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Novas (e velhas) regras para os convênios com a administração pública federal

O ideal é que o Congresso Nacional aprove legislação específica sobre convênios e contratos de repasse relativos às transferências de recursos, e sobre parcerias sem transferências de recursos.

terça-feira, 4 de julho de 2023

Atualizado às 13:47

Segundo dados do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos disponibilizados no painel Transferegov.br, nos últimos quatro anos, a União promoveu mais de 22.000 transferências por intermédio de convênios, com o total de R$ 21 bilhões de valor empenhado.

O convênio é um instrumento que dispõe sobre a transferência de recursos financeiros proveniente do Orçamento da União, para a execução de programas, projetos e atividades de interesse recíproco e em regime de mútua colaboração entre órgãos e entidades federais e seus congêneres da Administração Pública estadual, distrital e municipal, consórcios públicos e entidades privadas sem fins lucrativos.

A Nova lei de Licitações e Contratos Administrativos - NLLCA (lei 14.133/21) se aplica, no que couber e na ausência de norma específica, aos convênios, acordos e instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração Pública. A lei 8.666/93 já fazia previsão similar, mas detalhava, no Art. 116, algumas disposições básicas sobre convênios, o que não ocorre na nova lei.

Entende-se, portanto, que a lei 14.133/21 projetou a real necessidade de atividade legiferante direcionada especificamente aos convênios, mas admitiu, em caso de omissão do Legislativo, a aplicação de seus preceitos, transferindo ao Poder Executivo o dever de regulamentar.

A tarefa regulamentadora foi exercida, recentemente, por intermédio do decreto 11.531, de 16 de maio de 2023. Foram estabelecidos dois vacatio legis: o primeiro até 31 de agosto de 2023, para a maioria dos dispositivos; e o segundo até 31 dezembro de 2023, para os convênios e contratos de repasse.

O decreto 11.531/23 revogou treze outros decretos, sendo dez integralmente e três parcialmente, concentrando assim diversas normas regulamentadoras, podendo ser considerado uma verdadeira consolidação quanto ao tema.

A nova regulamentação permite, por exemplo, que, não dispondo de capacidade técnica e operacional para a celebração e o acompanhamento dos convênios, a Administração Pública contrate prestadores de serviços auxiliares para apoiar decisões de gestão, contudo, alerta que tais serviços não se configuram com a execução por meio de mandato e que a responsabilidade final pelas atividades se mantém com os órgãos e as entidades concedentes.

No campo das vedações houve atualizações, inovações e manutenções. Assim, a União não pode ser concedente de convênios com valores de repasse inferiores a quatrocentos mil reais para execução de obras, e duzentos mil reais para os demais objetos. Também é vedado ao Ente federal conveniar com órgãos e entidades da Administração Pública estadual, distrital e municipal que possuam CNPJ na condição de filiais.

Também há impedimento para convênios cuja vigência se encerre no primeiro e no último trimestres do mandato do Chefe do Poder Executivo do ente federativo beneficiado pelo convênio, bem como foi reafirmado regramento especial para a presença de entidades privadas sem fins lucrativos como convenentes. Frisa-se que as vedações não são taxativas, pois admite-se outras hipóteses previstas na lei de diretrizes orçamentárias - LDO e em normas esparsas relativas à matéria.

Além disso, foi designado ao Transferegov.br (antiga Plataforma +Brasil) papel central enquanto ferramenta, integrada e centralizada, destinada à informatização e à operacionalização de convênios da União com convenentes em geral. É obrigatório que os órgãos e as entidades da Administração Pública federal cadastrem os programas que pretendem executar por intermeio de convênios.

É condição essencial para a celebração dos instrumentos que os proponentes estejam com seus cadastros atualizados na nova plataforma.

Também é neste link que que os pretensos convenentes manifestam interesse em celebrar os convênios, por meio do encaminhamento do plano de trabalho. Este documento continua sendo fundamental para a celebração do instrumento convenial, restando como obrigação do concedente avaliá-lo quanto à viabilidade e adequação aos objetivos do programa cadastrado.

Destarte, são condições essenciais expressas para a celebração dos convênios: o cadastro do proponente atualizado no Transferegov.br; a aprovação do plano de trabalho pelo concedente; a apresentação de documentos listados no regulamento; a comprovação pelo convenente de disponibilidade da contrapartida; o registro de empenho da despesa; e o parecer favorável do respectivo órgão jurídico do concedente.

Quanto ao empenho das despesas, restou estabelecido que já no ato de celebração do convênio o órgão ou entidade da Administração Pública deve empenhar o valor total previsto no cronograma de desembolso do exercício da celebração, obrigando-se, ainda, a providenciar o registro no SIAFI dos valores residuais programados, para cada exercício subsequente, a fim de garantir a execução do convênio.

Em relação à contrapartida, se financeira, deve ser depositada na conta bancária específica do convênio, seguindo os prazos estabelecidos no cronograma de desembolso. O regramento fez constar que, quando o instrumento convenial envolver entidades privadas sem fins lucrativos, é aceita contrapartida por intermédio de bens e serviços, desde que economicamente mensuráveis.

Para a execução de obras e serviços de engenharia os proponentes devem apresentar previamente à celebração dos convênios: anteprojeto ou projeto básico (dependendo do regime de contratação); comprovação do exercício pleno dos poderes inerentes à propriedade do imóvel; comprovação da instauração de procedimento de licenciamento ambiental (ou da dispensa do licenciamento); e o plano de sustentabilidade. Para os demais objetos, exige-se: termo de referência; comprovação da instauração de procedimento de licenciamento ambiental (ou da dispensa do licenciamento); e o plano de sustentabilidade do equipamento a ser adquirido.

É perceptível que as questões ambientais, bem como àquelas relativas à sustentabilidade, ocupam papel central quando se trata de convênios.

Manteve-se a possibilidade de subconvênio via parcerias com outros entes federativos, consórcios públicos, serviços sociais autônomos ou entidades filantrópicas e sem fins lucrativos, e ainda com organizações da sociedade civil, observados regramentos próprios, desde que já previsto no plano de trabalho apresentado pelo convenente e aprovado pelo concedente.

Convenentes, concedentes e prestadores de serviços, contratados para auxiliar na gestão do convênio, tem o dever de registrar no Transferegov.br todos os atos relativos à execução física, ao acompanhamento e à fiscalização dos convênios.

É necessário acompanhamento constante. Portarias do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, do Ministério da Fazenda e da Controladoria-Geral da União devem ser editadas, como normas complementares necessárias à execução do decreto 11.531/23. Até julho de 2023 os órgãos e as entidades concedentes publicarão e registrarão no Transferegov.br, atos de seus dirigentes máximos fixando os limites de tolerância ao risco, para fins da aplicação de procedimento informatizado na análise da prestação de contas das transferências.

Ainda, quanto aos convênios com entidades privadas sem fins lucrativos, sempre um tema polêmico, cabe à Controladoria-Geral da União manter, no Portal da Transparência do Poder Executivo federal, Cadastro de Entidades Privadas sem Fins Lucrativos Impedidas - CEPIM, que listará a entidades com tal natureza jurídica que estão impedidas de conveniar com a Administração Pública federal.

Por fim, reafirma-se que o ideal é que o Congresso Nacional aprove legislação específica sobre convênios e contratos de repasse relativos às transferências de recursos, e sobre parcerias sem transferências de recursos. Até lá o Ddcreto 11.531/23 é uma boa norma supletiva. Além disso, Estados e Municípios podem elaborar suas próprias leis e decretos, mas a experiência da lei 8.666/93 projeta que a maioria seguirá o regramento federal.

Giussepp Mendes

Giussepp Mendes

Advogado especialista em direito administrativo público.

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