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A tutela provisória em sede de recurso: hipóteses e requisitos

Apresentando-se a tese recursal não só promissora perante o Relator, mas também de acolhimento com probabilidade bastante acentuada, não haverá de se falar em risco de dano para a concessão de efeito recursal suspensivo, tal como não é necessário perquirir para a concessão de Tutela Provisória de Evidência.

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Atualizado às 10:14

No tocante às hipóteses e aos requisitos da tutela provisória concernente à atribuição de efeito suspensivo aos recursos, a probabilidade de provimento do recurso está para a Tutela Provisória de Evidência, assim como a relevância da argumentação com risco de dano está para a Tutela Provisória de Urgência.

Diferentemente do que o cotidiano dos Tribunais faz crer, a atribuição de efeito recursal suspensivo não exige, em toda e qualquer situação, a simultânea constatação do binômio fumus boni iuris vs periculum in mora, senão vejamos o que dispõem os arts. 1.012, § 4º, e 1.026, § 4º, do atual CPC:

Art. 1.012, § 4º Nas hipóteses do § 1º, a eficácia da sentença poderá ser suspensa pelo relator se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação.

[...]

Art. 1.026, § 4º A eficácia da decisão monocrática ou colegiada poderá ser suspensa pelo respectivo juiz ou relator se demonstrada a probabilidade de provimento do recurso ou, sendo relevante a fundamentação, se houver risco de dano grave ou de difícil reparação.

Da atenta leitura dos textos normativos supratranscritos, percebe-se que o legislador se valeu de inequívoca conjunção alternativa para revelar as possibilidades de um recurso ser recebido com eficácia suspensiva: probabilidade de provimento do recurso OU relevância de argumentação com existência de risco de dano.

No que tange à atribuição de efeito recursal suspensivo, seja ativo ou negativo, importa distinguir as seguintes hipóteses: i) "probabilidade de provimento do recurso"; e ii) "sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação."

A lume do Livro V, intitulado "Da Tutela Provisória", do CPC, a probabilidade de provimento do recurso está para a Tutela Provisória de Evidência, prevista no art. 311, a qual será concedida "independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo", assim como a relevância da argumentação está para a Tutela Provisória de Urgência, prevista no art. 300, a qual "será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo."

Seguindo tal raciocínio, a probabilidade de provimento do recurso (inerente à Tutela Provisória de Evidência) corresponde "à tutela de um direito que, de tão claro, impele uma rápida proteção jurisdicional"1, independentemente da existência de qualquer risco de dano. "A evidência é fato jurídico processual. É o estado processual que as afirmações de fato estão comprovadas."2

Por sua vez, a relevância da argumentação (inerente à Tutela Provisória de Urgência) corresponde à "plausibilidade do direito"3 e à sua "probabilidade lógica"4.

Comparado à Tutela Provisória de Evidência, o fumus boni iuris exigido na Tutela Provisória de Urgência é menos denso, robusto, clarividente, ou seja, é naturalmente mais controverso. E por que o fumus boni iuris da Tutela Provisória de Urgência é mitigado? Porque essa tutela depende da presença (simultânea) de risco de dano. Aquela, como visto, não depende, sendo o bastante a probabilidade lógica.

Como a concessão de Tutela Provisória de Urgência pressupõe o binômio fumus boni iuris vs periculum in mora, o grau de constatação de um requisito provoca influência sobre o outro, mas de forma inversa.

Para o Egrégio TJ/SC, "[...] quanto mais denso o fumus boni iuris, com menos rigor deverá mensurar os pressupostos concernentes ao periculum in mora; quanto maior o risco de perecimento do direito vindicado ou a probabilidade de ocorrer dano de difícil reparação, com maior flexibilidade deverá perquirir aqueles relativos ao fumus boni iuris."5

De tal sorte, o periculum in mora, isto é, o riso de dano grave ou de difícil reparação, deve ser visto como o fiel da balança para a atribuição de efeito recursal suspensivo. Para a melhor compreensão do nosso nobre leitor, ilustra-se:

Na hipótese de ser interposto Agravo de Instrumento contra decisão que autorizou expedição de alvará judicial para liberação de crédito no valor de R$ 5.000.000,00 (cinco milhão de reais), vislumbrando (em análise superficial, bem se diga) acanhada plausibilidade do direito alegado pela parte recorrente, ainda que não esteja plenamente convencido da probabilidade lógica do provimento do recurso, deverá o Relator receber o agravo com eficácia suspensiva se também houver risco de dano grave ou de difícil reparação.

É dizer, existindo o risco de dilapidação do sobredito crédito e não possuindo a parte recorrida lastro econômico-financeiro suficiente para garantir eventual ressarcimento, a ordem de expedição de alvará deverá ser sustada, mesmo que a tese recursal não se afigure, no sentir do Relator, evidentemente promissora. Pode ser que, para seus pares, os demais Magistrados integrantes do órgão colegiado, a pretensão da parte recorrente mereça prosperar.

Todavia, apresentando-se a tese recursal não só promissora perante o Relator, mas também de acolhimento com probabilidade bastante acentuada, não haverá de se falar em risco de dano para a concessão de efeito recursal suspensivo, tal como não é necessário perquirir para a concessão de Tutela Provisória de Evidência.

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1 MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil comentado. - 8. ed. - São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2023, pág. 432.

2 DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil - v.2 - Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória / Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliviera. 18. ed. - São Paulo: Editora JusPodivm, 2023, pág. 791.

3 MARINONI, Luiz; ARENHART, Sérgio; MITIDIERO, Daniel. Capítulo I. Disposições Gerais In: MARINONI, Luiz; ARENHART, Sérgio; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado - Ed. 2023. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2023. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/codigo-de-processo-civil-comentado-ed-2023/1916544450. Acesso em: 7 de Outubro de 2023.

4 JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa. Capítulo I. Disposições Gerais In: JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/codigo-de-processo-civil-comentado/1506549897. Acesso em: 7 de Outubro de 2023.

5 TJSC - AI 4006575-20.2017.8.24.0000, Relator: Newton Trisotto, Data de Julgamento: 11/10/2018, Segunda Câmara de Direito Civil.

Raphael Guimarães

VIP Raphael Guimarães

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Alagoas. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Sociedade de Ensino Universitário do Nordeste. Advogado atuante.

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