por ato de ofício ou mediante provocação da empresa, caso em que esta deverá demonstrar sua cabal necessidade, instruindo o requerimento com todos os elementos indispensáveis e suficientes para subsidiar a decisão, dando publicidade ao ato".

Há quem defenda a prioridade da revisão tarifária em detrimento das demais formas de reequilíbrio, estas últimas cabíveis apenas quando aquela se tornar insustentável ou não cumprir com a função de gerar recursos suficientes para cobrir a remuneração adequada pelo serviço. Não obstante, a revisão tarifária apresenta um inconveniente: a necessidade de observar o preceito da modicidade tarifária, previsto no artigo 6º da lei de Concessões. A modicidade deve ser respeitada não apenas durante a execução do contrato, mas em situações de recomposição contratual, prorrogação e outras que possam surgir ao longo da prestação do serviço.

Na tentativa de contornar esse entrave, a lei 12.587/12 trouxe a possibilidade de subsídio direto para o transporte público. O legislador demonstrou preocupação em fornecer diretrizes concretas no sentido de indicar que a tarifa deve ser tal que permita a todos o acesso aos serviços, incluindo a contribuição de toda a sociedade no custeio do serviço público, de forma que a tarifa empregada atenda ao preceito de modicidade (art. 8º, I, II e VI)1. Assim foi prevista uma clara diferenciação entre a tarifa paga pelos usuários e a tarifa de remuneração paga pelo Poder Concedente à concessionária, de maneira que a revisão da tarifa pode eventualmente não implicar na majoração do valor pago pelo usuário final.2

Ainda assim, há situações que não permitem a revisão tarifária ante as limitações financeiras dos usuários ou do próprio poder público, incapazes de custear ou subsidiar a integralidade dos custos do serviço. Em situações como tais, resulta para o contratado o direito de ser indenizado na proporção dos investimentos não amortizados e na exata medida dos prejuízos suportados em razão de eventos causadores de desequilíbrio . A dificuldade aqui é viabilizar os recursos necessários para fazer frente ao pagamento integral da indenização como solução definitiva de recomposição, em vista das habituais limitações de ordem orçamentária.

Em razão das dificuldades de se estabelecer uma solução única para o problema do desequilíbrio em contratos de investimentos, a legislação e a construção jurisprudencial se alinharam desde a edição da lei Geral de Concessões no sentido de autorizar outras formas adequadas de recomposição, com destaque para a possibilidade de extensão do prazo da concessão como forma de reequilibrar tais contratos, em benefício da modicidade tarifária e continuidade da prestação dos serviços.

A prorrogação contratual (em sentido lato) deve provar-se necessária e vantajosa em relação à alternativa de nova licitação. Deve-se considerar as previsões contratuais, legais, os princípios constitucionais a que deve obediência, bem como o prestígio ao interesse público atendido pela prestação do serviço, além de, sobretudo, respaldar-se em estudos técnicos e econômico-financeiros capazes de apontar para uma solução mais adequada.

Não se pode dizer, contudo, que uma forma é mais ou menos adequada ou eficaz que as demais. Cabe ao administrador, no exercício de seu poder discricionário, avaliar a melhor em função do caso concreto, sob o ponto de vista da análise de custo-benefício, vantajosidade e eficiência. Em muitos casos, alinhando-se o estudo das alternativas jurídicas com os cenários econômico-financeiros para reequilíbrio, faz-se necessário avançar para uma conjugação de diferentes modos de reequilíbrio, em uma composição ótima que seja capaz de atender ao direito do concessionário e ao mesmo tempo preservar o direito e os interesses dos usuários e o interesse público em geral.

Diante de eventual limitação orçamentária (política de subsídios e/ou pagamento de indenização ao concessionário), assim como de limitações que impeçam soluções inerentes ao contrato como a revisão tarifária, a redução de encargos ou a exploração de outras fontes de receitas; a solução definitiva do reequilíbrio pode ser viabilidade por meio de uma conjugação das alternativas a partir de uma análise mais abrangente das hipóteses admissíveis de prorrogação de prazo da concessão, em uma das formas admitidas e reguladas pela legislação vigente.

Há basicamente quatro formas de prorrogação do contrato de concessão, cujo emprego deve ser devidamente fundamentado caso a caso, são elas: (a) prorrogação emergencial, que garante a continuidade da prestação dos serviços em regime precário; (b) prorrogação ordinária, que ocorre ao término do prazo original nos termos do contrato; (c) prorrogação contratual ou extensão de prazo para fins de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro; e (d) prorrogação antecipada ou renovação contratual, prevista para setores específicos em contratos da União e de alguns Estados e Municípios, de acordo com legislação específica.

As hipóteses de prorrogação antecipada ou renovação correspondem, em geral, às prorrogações que se procederão na hipótese de inclusão de investimentos não previstos no instrumento contratual vigente, oportunidade em que também poderá ser incluída a mitigação ou resolução do desequilíbrio econômico-financeiro decorrente de outros eventos, bem como a implementação de ajustes no contrato para adequá-lo às melhores práticas regulatórias. A diferença entre elas é que a primeira produzirá efeitos antes do término do prazo da avença e a segunda ao término do seu prazo.

De modo geral, na legislação existente nota-se uma ou outra variação nesses conceitos, sem alteração relevante das possibilidades.Inclusive não se descarta a possibilidade de inovação em âmbito municipal no que toca às hipóteses de prorrogação da concessão, na linha do racional desenvolvido pelo Município de São Paulo (lei 17.731/22), não exatamente coincidente com a lei Federal 13.448/17 e com a lei do Estado de São Paulo (lei 16.933/19). A providência garantiria a incorporação de margem de segurança jurídica adicional à decisão de prorrogação dos contratos de concessão de transporte público de interesse local, além de regulamentar as hipóteses de modificações que possuam base econômica, como incorporação de investimento ou tecnologia e a alteração das bases contratuais.

Em qualquer caso, a alternativa de nova extensão de prazo deve ser considerada com bastante cautela. Ela deve representar efetivamente a sua imprescindibilidade para fazer frente à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em curso, com demonstração objetiva e circunstanciada da inviabilidade de aplicação das demais alternativas de recomposição, assim como deve representar uma medida benéfica aos interesses e direitos dos usuários dos serviços concedidos.

Idealmente, para seguir a preferência pela licitação, a prorrogação se daria apenas pelo tempo necessário para que o poder público consiga realizar uma nova licitação do sistema de transporte. Trata-se de prorrogação na modalidade emergencial, dado que não se cogitaria o encerramento do contrato e da prestação dos serviços antes de um novo operador escolhido em processo licitatório ter condições de assumir de imediato a prestação dos serviços, sob pena de descontinuidade.

Entretanto, a prorrogação emergencial pode não ser suficiente considerando a necessidade de sanar a conta de desequilíbrio, e ainda que autorizada pelo tempo mínimo necessário à preparação e realização da nova licitação, uma medida de prorrogação deveria vir acompanhada de revisão das bases do contrato ao menos para que não se agrave o desequilíbrio nesse período. Haveria necessidade, p. ex., de majorar a tarifa e os subsídios e ainda assim haveria necessidade de assegurar o pagamento de indenização ao final do prazo da prorrogação, em quantia ainda substancialmente elevada, entre outras eventuais medidas de recomposição.

Ainda que se cogitasse a possibilidade de conjugação dessa alternativa com o pagamento de indenização ao final do período de prorrogação emergencial, como condição de transferência dos sistema ao novo operador, a alternativa dependeria de fontes orçamentárias suficientes para fazer frente ao volume indenizatório apurado, ou da inclusão do valor da indenização em forma de outorga mínima a ser paga pelo vencedor da nova licitação como condição para assunção dos serviços, o que, em razão novamente do montante, pode tornar-se uma hipótese de viabilidade bastante remota.

Enquanto isso, poderiam ser estudadas as demais alternativas de prorrogação do prazo da concessão, nas modalidades prorrogação contratual ou extensão de prazo para fins de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, prorrogação antecipada ou renovação contratual.

A primeira contempla exatamente a possibilidade de extensão do prazo contratual como mecanismo de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, uma vez apurado o desequilíbrio ocorrido, seja por meio de processo administrativo, ação judicial ou procedimento de mediação ou arbitral, e verificado que a prorrogação é a medida mais adequada para o caso considerando a realidade orçamentária da maioria dos entes municipais. Nesse caso, o prazo de prorrogação será aquele apurado, a partir de análise técnica, como necessário para sanar o desequilíbrio econômico-financeiro, até o limite autorizado por lei.

No entanto, a mera extensão do prazo da concessão pode não ser suficiente e poderia ter o efeito de perpetuar a situação de desequilíbrio econômico-financeiro de uma operação deficitária, agravando o problema para o poder concedente e a concessionária. Por isso, o prolongamento do prazo de operação deve vir acompanhado, em alguns casos, de uma revisão das bases originárias da contratação, de modo a trazer novamente o contrato para uma situação de equilíbrio daqui em diante, e ainda com a necessidade de sanar o desequilíbrio verificado até aquele momento.

E ainda mais, diante da evolução das técnicas e das tecnologias, na maioria das vezes não seria razoável e nem justificável a medida de prolongar o prazo de concessão desacompanhada de uma revisão mais ampla das bases de prestação dos serviços, incluindo a sua modernização, adaptação às novas práticas de mercado, aos novos parâmetros de regularidade e qualidade, bem como a implementação de ajustes no contrato para adequá-lo às melhores práticas regulatórias. A opção pela prorrogação sem a modernização do sistema concedido provavelmente não se sustentaria frente à alternativa de nova licitação, diante de todas as possibilidades de incremento de investimentos e melhorias nos serviços que esta última pode representar.

Vislumbra-se, com isso, a possibilidade de conjugação da hipótese de prorrogação para fins de reequilíbrio com a revisão contratual mais ampla, mais precisamente com a hipótese de prorrogação antecipada ou renovação contratual para inclusão de novos investimentos, medida que pode ser autorizada pela legislação municipal desde que atendidos os requisitos nela especificados. As hipóteses de prorrogação antecipada ou renovação contratual correspondem àquelas em que são incluídos investimentos não previstos no instrumento contratual vigente, oportunidade em que também poderá ser incluída a possibilidade de mitigação ou resolução do desequilíbrio econômico-financeiro decorrente de outros eventos, bem como a implementação de ajustes no contrato para adequá-lo às melhores práticas regulatórias.

Em outras palavras, em que pese a motivação principal das hipóteses de prorrogação antecipada ou renovação contratual seja exatamente a inclusão de novos investimentos, os quais poderão decorrer de novas tecnologias, outras melhorias voltadas a garantir a prestação do serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários e necessidade de expansão dos serviços, considera-se juridicamente admissível que a medida venha acompanhada da mitigação ou resolução do desequilíbrio econômico-financeiro decorrente de outros eventos. 

Em lógica inversa, dado que há necessidade de prorrogar o contrato para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da concessão, deve-se avaliar se não se seria mais vantajoso para o Município, em atendimento aos objetivos de interesse público e aos direitos dos usuários do sistema de transporte, que a prorrogação da concessão seja fundamentada também na inclusão de novos investimentos e melhorias, a exemplo da renovação total da frota de veículos, por exemplo, entre outras medidas de atendimento ao interesse público.

Não sem razão, há uma série de requisitos previstos nas legislações para que a prorrogação ou renovação possam ser justificadas e autorizadas, sobretudo no que diz respeito à comprovação da vantajosidade da medida em relação à alternativa de realização de novo processo licitatório, mediante estudo técnico e jurídico que a fundamente4. A alternativa não afasta, portanto, a devida justificativa no bojo de processo administrativo, do reconhecimento da capacidade da concessionária de dar cabo à execução contratual e da anuência das autoridades competentes, observadas as particularidades de cada caso, atentando-se ao prazo máximo do somatório das prorrogações, sucessivas ou não, a ser estabelecido na legislação municipal, de modo a evitar a situação de uma concessão que se perpetue indefinidamente.

Como o tema relacionado à prorrogação está tratado na legislação como permissivo geral, importa na verdade investigar em qual dimensão os contratos por ela regulados podem ser alterados para inclusão de novos investimentos e modernização dos serviços, além de resolver em definitivo o problema do desequilíbrio. Ressalta-se que a preocupação deve se voltar à consequência prática dessa mutação contratual que consiste na extensão do prazo por período necessário à solução do desequilíbrio e amortização dos novos investimentos.

Em suma, o fato da prorrogação ser motivada para fins de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro não afasta a possibilidade de, cumulativamente, proceder-se à revisão das condições de execução do contrato de concessão e das condições de remuneração, justamente para fazer frente à necessidade de recomposição e, ainda, para viabilizar a inclusão de novos investimentos e proceder-se à modernização do contrato para o novo período - desde que a prorrogação e revisão nesse caso sejam feitas de modo consensual entre poder concedente e concessionária.

Para tanto, será preciso justificar a necessidade e vantajosidade da prorrogação em novas bases em detrimento de uma alternativa de prolongamento de um contrato em bases "antigas" ou desatualizadas, ou mesmo de uma alternativa mais "drástica" de encerramento do contrato que resultaria no pagamento imediato de indenização ao concessionário pelo desequilíbrio comprovado.

Lembre-se que a mera prorrogação do contrato nas mesmas bases, na maioria das vezes, não resolveria a conta de desequilíbrio e agravaria ainda mais o problema. Por isso a prorrogação para fins de reequilíbrio pode se dar em novas bases de modo a permitir que a condição de equilíbrio econômico-financeiro seja restabelecida e, ainda mais, que o concessionário seja ressarcido/indenizado pelo desequilíbrio suportado até então.

Isso implica em uma revisão mais ampla do contrato do que meramente a prorrogação de prazo - como aliás é natural e corriqueiro nesse tipo de prorrogação -, e pode vir acompanhada da revisão tarifária, aumento de subsídio, redução de encargos da concessionária, inclusão de novos investimentos, autorização para exploração de receitas alternativas e até mesmo a previsão do pagamento de indenização imediata ou diferida para assegurar o justo reequilíbrio da equação contratual inicialmente pactuada com a atual concessionária, entre outras medidas eventualmente pertinentes.

Tudo isso, no entanto, deve ser precedido de suficiente e detalhado estudo técnico e econômico-financeiro que analise, em bases metodológicas aceitáveis e justificadas, as vantagens da medida extraordinária de prorrogação para fins de reequilíbrio econômico-financeiro, com ou sem inclusão de novos investimentos, pelo período necessário a essa recomposição, assim como quais seriam as novas bases desse novo período de concessão em termos de tarifas, subsídios, encargos, investimentos etc., sem prejuízo da necessidade de avalição jurídica e técnica da vantajosidade em manter a contratação, considerada a alternativa de nova licitação5.

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1 Art. 8º A política tarifária do serviço de transporte público coletivo é orientada pelas seguintes diretrizes: I - promoção da equidade no acesso aos serviços; IV - contribuição dos beneficiários diretos e indiretos para custeio da operação dos serviços; (...) VI - modicidade da tarifa para o usuário.

2 Lei Federal nº 12.578/2012. Art. 9º O regime econômico e financeiro da concessão e o da permissão do serviço de transporte público coletivo serão estabelecidos no respectivo edital de licitação, sendo a tarifa de remuneração da prestação de serviço de transporte público coletivo resultante do processo licitatório da outorga do poder público. (...) § 5º Caso o poder público opte pela adoção de subsídio tarifário, o deficit originado deverá ser coberto por receitas extratarifárias, receitas alternativas, subsídios orçamentários, subsídios cruzados intrassetoriais e intersetoriais provenientes de outras categorias de beneficiários dos serviços de transporte, dentre outras fontes, instituídos pelo poder público delegante.

3 O art. 23, IX, da Lei Federal nº 8.987/95, elevou a definição de formato e cálculo da indenização à clausula essencial dos contratos, sendo pacífico o entendimento de que, no limite das possibilidades, o concessionário deve ser indenizado pelo Poder Concedente: "Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: (...) XI - aos critérios para o cálculo e a forma de pagamento das indenizações devidas à concessionária, quando for o caso". 

4 E nesse sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já se manifestou. O Plenário do STF indeferiu medida cautelar na ADI nº 5.991, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República contra dispositivos da Lei 13.448/2017 (relicitações) que flexibilizam os critérios para a prorrogação antecipada de contratos de concessão de ferrovias sem a necessidade de licitação. Em voto pelo indeferimento da cautelar, a relatora da ação, ministra Cármen Lúcia, observou que cabe ao órgão ou à entidade competente realizar estudo técnico prévio visando fundamentar, objetivamente, a vantagem da prorrogação do contrato, além de acolher, em cada caso, com motivação e transparência, a possibilidade do elastecimento do prazo contratual sem necessidade de nova licitação. Esta última é demonstrada efetivamente pelo estudo técnico, econômico-financeiro e jurídico voltado a avaliar as consequências de ação de uma ou outra medida (nova licitação x prorrogação). Cf. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI Nº 5.991, RELATORA, MINISTRA CÁRMEN LÚCIA. DATA DO JULGAMENTO VIRTUAL 07/10/2022. O entendimento que de certa forma já se pode dizer pacífico também foi citado pela jurisprudência do TCU, no Acórdão nº 1446/2018 de relatoria do Ministro Bruno Dantas, e deixou consignado que: "Por sua vez, a prorrogação antecipada, para os setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário da administração pública federal, é instrumento previsto nos arts. 4º e 6º da Lei 13.448/2017, e ocorrerá por meio da inclusão de investimentos não previstos em instrumento contratual vigente de concessão rodoviária ou ferroviária (...)". Cf. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Acórdão 1446/2018-Plenário DATA DA SESSÃO 26/06/2018. RELATOR BRUNO DANTAS.

5 Não se pode deixar de considerar que a alteração de encargos ou do cronograma de investimentos - redução ou inclusão - como método para viabilizar o reequilíbrio contratual, merece destaque sob a ótica dos princípios da vinculação ao instrumento convocatório e da legalidade, sendo certo que alterações contratuais devem ser entendidas como possíveis desde que não impliquem desnaturação do objeto do contrato original e não seja prejudicada a boa prestação dos serviços. O TCU tem entendimento cauteloso em relação à incorporação de novos serviços. De acordo com o entendimento sustentado pela Corte de Contas, a inclusão de obras no contrato de concessão ocorre num ambiente fechado, não concorrencial, o que diverge de exigências legais, como a manutenção das condições efetivas da proposta, competitividade, julgamento objetivo e transparência na concorrência, conforme exposto no Acórdão nº 1.174/2018 do Plenário do TCU. Entretanto, com o advento da Lei Federal nº 13.448/2017, que se aplica aos contratos de parceria celebrados no âmbito do governo federal, passou-se a ter disposição expressa, no art. 22, de que em tais ajustes não se aplicam os limites definidos na Lei nº 8.666/93. Isso fez com que o Tribunal de Contas da União passasse a admitir maior grau de mutabilidade aos contratos de concessão, inclusive em relação à incorporação de novos investimentos e prorrogação contratual. Veja-se nesse sentido que o conforme definido no Acórdão 1.446/2018 aquele Tribunal consignou que a superação da necessidade de licitar deve ser demostrada em avalição jurídica e técnica da vantajosidade da Administração Pública em manter a contratação, considerada a inviabilidade de nova licitação. 

Rafael Garofano

VIP Rafael Garofano

Advogado. Professor de Direito. Sócio fundador do escritório Garofano Sociedade de Advogados. Doutor e Mestre em Direito pela USP. Co-fundador do "Ensina Brasil" e Diretor do "Instituto Mirã".

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