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O TST é a bússola da segurança jurídica trabalhista no país

Tribunais Regionais devem seguir a jurisprudência uniformizada pelo Tribunal Superior do Trabalho garantindo mais qualidade da prestação jurisdicional.

terça-feira, 17 de outubro de 2023

Atualizado em 18 de outubro de 2023 10:06

A Corte trabalhista exerce papel fundamental em nosso país quanto a missão de uniformizar a interpretação e garantir que estas sejam observadas pelos Tribunais Regionais de forma uníssona e igualitária.

Nesse sentido, quando o Tribunal Regional confere incorreta interpretação ao quadro fático em que incide determinado entendimento já pacificado, cumpre ao TST corrigir as arestas jurídicas do julgado em respeito à sua própria jurisprudência conferindo a correta interpretação jurídica ao quadro fático. É pertinente elucidar que o correto enquadramento jurídico dos fatos, conforme jurisprudência firme da SDI 1 e da Orientação Jurisprudencial nº 136 da SBDI-2, da C. do TST, não consiste em vedação pela sumula 126 do TST, quando a interpretação que desrespeita a jurisprudência do TST consta registrada no acórdão Regional. Logo, há que distinguir, de forma derradeira, entre o conceito de reexame probatório e a correção da interpretação jurídica dos fatos, no qual apesar de provocado e enfrentar a matéria jurídica de forma adequada, o acórdão Regional desrespeita, frontalmente, a firme jurisprudência do TST. Nesse sentido, vale destacar o acórdão do TST, in verbis, de relatoria do Ministro Breno Medeiros:

AGRAVO EM RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. DIFERENÇAS DE VANTAGENS PESSOAIS . BASE DE CÁLCULO . INTEGRAÇÃO DAS PARCELAS CARGO EM COMISSÃO E CTVA. ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE À SÚMULA 126 DO TST. Consolidou-se nesta Subseção o entendimento de que, em regra, não mais se conhece do recurso de embargos por contrariedade a súmula ou orientação jurisprudencial de natureza processual, exceto na excepcional hipótese em que a decisão embargada contenha afirmação ou manifestação contrária ao teor do verbete processual indicado como contrariado. O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário da parte reclamante quanto ao pedido de pagamento de diferenças salarias decorrentes da integração dos valores a título de Cargo em Comissão e CTVA na base de cálculo das vantagens pessoais. A c. Oitava Turma conheceu do recurso de revista da reclamante, por contrariedade à Sumula 51, I, do TST, e, no mérito, com fundamento em jurisprudência do TST, concluiu ser o caso de condenar a reclamada ao pagamento de diferenças salariais decorrentes da integração das parcelas "CTVA" e "cargo em comissão" na base de cálculo das vantagens pessoais e reflexos. Consignou que "a função comissionada foi substituída pelo cargo em comissão, deve ser mantida a sua integração na base de cálculo das vantagens pessoais, conforme assegurado na norma interna vigente antes da implantação do PCC/98" e que "a jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o CTVA ostenta natureza salarial e sua finalidade é complementar a remuneração de empregado ocupante de cargo de confiança, de modo que tal parcela também deve ser considerada na base de cálculo das vantagens pessoais". A Turma, no exame da controvérsia, procedeu ao reenquadramento jurídico dos fatos estritamente consignados no acórdão regional à conclusão jurídica distinta, à luz do entendimento sedimentado na orientação da Súmula 51, I, o TST, não tendo incursionado no conjunto fático-probatório dos autos com vistas a extrair as premissas determinantes para se conhecer do recurso de revista. Assim, tratando-se de questão eminentemente de direito, não há como se reconhecer a excepcional hipótese de cabimento dos embargos por contrariedade à Súmula 126 do TST, por não se tratar de reexame de fatos e provas, mas sim de subsunção dos fatos da causa ao preceito legal vigente, não se verificando a circunstância de a decisão embargada conter afirmação ou manifestação contrária ao teor do indicado verbete processual. Os arestos apresentados com a mesma finalidade, de demonstrar a contrariedade à Súmula 126 do TST, tratam de casos concretos e se distinguem do quadro fático e por isso não permitem o estabelecimento do pretendido conflito jurisprudencial, na esteira da súmula 296, I, do TST. O modelo E- ARR-10899-84.2015.5.03.0014, também proveniente da SBDI-1 do TST, se ressente de especificidade por tratar de matéria estranha aos autos, de caso em que não demonstrado prejuízo salarial ante a redução de gratificação de função concomitante à majoração do salário-base, a incidir também o óbice da Súmula 296, I, do TST. Decisão agravada mantida. Agravo conhecido e desprovido. (TST - Ag-E-ED-RR: 00012608720165050196, Relator: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 29/09/2022, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 07/10/22)

Nesse sentido, o STF, também, avaliza em jurisprudência consolidada:

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Deserção. Artigo 511 do Código de Processo Civil. Revaloração da prova pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça. Reenquadramento jurídico dos fatos. Possibilidade. Certidão cartorária. Negativa de fé pública. Não ocorrência. 1. A revaloração da prova e o reenquadramento jurídico dos fatos não se confundem com o revolvimento de suporte fático-probatório, sendo plenamente franqueados aos tribunais superiores. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 2. Não viola o art. 93, inciso XIV, da CF a decisão do Superior Tribunal de Justiça que, a par do conteúdo de certidão cartorária, reconhece a deserção de recurso com base em interpretação de dispositivo do Código de Processo Civil. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. ( RE 820433 AgR, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 17/3/16, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 27-05-2016 PUBLIC 30-5-16) (STF - AgR RE: 820433 PI - PIAUÍ, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 17/3/16, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-109 30-5-16)

Em recente caso, inclusive, estive diante de  caso análogo em que o acórdão Regional, do Tribunal Regional do Trabalho da 1 Região (TRT 01) decidiu não seguir a jurisprudência do TST não reconhecendo, devidamente, a suspeição de depoimento de diretor que, elencado como testemunha, expressamente, em depoimento, admitiu ter decidido a demissão do funcionário, reconhecendo, ainda, que essa demissão foi SEM JUSTA CAUSA e, no entanto, provocado a seguir a interpretação do TST que considera suspeita a testemunha, com poder de gestão,  insistiu em não seguir a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho. No acórdão embargado, RO 0100463-43.2016.5.01.003, id 2e0flc4, pagina 2, constou " Afirma que a jurisprudencia do TST é assente e pacífica no sentido de que o empregado detentor de cargo de confiança diretivo com poderes de admissão e demissão não pode prestar informações à justila de forma isenta de pretensões ao resultado do litígio, vez que este é longa manus do empregador.Sustenta, ainda, a contradição do julgado embargador quanto aos motivos ensejadores da ruptura contratual por justa causa" Ao enfrentar a questão, o acórdão regional de forma totalmente evasiva, pontuou " O embargante alega e não prova e suposta jurisprudencia dominante e nem poderia fazê-lo, posto que o entendimento prevalecente no C. TST é diverso da tese embargada." - pasme, grifo nosso.

Além disso, desconsiderou os requisitos legais de ato específico, nexo causal, ausência de perdão tácito, histórico laboral, de um funcionário que, inclusive, foi premiado no curso dos meses da demissão, além dos incontáveis prêmios ao longo de sua trajetória profisisonal reconhecido pela empresa como "funcionário modelo".

O caso desafiou a instância superior e, atualmente, segue a relatoria da eminente Ministra Cristina Irigoyen Peduzzi, na 4 Turma do TST, ED- Ag - AIRR 0100463-43.2016.5.01.0031, no qual se apreciam os Embargos declaratórios invocando, principalmente, o erro de fato, sobre  fato incontroverso e relevante, de que o próprio diretor, instado pela defesa do Reclamante, acabou reconhecendo, em audiência, a determinação da demissão SEM JUSTA CAUSA  do funcionário, e vícios materiais quanto a adequação jurisprudencial pelo reenquadramento jurídico dos fatos.

Vale lembrar, ainda, que no caso de "erro de fato", o entendimento do TST é de que é plenamente viável o reconhecimento do mesmo, haja vista a primazia do princípio da celeridade processual diante de um fato da decisão rescindenda que não se coaduna com a realidade dos autos:

AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, IX, DO CPC. ERRO DE FATO. CARACTERIZAÇÃO. DESERÇÃO DO RECURSO ORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA. A Eg. Oitava Turma desta Corte deu provimento ao recurso de revista da reclamada, para indeferir os benefícios da justiça gratuita ao Sindicato-autor e decretar a deserção do seu recurso ordinário. Entretanto, não observou a ausência de sucumbência do Sindicato e o pagamento das custas pela ré. Caracterizado, portanto, o erro de fato, apto a autorizar a desconstituição parcial do acórdão rescindendo. Ação rescisória julgada procedente.(TST - AR: 16028420125000000, Relator: Alberto Luiz Bresciani De Fontan Pereira, Data de Julgamento: 10/6/14, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 13/6/14)

Nesse caso, "salta os olhos", como a prestação jurisdicional acaba prejudicada diante de decisões dos TRTs Regionais que não analisam de forma minudente e juridicamente correta as questões postas à sua análise acabando por desafiar recursos, pautados no inconformismo, diante da  insegurança jurídica mantida. Afinal, porque em alguns casos alguns Tribunais Regionais seguem  a jurisprudência e em outros não? Como admitir uma injustiça diante de um caso em que há fato incontroverso da defesa admitindo, justamente, o contrário ao julgamento? Por isso os Tribunais Superiores estão esgotados de recursos. E quem sofre com esse contexto real e enfadonho são os Tribunais Superiores e, principalmente, o destinatário final da prestação jurisdicional que, não raro, passa anos a fio convivendo com aquela injustiça e deposita a sua esperança de alcance da justiça nas instâncias superiores.

Atualmente, com o advento das complexas relações trabalhistas que se tem desenvolvido e com as especificidades, cada vez mais minuciosas, que tem se detalhado esse segmento, cada vez mais os próprios TRTs possuem dúvidas e decidem com larga discordância entre si desencadeando uma patente insegurança jurídica. Em outras palavras significa dizer que, em TRTs de diferentes regiões ou no próprio TRT podem coexistir acórdãos, em casos análogos e semelhantes, com  interpretações distintas.

Por isso, cada vez mais comum o ingresso recursal ao TST em casos em que há divergência jurisprudencial ou violação à lei federal. Há que se ter em vista que o grande ponto é o necessário incentivo ao estudo e preparo dos regionais para analisarem e dirimirem os casos com a atenção e acuidade que demandam seguindo as diretrizes dos Tribunal Superior e essa é a forma efetiva de se evitar o abarrotamento de processos recursais no TST.  Ora, de nada adianta fixar  uma tese interpretativa, se o Regional A ou B não segue a orientação da jurisprudência e resolve fazer a sua interpretação pessoal. Não seguir a interpretação fixada pelo Tribunal Superior é ameaçar o judiciário e o próprio Estado Democrático de Direito. Isso porque, o poder judiciário é moldado  para que, fixada a tese interpretativa, esta seja seguida pelas instâncias inferiores.

Para nós, advogados, as teses fixadas são verdadeiras bússolas de orientação aos nossos clientes sobre o que se pode implementar ou não, o que esperar ou não sobre determinado assunto. E se não houver convergência ou segurança mínima acerca do cumprimento das  teses fixadas  pelos Tribunais Superiores, na verdade, não há segurança jurídica.

Quero, de fato, acreditar que a recente fala de Fernando Haddad, Ministro da Economia, sobre "O Brasil ter um problema de segurança jurídica" não ser um ponderado relativizado ou tratado como algo comum, corriqueiro ou admissível, mas como um desafio a ser enfrentado com seriedade. A nossa justiça é equiparada, cara, morosa e precisa ser, portanto, de alta qualidade. E o ideal de qualidade passa pelo respeito, intransigente, aos postulados insculpidos pelos Tribunais Superiores.

Coloco aqui uma profunda reflexão porque, em sua maioria, buscamos atingir o problema pelo problema e não sob a visão da reflexão para se encontrar a solução. Será que constatar o abarrotamento dos Tribunais Superiores com decisões monocráticas e aplicação automática de filtros recursais, é uma forma de solução ou de agravamento do problema? Será o resultado  de novas relações trabalhistas complexas a desafiarem o enfrentamento do tema  ou a prova de falta de qualidade nos TRTs do país? Garanto que,  se houver um estudo detalhado, se concluirá pelo fato de que não são novos assuntos. É preciso refletir e conter o problema na origem e, para isso, é preciso uma atuação conjunta e efetiva em combater a inobservância das teses fixadas pelo TST retomando a credibilidade e respeito ínsitos à nossa alta Corte do país.

Giselle Farinhas

Giselle Farinhas

Sócia titular do escritório Giselle Farinhas Advogados. Diretora de Valorização da Advocacia da OAB RJ subseção Barra da Tijuca

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