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Análise da isenção de custas processuais para execução de honorários advocatícios

A análise do PL 4538/21, que propõe a isenção de custas processuais para a execução de honorários advocatícios, revela a necessidade premente de equilibrar os interesses legítimos da advocacia com os princípios processuais basilares e a viabilidade financeira para o Poder Judiciário.

terça-feira, 2 de abril de 2024

Atualizado às 09:18

Introdução

A advocacia desempenha um papel fundamental na administração da justiça e na solução pacífica de conflitos, conforme reconhecido pelo art. 133 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Contudo, em inúmeros casos, os advogados enfrentam obstáculos significativos para receber os honorários devidos pelos seus clientes, sendo compelidos a ingressar com execuções judiciais para obter o pagamento desses créditos profissionais essenciais.

Nesse contexto, o PL 4538/21 emerge como uma proposta visando isentar os advogados do pagamento de custas processuais nessas execuções de honorários advocatícios (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2021). A proposição tem como objetivo primordial garantir os meios necessários ao exercício pleno da advocacia e evitar que os profissionais tenham prejuízos indevidos ao arcar com essas despesas para receber o que lhes é devido por direito.

Para fins de uma análise aprofundada das implicações dessa proposta legislativa, compara-se detalhadamente com as disposições existentes no CPC vigente (BRASIL, 2015), que já contempla mecanismos para facilitar a execução de honorários advocatícios. Serão avaliadas meticulosamente as vantagens, os aspectos a considerar e as recomendações para a implementação dessa isenção de custas processuais, buscando contribuir para um debate qualificado e equilibrado sobre o tema.

Disposições do PL 4538/21

O PL 4538/21 propõe a inclusão de um novo parágrafo ao artigo 82 do CPC, com a seguinte redação:

"Art. 82. [...] § 3º Na execução de honorários advocatícios, o advogado ficará isento de pagar custas processuais." (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2021, p. 2).

Dessa forma, a proposta estabelece uma isenção total do pagamento de custas processuais para os advogados que promoverem a execução de seus honorários advocatícios, representando uma medida de significativa relevância para a classe profissional.

Mecanismos existentes no código de processo civil

O CPC vigente já conta com alguns dispositivos que visam facilitar a execução de honorários advocatícios e reconhecer a importância desse crédito profissional. Destacam-se:

  1. Artigo 85, § 14: "Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial" (BRASIL, 2015). Esse dispositivo reconhece a natureza alimentar dos honorários advocatícios, conferindo-lhes privilégios semelhantes aos créditos trabalhistas.
  2. Artigo 85, § 19: "Os advogados públicos que exercem a representação judicial dos respectivos entes públicos não têm direito à percepção dos honorários sucumbenciais" (BRASIL, 2015). Essa norma estabelece uma distinção entre os advogados públicos e privados no que tange ao recebimento de honorários sucumbenciais.
  3. Artigo 827, caput: "Ao despachar a inicial, o juiz fixará, de plano, os honorários advocatícios de dez por cento, a serem pagos pelo executado" (BRASIL, 2015). Essa disposição visa facilitar a execução de honorários advocatícios, ao determinar a fixação imediata desses valores pelo juiz.

Esses dispositivos reconhecem a natureza alimentar dos honorários advocatícios e facilitam sua execução e pagamento preferencial em relação a outros créditos. No entanto, não isentam totalmente os advogados do pagamento de custas processuais nessas execuções, mantendo essa obrigação.

Vantagens da isenção de custas processuais

A isenção de custas processuais proposta pelo projeto de lei 4538/21 apresenta algumas vantagens significativas:

  1. Redução substancial dos custos para o advogado: Com a isenção, os advogados teriam uma economia considerável ao executar os honorários devidos pelos clientes, uma vez que não precisariam arcar com essas despesas adicionais, muitas vezes onerosas.
  2. Maior celeridade e eficiência na cobrança: Ao remover a obrigação de pagar custas, o processo de execução de honorários se tornaria mais simples, ágil e desburocratizado, permitindo que os advogados recebam seus créditos de forma mais célere e eficiente.
  3. Valorização da advocacia e reconhecimento de sua importância: A medida pode ser interpretada como uma forma de valorizar a advocacia, reconhecendo a importância crucial do trabalho dos advogados para o funcionamento do sistema de justiça e facilitando o recebimento de seus honorários, que são a contraprestação por seus serviços essenciais.

Aspectos a considerar

Embora a proposta apresente vantagens relevantes, é necessário considerar alguns aspectos cruciais:

  1. Impacto financeiro potencialmente significativo para o poder judiciário: a isenção das custas processuais pode representar uma perda de receita considerável para o Poder Judiciário, que utiliza esses recursos para a manutenção de sua estrutura, investimentos e custeio de seu funcionamento. É imprescindível avaliar cuidadosamente o impacto orçamentário e financeiro dessa medida.
  2. Equilíbrio entre os princípios processuais e a isonomia: é preciso avaliar se a isenção total das custas não viola princípios fundamentais do processo civil, como a isonomia e o acesso à justiça, uma vez que outras partes continuariam sujeitas ao pagamento dessas despesas, podendo gerar desequilíbrios e tratamentos diferenciados injustificados.
  3. Análise da necessidade e proporcionalidade: ainda que o CPC não isente totalmente os advogados do pagamento de custas, os dispositivos existentes já priorizam e facilitam significativamente a execução de honorários advocatícios. Portanto, é necessário analisar se a isenção proposta é realmente indispensável e proporcional, ou se os mecanismos atuais, combinados com eventuais ajustes pontuais, já seriam suficientes para atender aos interesses legítimos da advocacia.

Recomendações

Diante dos aspectos expostos, recomenda-se uma análise criteriosa e abrangente da proposta, levando em consideração os seguintes pontos:

  1. Realizar estudos de impacto financeiro e orçamentário abrangentes e detalhados para o poder judiciário, a fim de avaliar a viabilidade da medida em sua totalidade, bem como a possibilidade de implementação de isenções parciais ou condicionadas, mitigando os eventuais efeitos adversos sobre as finanças públicas.
  2. Ponderar cuidadosamente os princípios processuais e a isonomia entre as partes, buscando soluções equânimes e equilibradas que não comprometam a igualdade de tratamento e o acesso à justiça, pilares fundamentais do sistema processual.
  3. Considerar a possibilidade de adotar isenções parciais ou condicionadas, ao invés da isenção total, a fim de equilibrar os interesses envolvidos, mitigando os impactos financeiros e preservando a isonomia, sem prejuízo aos legítimos interesses da advocacia.
  4. Avaliar de forma imparcial e criteriosa se a medida é realmente indispensável ou se os mecanismos existentes no CPC, eventualmente aprimorados, já são suficientes para a execução de honorários advocatícios, evitando a criação de regras excessivas ou desnecessárias.
  5. Promover debates e consultas públicas amplas, transparentes e inclusivas, com a participação efetiva de todos os atores envolvidos, como advogados, magistrados, Tribunais, entes públicos e sociedade civil organizada, a fim de obter uma visão abrangente, plural e representativa, construindo soluções consensuais, legítimas e sustentáveis.

Considerações finais

A análise do PL 4538/21, que propõe a isenção de custas processuais para a execução de honorários advocatícios, revela a necessidade premente de equilibrar os interesses legítimos da advocacia com os princípios processuais basilares e a viabilidade financeira para o Poder Judiciário. Embora a medida possa trazer vantagens, como a redução de custos para os advogados e a valorização da advocacia, é preciso considerar cuidadosamente o impacto financeiro potencialmente significativo para o Judiciário, bem como a necessidade de preservar a isonomia e o acesso à justiça para todas as partes envolvidas nos processos.

Recomenda-se uma avaliação criteriosa, com estudos de impacto abrangentes, ponderação dos princípios processuais e a possibilidade de adotar isenções parciais ou condicionadas, evitando soluções extremas ou excessivas. Ademais, é fundamental promover amplos debates e consultas públicas, envolvendo todos os atores interessados, a fim de construir soluções consensuais, legítimas e equilibradas que atendam aos interesses da advocacia sem comprometer o funcionamento adequado do Poder Judiciário e os princípios fundamentais do processo civil. Essa análise minuciosa e participativa é essencial para garantir que eventuais alterações legislativas nesse sentido sejam pautadas pela ponderação, equilíbrio e preservação dos valores constitucionais, contribuindo para o aprimoramento do sistema de justiça e o fortalecimento da advocacia como instituição indispensável à administração da justiça.

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BRASIL. [Constituição (1988)].   Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2023]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 28 mar. 2024.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 28 mar. 2024.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº 4538/2021. Desobriga o advogado de pagar custas em execução de honorários. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2021. Disponível em: [link para o PDF do Projeto de Lei]. Acesso em: 28 mar. 2024.

Guilherme Fonseca Faro

VIP Guilherme Fonseca Faro

Consultor em Direito, Educação e Negócios. Membro dos Advogados de Direita e fundador do Movimento Nordeste Conservador. Pós-graduado em Direito Público.

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