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Docetaxel e a negativa das operadoras fundada no uso fora da indicação da bula

O tratamento de doenças oncológicas traz desafios intensos, especialmente quando a recidiva demanda terapias mais intensas, gerando preocupações. Em alguns casos, a luta pela cura se transforma em batalha contra o tempo para obter medicamentos através dos planos de saúde, desapontando os beneficiários que esperavam respaldo nos momentos mais críticos.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Atualizado às 08:38

O processo de tratamentos em relação a doenças oncológicas é sempre extremamente desafiador para as famílias e, especialmente para os pacientes, principalmente quando após diversas linhas terapêuticas se descobre uma recidiva significativa da doença o que enseja na necessidade de intensificar os tratamentos já realizados anteriormente causando grandes medos e preocupações.

No entanto, em alguns casos tais preocupações podem ser multiplicadas, sendo o sonho da cura e remissão da doença transformado em uma grande luta contra o tempo para o reestabelecimento da saúde cumulada a uma interminável batalha para liberação dos medicamentos junto às operadoras de planos de saúde.

Os beneficiários arcam com um valor alto referente as mensalidades do plano de saúde, acreditando no que momento em que mais necessitariam do respaldo da Operadora estariam assegurados, o que não acontece.

Esta é a triste realidade que uma paciente que vem travando uma longa batalha contra o câncer de bexiga quando foi surpreendida com o aumento do tumor e a recidiva agressiva, obrigando seu médico a ajustar seu tratamento indicando a combinação dos medicamentos GEMZAR e DOCETAXEL.

Durante todo seu tratamento oncológico, a Operadora de saúde vinha autorizando todos medicamentos necessários, justamente quando a doença alcançou seu estágio mais grave, a beneficiária foi surpreendida com a negativa do fornecimento do medicamento DOCETAXEL.

O DOCETAXEL é uma droga que age por se ligar com alta afinidade a proteínas das células tumorais conhecida por tubulinas, impedindo a divisão celular (mitose) e consequentemente o crescimento tumoral, ocasionando a diminuição das células cancerígenas.

Embora tenha autorizado um dos medicamentos (GEMZAR), a Operadora negou o medicamento DOCETAXEL por alegar que seu uso seria diverso ao que consta na bula, a conhecida negativa "off label".

Vale ressaltar que o tratamento prescrito consistia na combinação dos dois medicamentos. De modo que não adiantaria autorizar o tratamento com uma droga e negar acesso a outra.

É definido como uso off-label, os medicamentos desenvolvidos para determinadas doenças e utilizados no tratamento de outras enfermidades, de forma experimental. O uso do medicamento desta forma pode referir-se ao uso diferente do especificado na bula, uma dosagem diferente ou até mesmo para grupos, doenças ou condição clínica para as quais o medicamento não foi expressamente indicado quando da sua fabricação.

A indicação de um medicamento por essa via geralmente ocorre quando meios tradicionais de tratamento não apresentaram o resultado esperado.

Nestes casos, os medicamentos dever ser registrados pela Anvisa e validados pelo Conselho Federal de Medicina ou possuírem evidências científicas de sua eficácia, cumpridos tais requisitos é obrigatória a cobertura pelos planos de saúde.

O STJ possui entendimento de que, "havendo cobertura para a doença, consequentemente deverá haver cobertura para procedimento ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no referido plano".

Além disso recentemente, de acordo com a Quarta Turma do STJ foi decidido, por unanimidade, que uma operadora de plano de saúde deveria custear tratamento com medicamento prescrito pelo médico para uso off-label. (AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1964268 - DF (21/0259576-8)

De acordo com o órgão julgador, se o medicamento tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa, a recusa da operadora é abusiva, mesmo que ele tenha sido indicado pelo médico para uso off-label ou para tratamento em caráter experimental.

Não cabe ao plano de saúde questionar o tratamento médico indicado, assim como os medicamentos prescritos, a indicação do médico que acompanha o paciente deve sobressair a qualquer interesse financeiro dos planos de saúde.

Deve-se assim ressaltar que a obrigação de cobertura do tratamento oncológico, com o custeio de todos os procedimentos a ele inerente encontra-se garantida na legislação brasileira, pois, com a vigência da lei 9.656/98, é clara a obrigatoriedade de prestação de serviços integrais para o tratamento de combate ao câncer por parte das operadoras de saúde, conforme seu art. 12, alínea "c".

As Operadoras não podem oferecer cobertura contratual à determinada doença, mas não cobrir o medicamento indicado para a busca da cura desta mesma enfermidade.

Destaca-se que não há exclusão contratual para cobertura de tratamentos oncológicos, motivo pelo qual a Operadora não pode se furtar de arcar com os custos dos medicamentos que forem prescritos pelo médico que acompanha a paciente

A resistência da Operadora se mostrou abusiva, pois restou claro, que o medicamento citado foi prescrito por profissional altamente especializado em oncologia e se baseou em estudos que demonstram a eficácia do medicamento para garantir a sobrevida e melhora do quadro da paciente.

A paciente citada no referido caso, apenas conseguiu acesso a medicação e dar início ao novo protocolo de tratamento após obter uma decisão liminar junto ao poder judiciário que obrigou a Operadora a fornecer o medicamento que anteriormente havia sido negado.

Assim, ao se deparar com uma situação parecida, o melhor caminho é procurar ajuda jurídica especializada na área da saúde para garantir uma solução rápida para este tipo de problema, tendo em vista que o tempo é extremamente precioso nestes casos.

Isabela Benini

Isabela Benini

Advogada especialista em direito à saúde.

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