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Arbitragem tributária brasileira: a esquecida da PEC 45

Apesar da eficácia comprovada da arbitragem tributária em Portugal desde 2011, no Brasil ainda persistem dúvidas sobre sua viabilidade, sendo pouco discutida sua potencial celeridade e eficiência no atual cenário jurídico, mesmo após 12 anos de sua introdução em terras portuguesas.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Atualizado às 13:46

O ano era 2011 e a arbitragem tributária avançava em Portugal. Desde o início da utilização da arbitragem tributária, sua eficácia ficou evidente. Por que, então, no ordenamento brasileiro ainda existem profissionais que alegam sua inviabilidade?

No atual cenário jurídico brasileiro, 12 anos após a introdução da arbitragem tributária em Portugal, ainda se debate a possibilidade da utilização desse instituto altamente conhecido por sua celeridade, eficiência, cujo julgamento é realizado por um árbitro altamente especializado em questões fiscais.

Embora a referida PEC esteja em desenvolvimento, não se observam debates públicos e até mesmo com a comunidade tributária do país sobre a celeridade processual que a arbitragem traria tanto aos contribuintes, como ao fisco. Mais uma vez, o método adequado de resolução de conflitos, que tem crescido nos últimos anos no país, é esquecido e permanece no "fundo da gaveta".

A arbitragem expande vigorosamente no país e vem sendo aplicada eficientemente e com bons resultados quanto aos litígios, especialmente aqueles que envolvem a administração pública. A legislação inovou ao possibilitar que a arbitragem fosse utilizada pela administração pública direta e indireta, com base na lei 9.307/96, que foi complementada no ano de 2015 pela lei 13.129. Importante ressaltar o crescente uso da arbitragem inclusive na área trabalhista para litígios com valores cuja remuneração seja superior a duas vezes o teto do INSS, na forma do art. 507-A da CLT.

A manifestação do STF em favor da constitucionalidade da arbitragem no ano de 2001, permitiu o seu respaldo e foi fato gerador de um terreno fértil ao ambiente de negócios no país. Dados demonstram que em 2022, o Brasil detinha 1116 procedimentos arbitrais em trâmite, o que demonstra crescimento contínuo e sólido ao longo dos anos e ratifica o interesse pelo instituto por parte dos empreendedores.

As matérias arbitráveis relacionadas à Administração Pública estão relacionadas apenas às questões em que estejam presentes o Estado no âmbito de contratação, não se aplicando, como consequência, às questões decorrentes de império e às próprias ao poder de polícia. Dessa forma, por exemplo, conflitos que envolvem o poder de desapropriar e o ato de desapropriação, por serem matérias de império, não poderão ser arbitrados. Entretanto, o valor da indenização pela desapropriação, por outro lado, este sim, poderá ser definido em procedimento arbitral.

Como todas as áreas do nosso ordenamento jurídico, a arbitragem também está sujeita a críticas e desafios. Muitos ainda argumentam que a arbitragem pode favorecer as partes mais poderosas devido aos custos elevados e que a falta de vinculativos, que em matéria tributária pode-se entender como o princípio de que as decisões proferidas pelo Poder Judiciário têm o condão de criar precedentes e estabelecer jurisprudência, pode criar incertezas na aplicação das leis tributárias. No entanto, diante do cenário atual, são frágeis cada um desses dois pontos.

Primeiramente, a arbitragem é um método de resolução de litígios em que um terceiro imparcial e especializado é escolhido de comum acordo pelas partes litigantes, inexistindo, portanto, a possibilidade de vantagens para uma ou outra parte. Quanto aos custos, é importante o debate quanto à redução do valor do procedimento para torná-lo mais acessível. No entanto, cabe lembrar que, o poder judiciário também possui custos não menos elevados.

Já, quanto à falta de vinculativos, essa questão é resolvida com a instituição do primeiro, segundo, terceiro e sucessivos procedimentos tributários que somados à publicidade do procedimento, gerará uma consolidade jurisprudência arbitral tributária.

É necessário olhar para os avanços da arbitragem tributária pelo Estado Português e seguirmos um modelo semelhante. No âmbito da legislação portuguesa, com a autorização concedida pela lei 3-B/2010, a arbitragem começou a avançar a largos passos por um país que, até então, enfrentava, assim como o Brasil, um aumento alarmante na quantidade de disputas entre o fisco e os contribuintes. A condução das arbitragens foi concedida ao Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD.  Os casos em disputa não podem ultrapassar duas vezes o valor da alçada do Tribunal Central Administrativo, ou seja, algo que representa aproximadamente ? 60.000 e o Tribunal Arbitral, como regra, funcionará através de árbitro único.

O Centro de Arbitragem Administrativa apresentou, no periódico de 2022, em seu Relatório Anual do Funcionamento da Arbitragem Tributária, o total de 810 processos. Foram concluídos 815 processos com decisão arbitral, o que se traduziu, segundo a CAAD, em uma taxa de resolução superior a 100%.

Como se verifica, não há motivos para que até o momento as partes dos litígios tributários no país não estejam usufruindo das benesses da arbitragem em território nacional, ainda mais tratando-se de um contexto de luta contra um expressivo quantitativo de disputas no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF, assim como no âmbito dos Tribunais Regionais Federais. É descabido que o sistema de justiça multiportas esteja fechado para área tributária.

O fato de a arbitragem ainda não ser amplamente debatida no contexto da reforma tributária em nosso país, priva o fisco e o contribuintes das suas significativas vantagens, especialmente fruto da celeridade e da segurança nos processos fiscais tendentes a fomentar a promoção de um ambiente tributário mais transparente e propício aos negócios no país. Sem o resgate da esquecida da PEC 45, não teremos a concretização da tão deseja atração de investimentos nacionais e estrangeiros e um contínuo e sólido crescimento econômico.

Jayne Albuquerque

VIP Jayne Albuquerque

Bacharel pela UVA; Integrante do DMAT Advogados; Fundadora do Grupo de Estudos Fiscais da UVA; Presidente fundadora da Equipe de Mediação e Arbitragem da UVA; Membro do CJA|CBMA; Sócia do Clube MT

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