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O TSE e os desafios de combater a afroconveniência nas eleições municipais de 2024

O repasso do fundo eleitoral campanha deve ser usado com pessoas negras. A criação de comissões de heteroidentificação é imprescindível para garantir a real representatividade da população negra nas eleições.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Atualizado às 14:30

A Afroconveniência constitui um conjunto de ações individuais ou de grupos para o aproveitamento de algum benefício ofertado por programação institucionais para minimizar a desigualdade social da população negra no Brasil.

Inicialmente, o programa de cotas raciais nas universidades públicas teve sérios desafios diante do aproveitamento das cotas raciais por pessoas que não apresentavam características fenotípicas de indivíduos negros. No Brasil, a categoria de pardos, que representa mais da metade da sociedade, diante da singular mestiçagem do povo, foi o grupo que mais se beneficiou dos programas públicos.

Expliquemos: no Estados Unidos é considerada pessoa mestiça e negra aquela que tem ascendentes afro-americanos. No Brasil, tal critério seria inviável de ser verificado tendo em vista que a mestiçagem constitui um traço de nossa cultura. A razão histórica pode explicada pelo modelo de escravidão aqui instituído, o sistema português, de origem muçulmana. Nas colônias americanas do norte prevaleceu o sistema inglês. Ambos são igualmente perversos, mas lá a violência sexual contra as mulheres escravas era muito menor, assim mulheres negras dificilmente tinham filhos dos senhores brancos.

Não podemos simplesmente aplicar um critério de origem no Brasil. As pessoas com traços físicos negroídes, ou seja, que tenha o fenótipo negro, sofrem muito mais do que aqueles que conseguem se "esconder" com o tolerável colorismo.

As cotas não são voltadas para todas as pessoas do espectro do colorismo, mas somente para aqueles cuja aparência fenotípica negra. Ainda ausente de políticas de letramento racial no país, as cotas e outros mecanismo de incentivo à diminuição da discrepância entre homens e mulheres negras no Brasil não é compreendida nem pelos interessados como por outros grupos sociais.

Com a evolução das políticas e com maior controle estatal e da sociedade civil, há a penalização daqueles que se autoidentificam como negros e pardos, mas que de fato não tem as características fenotípicas como limitadores sociais para ocuparem espaços públicos e de trabalho.

A ação de controle que já existem em outros âmbitos agora passará a contemplar as eleições. Não encontramos na jurisprudência nenhuma penalização para partidos ou candidatos. Entretanto, já que o repasse dos fundos de campanha para os partidos é em dobro para os votos computados pelo seguimento, não resta dúvidas que a ausência de controle gera danos à sociedade e constitui mecanismo repudiável para manipular os repasses dos recursos públicos para as campanhas.

Para as eleições de 2024, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC vai repassar cerca de 5 bilhões de reais aos partidos. Nas audiências públicas ocorridas entre 23 e 25 de janeiro de 2024, o debate girou sobre a necessidade de controle desses repasses.

Mesmo não havendo punições como perda de mandato ainda, o valor de recursos distribuídos entre os candidatos pelos partidos deve ter proporcional ao percentual de negros e pardos candidatos.

Hoje a autoidenticação é feita no registro de candidatura e muitas vezes tal registro diverge da indicação constante no cadastro eleitoral. Obviamente, esse debate sobre negritude é novo no Brasil e muitas pessoas ao responderem ao cadastro eleitoral não tinha conhecimento.

Inicialmente, a proposta dis representantes do segmento é pela necessidade de retificação do cadastro eleitoral. Assim, deveria ter identidade entre o cadastro eleitoral e o registro.

Mas considerando a proximidade das eleições tais pedidos de retificação exigiriam um esforço enorme no período eleitoral e não considero a sugestão como alternativa prática para se resolver a questão.

Não sabemos ainda qual a resposta do Tribunal Superior Eleitora - TSE sobre o tema, porém há muitas alternativas viáveis de combater às práticas de Afrocoveniência, inclusive nas eleições.

As comissões de heteroidentificação existentes em concursos públicos é um bom exemplo de medida. Contudo, no universo extenso de candidatos, a constituições de comissões demandariam muito tempo. Essa sugestão foi da dada por representantes do segmento. Apesar de excelente têm dificuldades práticas para ser viabilizadas.

A sugestão da OAB Nacional pareceu bem interessante. Seria incumbência dos partidos garantir o fiel cumprimento da lei, por isso que o resguardo deveria ser deles. É muito mais viável em termos estratégicos essa solução.  Já para os partidos, como medida de de acontability sugiro a criação de comissões internas de heteroidentificação racial previamente ao registro de candidatura. Evita que, num futuro controle judicial pela justiça eleitoral, possa prejudica-los.

A criação de heteroidentificação pelos próprios partidos representa um política de integridade importante e que seria muito bem aceita pela sociedade. É viável ser feita. Mas a existência de um comissão partidária não impede o questionamento na Justiça Eleitoral, mas com certeza será uma medida preventiva importante.

Essas medidas visam garantir que os recursos públicos efetivamente sejam usados com a finalidade para qual foram programados. Em resumo, que os recursos sejam usados para viabilizar a representação da população negra, tão inviabilizada na política nacional.

Rosa Maria Freitas

VIP Rosa Maria Freitas

Doutora em Direito pelo PPGD/UFPE, professora universitária, Servidora pública, Escritório Rosa Freitas Advocacia em Direito público, palestrante e autora do livro Direito Eleitoral para Vereador.

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