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Direito à moradia digna: o caminho traçado pela lei 4.380, o sistema financeiro da habitação e o tema 1039/STJ

O Sistema Financeiro da Habitação, criado pela lei 4.380/64, busca viabilizar o acesso à moradia digna, especialmente para as camadas mais vulneráveis, reconhecendo-a como um direito fundamental essencial, atendendo a demandas habitacionais e sociais do país.

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Atualizado em 16 de novembro de 2023 14:22

Introdução

O Sistema Financeiro da Habitação - SFH foi criado com o propósito crucial de viabilizar o acesso à moradia digna, sobretudo para indivíduos de baixa renda. Instituído pela lei 4.380, de 21 de agosto de 1964, o SFH representa uma resposta estratégica às demandas habitacionais e sociais do país.

O objetivo da lei 4.380.

O objetivo primordial do SFH é materializar o direito à moradia digna, oferecendo condições acessíveis para a aquisição da casa própria. Esse compromisso estende-se de maneira especial às camadas mais vulneráveis da população, que, muitas vezes, enfrentam dificuldades significativas para atender a essa necessidade básica, nos termos do que dispõe o art. 1º da lei 4.380/64:

Art. 1° O Govêrno Federal, através do Ministro de Planejamento, formulará a política nacional de habitação e de planejamento territorial, coordenando a ação dos órgãos públicos e orientando a iniciativa privada no sentido de estimular a construção de habitações de interêsse social e o financiamento da aquisição da casa própria, especialmente pelas classes da população de menor renda.

A ênfase na habitação digna para pessoas de baixa renda reflete a compreensão de que o acesso a moradias adequadas não é apenas uma questão de conforto, mas também um direito fundamental. Antes da implementação do SFH, muitas famílias de baixa renda viviam em condições precárias, enfrentando o desafio diário de encontrar abrigo seguro e saudável para seus membros.

A ênfase da moradia digna

A legislação que institui o SFH, conforme expresso na lei 4.380, delineia claramente a responsabilidade do governo em formular uma política nacional de habitação. Essa política visa coordenar esforços públicos e orientar a iniciativa privada para estimular a construção de habitações de interesse social. Nesse contexto, o SFH prioriza a destinação de recursos para a construção de conjuntos habitacionais voltados à eliminação de favelas, mocambos e outras aglomerações em condições sub-humanas, conforme dispõe o art. 4º:

Art. 4º Terão prioridade na aplicação dos recursos:

  1. a construção de conjuntos habitacionais destinados à eliminação de favelas, mocambos e outras aglomerações em condições sub-humanas de habitação;

Em síntese, a legislação que fundamenta o SFH, especialmente conforme expresso no artigo 4º da lei 4.380, delineia um compromisso inequívoco com a promoção do direito à moradia digna.

Nesse contexto, o SFH emerge não apenas como um sistema financeiro, mas, principalmente, como uma ferramenta essencial na construção de um ambiente habitacional mais justo e inclusivo para todos os cidadãos, promovendo a realização do direito fundamental à moradia digna.

Compromisso social e padrões de dignidade: a essência transformadora do SFH na habitação popular

A priorização da destinação de recursos para a construção de conjuntos habitacionais, conforme previsto no artigo 4º, ilustra claramente o foco na eliminação de condições sub-humanas, como favelas e mocambos.

O SFH não apenas facilita o acesso ao crédito para aquisição de moradia, mas especialmente e prioritariamente estabelece diretrizes para garantir que essas habitações atendam a padrões mínimos de dignidade. O foco na baixa renda é evidenciado pela proibição de aplicações em terrenos não construídos, a menos que seja parte de uma operação financeira destinada à construção da moradia.

O SFH foi concebido como uma ferramenta fundamental para promover moradias dignas, especialmente para as pessoas de baixa renda, contribuindo para a redução das desigualdades habitacionais e para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

O tema 1039/STJ

O STJ deu início à análise do Tema 1039/STJ, que tem como objetivo estabelecer o termo inicial para a prescrição na busca por indenização contra seguradoras em contratos do SFH, tanto ativos quanto encerrados.

Há uma corrente minoritária na jurisprudência que pretende estabelecer a quitação do contrato de financiamento como termo inicial da prescrição para a ação que visa a recuperação estrutural do imóvel, em decorrência de vícios que ainda não se tornaram aparentes. Para tanto defendem que o SFH foi gestado para proteção do agente financiador e não do mutuário. Uma vez resolvida a situação do agente financeiro, não haveria mais nada a ser protegido.

Tal tese resulta em uma evidente violação aos artigos Art. 206, §1º, "b"; Art. 769; Art. 771, todos do CC. Pelos referidos artigos o termo inicial da prescrição, em casos de sinistros relacionados a vícios ocultos de construção, é a ciência inequívoca do sinistro e da sua extensão, ainda que ele só se consolide após a quitação do contrato, para cobrir vícios construtivos contemporâneos ao período de vigência.

Além de violar os dispositivos legais mencionados, a afirmação de que o SFH foi concebido para proteger o crédito e não o mutuário, contradiz a lógica fundamental do próprio sistema habitacional para o qual foi criado. Esse posicionamento, em particular, infringe o artigo 1º e 4º, da lei 4.380/64, conforme mencionado anteriormente.

Conclusão

Em síntese, o SFH emerge como uma ferramenta transformadora na concretização do Direito à Moradia no Brasil. Ao longo dos anos, sua implementação e aplicação têm desempenhado um papel crucial na construção de moradias dignas, especialmente para as parcelas mais vulneráveis da população, visando à eliminação de favelas, mocambos e outras aglomerações em condições sub-humanas de habitação, conforme art. 1º, da lei 4.380/64.

A lei 4.380, ao instituir o SFH, estabeleceu não apenas um sistema financeiro, mas um compromisso social intrínseco, conforme dispõem os artigos 1º e 4º da referida lei. O objetivo primordial e inafastável de materializar o direito à moradia digna revela-se como um farol a guiar as políticas habitacionais do país. O acesso a condições acessíveis para a aquisição da casa própria transcende o âmbito financeiro, transformando-se em um instrumento de inclusão social, mas, acima de tudo, propiciando uma moradia digna para essas pessoas carentes. Este é o objetivo de todo o sistema. Moradias dignas.

A ênfase na habitação digna para pessoas de baixa renda não é apenas uma resposta às demandas habitacionais; é um reconhecimento de que o acesso a moradias adequadas é um direito fundamental.

A legislação que fundamenta o SFH, ao delinear a responsabilidade do governo na formulação de uma política nacional de habitação, enfatiza a natureza coordenada e abrangente do compromisso. O direcionamento de recursos para a construção de conjuntos habitacionais, conforme estabelecido no artigo 4º, reforça a prioridade na eliminação de condições sub-humanas de habitação.

O compromisso social e padrões de dignidade humana são a essência transformadora dos Planos de Habitação Popular. O SFH não é apenas um facilitador de crédito, mas um guardião de padrões mínimos de dignidade da pessoa humana.

Logo, o objetivo do SFH não é o de simplesmente proteger apenas o crédito. Muito pelo contrário, o objetivo é proporcionar moradias dignas para quem morava em favelas e mucambos.

Portanto, o SFH não é apenas uma resposta estratégica de crédito às demandas habitacionais e sociais; é um instrumento que contribui ativamente para a redução das desigualdades habitacionais. Ao traçar o caminho do Direito à Moradia, o SFH desempenha um papel crucial na construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e comprometida com a dignidade de todos os seus cidadãos.

Guilherme Veiga Chaves

Guilherme Veiga Chaves

Mestre em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Direito Constitucional Internacional pela Universitá di Pisa/UNIPI, Itália. Advogado sócio do escritório Gamborgi, Bruno e Camisão Associados Advocacia.

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