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A intersecção da igualdade salarial e a proteção de dados pessoais: Desafios e oportunidades na lei 14.611 e LGPD

Yara Leal Girasole title=Yara Leal Girasole e Plínio Higasi

A lei 14.611 promove equidade salarial de gênero, mas interage complexamente com a LGPD, desafiando empresas a divulgar informações salariais detalhadas e a implementar protocolos contra discriminação salarial.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Atualizado às 14:15

A recente promulgação da lei 14.611, de 3 de julho de 2023, representa um marco na luta pela igualdade de gênero no ambiente de trabalho no Brasil, introduzindo mecanismos significativos para assegurar a equidade salarial entre homens e mulheres, até porque, conforme dados liberados pelo Dieese no final do ano de 2022, houve um aumento de 22% na diferença de remuneração entre homens e mulheres.

Destaca-se que a importância da proteção da dignidade da pessoa humana e a promoção do bem de todos, sem preconceitos ou discriminações, é um dos preceitos fundamentais da Constituição Federal do Brasil, portanto, é extremamente nobre a tomada de quaisquer medidas que tenham por objetivo abordar e corrigir as disparidades salariais de gênero, proporcionando transparência, mecanismos de ação e fiscalização.

Contudo, essa legislação interage de maneira complexa com a lei 13.709/18, lei Geral de Proteção de Dados - LGPD, criando um cenário desafiador para as empresas com 100 empregados mais. Isso porque a lei 14.611 e os subsequentes regulamentos, como o decreto 11.795 e a Portaria 3.714, estabelecem a obrigatoriedade da divulgação de informações salariais detalhadas, em um esforço para erradicar discrepâncias de remuneração baseadas em gênero, e permitem a instituição de um protocolo de fiscalização contra discriminação salarial.

Contudo, essas disposições, embora progressistas em sua essência, levantam questões pertinentes a privacidade e a segurança dos dados dos empregados, conforme delineado pela LGPD, que estabelece diretrizes para a coleta, uso e compartilhamento de informações pessoais, enfatiza a anonimização de dados e a proteção da privacidade. Nesse sentido, porém, a natureza detalhada das informações exigidas pela nova legislação trabalhista pode, inadvertidamente, expor dados pessoais, e dados até sensíveis dos colaboradores, gerando um conflito potencial com os princípios da LGPD.

Embora a intenção da lei 14.611 seja nobre, é imperativo equilibrar a necessidade de transparência com a proteção da privacidade dos colaboradores. As empresas devem encontrar maneiras de cumprir as exigências da lei de igualdade salarial, enquanto se mantêm fiéis aos princípios de proteção de dados. Este é um exercício delicado de equilíbrio, exigindo soluções inovadoras e criativas no tratamento de dados para garantir conformidade com ambas as legislações.

O decreto 11.795, de 23 de novembro de 2023, e a Portaria 3.714, de 24 de novembro de 2023, complementam a lei 14.611, fornecendo uma estrutura mais detalhada para a implementação de suas disposições, estabelecendo os mecanismos pelos quais as empresas devem reportar suas estruturas salariais, e delineando os procedimentos específicos para a coleta e análise desses dados, e é evidente que ambos regulamentos são fundamentais para a efetiva aplicação da lei 14.611, mas também adicionam camadas de complexidade no que diz respeito à proteção de dados.

Neste contexto, as empresas devem adotar práticas robustas de anonimização e segurança de dados, garantindo que a divulgação de informações salariais cumpra tanto a lei 14.611 quanto as normas de proteção de dados. Isso pode incluir a utilização de tecnologias de processamento de dados avançadas que permitam a análise de informações salariais sem revelar identidades individuais.

Os profissionais que trabalham com direito aplicado à tecnologia, nestes casos, terão como função auxiliar as empresas a navegarem neste cenário complexo, com consultoria especializada para garantir que as estratégias adotadas não apenas atendam aos requisitos legais de igualdade salarial, mas também respeitem rigorosamente as normas de proteção de dados, orientando e apoiando às empresas nesse processo de adaptação.

A coexistência da lei 14.611 com a LGPD e demais normas de proteção de dados apresentam desafios, mas também oportunidades para demonstrar comprometimento com a igualdade de gênero e a privacidade dos dados. À medida que as empresas buscam cumprir essas exigências, a necessidade de assessoria jurídica especializada em direito digital se torna ainda mais evidente.

Yara Leal Girasole

VIP Yara Leal Girasole

Sócia responsável pela área de Direito do Trabalho no escritório HSLG Advogados. Formada pela Mackenzie, com Pós-graduação na PUC/SP.

Plínio Higasi

Plínio Higasi

Sócios do escritório HSLG Advogados.

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