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NLLC: Pregão obrigatório para serviços de engenharia

Retomando sua origem histórica, as obras de engenharia, em regra, deverão ser feitas, obrigatoriamente, na modalidade do pregão.

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Atualizado às 09:52

O pregão faz parte da alma licitatória. O saudoso Hely Lopes Meirelles1 em sua clássica obra "Direito Administrativo Brasileiro" já ensinava, em nota de rodapé, que a origem da própria Licitação era o pregão realizado na idade média:

"Nos Estados medievais da Europa usou-se o sistema denominado "vela e pregão" que consistia em apregoar-se a obra desejada e, enquanto ardia uma vela, os construtores interessados faziam suas ofertas. Quando se extinguia a chama, adjudicava-se a obra a quem houvesse oferecido o melhor preço"

Retomando sua origem histórica, as obras de engenharia, em regra, deverão ser feitas, obrigatoriamente, na modalidade do pregão.

Vários são os motivos jurídicos que fundamentam a opção do legislador.

A mera leitura da definição da modalidade licitatória na NLLC já indica a interpretação nesse sentido. Assim:

"Art. 6º (...)

XLI - pregão: modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto;" (grifos nossos).

A dúvida que poderia surgir seria quanto ao aspecto do que seriam "serviços comuns de engenharia".

A própria Lei 14.133/2.021 ajuda a esclarecer:

"Art. 29. A concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a que se refere o art. 17 desta Lei, adotando-se o pregão sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado.

Parágrafo único. O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços de engenharia de que trata a alínea "a" do inciso XXI do caput do art. 6º desta Lei." (grifos nossos).

 Desta forma, o primeiro critério para a distinção entre "serviços comuns de engenharia" e "serviços incomuns  de engenharia", é a presença do elemento intelectualidade na obra a ser licitada.

Aliás, se o elemento intelectualidade for mais acentuado sequer haverá licitação em razão da singularidade do objeto. Assim, a construção do memorial da América Latina pelo renomado arquiteto Oscar Niemayer, foi feito por inexigibilidade de licitação tal e qual seria sob a égide da nova lei.

Se o elemento intelectual estiver presente em menor grau do que o exemplo anterior estaremos, provavelmente, diante da licitação de obra pela modalidade licitatória concorrência.

A definição da modalidade licitatória concorrência conjugada a uma interpretação sistemática da lei 14.133/21 ajuda a elucidar o tema. Assim:

"Art. 6º (...)

XXXVIII - concorrência: modalidade de licitação para contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia, cujo critério de julgamento poderá ser:

a) menor preço;

b) melhor técnica ou conteúdo artístico;

c) técnica e preço;

d) maior retorno econômico;

e) maior desconto;"

A leitura meramente gramatical poderia levar o interprete a entender que seria uma "opção" do administrador público a escolha da concorrência ou do pregão para os serviços comuns de engenharia, já que o inciso XXXVIII menciona que a concorrência seria "bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns".

Porém, as alíneas do próprio inciso XXXVIII e o inciso XLI do artigo 6º não podem ser ignoradas nessa interpretação.

O inciso XLI menciona o pregão como "obrigatório" para serviços (inclusive de engenharia) comuns.

As alíneas do inciso XXXVIII mencionam o preço (menor preços, maior retorno, maior desconto) e acrescentam um elemento bem distintivo do pregão: a técnica, seja como "técnica e preço", seja como "melhor técnica".

Então, o primeiro critério para se aferir a necessidade da concorrência é a presença do elemento "técnica" como critério seletivo da licitação. Não havendo tal elemento a conclusão só poderá ser pela obrigatoriedade do pregão.

A jurisprudência do E. TCE/SP corrobora e inspira nossa tese, ora defendida. A licitação pela modalidade pregão é mais prática, rápida e barata, devendo ser preferida por motivos de economicidade, tema objeto da vigilância da Corte de Contas.

Sob a égide da Lei 13.303/2.016 a Corte Paulista já adotava a preferência do pregão. A "lei das estatais" previa o pregão como modalidade meramente "preferencial". Assim:

"Art. 32. Nas licitações e contratos de que trata esta Lei serão observadas as seguintes diretrizes:     

(...)

IV - adoção preferencial da modalidade de licitação denominada pregão, instituída pela Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002 , para a aquisição de bens e serviços comuns, assim considerados aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado;"

Assim, havia "preferência", mas a Lei 14.133/2.021 evolui para a "obrigatoriedade" sendo de rigor sua aplicação na imensa maioria das licitações obras e serviços já que, por definição, o corriqueiro enquadra-se na categoria de "comum".

É paradigmática e visionária a decisão da E. Corte de Contas na pena do Eminente Conselheiro Edgard Camargo Rodrigues, tendo o município de Colômbia como jurisdicionado:

"Normas de âmbito federal (Decreto nº 5.450, de 31 de maio de 2005, revogado pelo Decreto nº 10.024, de 20 de setembro de 2019) e estadual (Decreto nº 49.722, de 24 de junho de 2005) elidiram vedação até então imposta, liberando emprego da modalidade licitatória pregão para serviços de engenharia, condicionada à convergência de outros atributos intrínsecos ao objeto, notadamente sê-lo comum e padronizado, sem implicar, necessariamente, ausência de complexidade técnica, de modo a permitir descrição objetiva no edital, conforme artigo 1º e parágrafo único da Lei Federal nº 10.520/02"(TC 007777.989.21, grifos nossos).

Merece destaque o fato de que a decisão NÃO afasta a aplicação do pregão pela mera complexidade do objeto desde que seja objeto padronizado no mercado e descrição objetiva no edital. A complexidade, por si só, não afasta a regra da obrigatoriedade do pregão.

Com a nova lei de licitações, o pregão para serviços de engenharia é a regra obrigatória para a imensa maioria das obras. A utilização da modalidade concorrência deverá ser expressamente justificada pelo setor de obras diante da complexidade da obra somada à impossibilidade de descrição objetiva pela inexistência de padronização no mercado.

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1 -  "Direito Administrativo Brasileiro", 40ª edição, Editora Malheiros, pág. 298, nota de rodapé nº 98

Laércio José Loureiro dos Santos

VIP Laércio José Loureiro dos Santos

Mestre em Direito pela PUCSP, Procurador Municipal e autor do Livro, "Inovações da Nova Lei de Licitações", 2ª Ed. Dialética, 2.023.

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