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Autoria dos crimes do 8 de janeiro: quem mandou?

Em momentos de instabilidade na república, julgamentos que objetivam apurar o grau de responsabilidade de importantes atores políticos pela prática de crimes que atentam contra a democracia precisam estar afastados das influências ideológicas que contaminam a visão técnica necessária para um diagnóstico justo e imparcial.

sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Atualizado às 12:21

Os nefastos acontecimentos do dia 8 de janeiro de 2023 reverberam até os dias de hoje, talvez até com mais fervor do que logo após os acontecimentos, ressoando na indicação de importantes atores políticos do cenário nacional como responsáveis pelos atos criminosos internacionalmente noticiados, que abalaram as estruturas da república.

Inúmeras teorias acerca das razões que motivaram a manobra de um número expressivo de pessoas marchando para a praça dos três poderes surgem todos os dias, algumas mais coerentes do que as outras, mas todas contaminadas de vieses político-ideológicos típicos de incidentes inflamados que marcam a história de toda democracia.

Contudo, é necessário que, ao menos por um momento, seja colocado de lado o afunilamento da crítica política - que desfoca a visão sobre o todo e ignora os elementos técnicos presentes - para que a punição perseguida pelos poderes da república seja a mais harmoniosa com os ditames constitucionais.

Neste contexto, o indiciamento, pela relatoria da CPMI - Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, de mais de 60 pessoas pelos atos praticados no 8 de janeiro, dentre elas o governante que ocupava o mais alto posto do Poder Executivo, têm despertado controvérsias.

É de se pontuar, outrossim, que as críticas atinentes à ótica eminente política que decorre de um relatório oriundo de uma CPMI são justificáveis diante do fato de que as casas que compõe a comissão instalada para a apuração dos fatos são dotadas de caráter político-representativo, formada por representantes do povo e dos estados da federação, razão pela qual é de se esperar que as análises efetuadas possuam perspectivas políticas.

Sob este viés, a atuação do Ministério Público como órgão acusador, que recepcionará o relatório final resultante das apurações realizadas pela CPMI, adquire uma relevância especial, exercendo uma espécie de filtro técnico que deve separar as perspectivas eminentemente ideológicas daquelas que possuem, de fato, um grau probatório apto a fundamentar uma acusação criminal contra os supostos autores.

Desta forma, dentre os apontamentos contidos no relatório das apurações desenvolvidas pela CPMI, a tese da autoria intelectual do chefe do Poder Executivo como suposto mandante dos fatos criminosos desperta a atenção e demanda cautela por parte dos agentes públicos responsáveis por promover a persecução criminal.

Isto posto, apesar de ser tolerado que as apurações e análises promovidas pelas casas legislativas da república estejam preenchidas de viés político-partidário, o mesmo não é admissível em relação à apreciação que deve ser feita pelo Ministério Público enquanto órgão técnico de acusação e, constitucionalmente, fiscal da lei e do Estado Democrático de Direito.

Assim sendo, é de se esperar que não seja promovida a responsabilização criminal pautada na autoria intelectual em face daquele que ocupava o topo de uma estrutura hierárquica apenas e tão somente em razão de sua posição de comando, ignorando os outros preceitos técnicos contidos na mencionada tese.

Ressalta-se, portanto, que em momentos de instabilidade na república, julgamentos que objetivam apurar o grau de responsabilidade de importantes atores políticos pela prática de crimes que atentam contra a democracia precisam estar afastados das influências ideológicas que contaminam a visão técnica necessária para um diagnóstico justo e imparcial.

Leonardo Tajaribe Jr.

VIP Leonardo Tajaribe Jr.

Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]

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