MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Corte Especial do STJ forma maioria para estabelecer a SELIC como índice default para a correção de dívidas civis, mas julgamento ainda aguarda conclusão

Corte Especial do STJ forma maioria para estabelecer a SELIC como índice default para a correção de dívidas civis, mas julgamento ainda aguarda conclusão

Apesar da maioria formada, aguarda-se pedido de vista para análise de questões de ordem.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Atualizado às 10:52

Em 6/3/24, a Corte Especial do STJ voltou a enfrentar a discussão sobre o índice aplicável aos juros de mora incidentes sobre as dívidas civis, mediante interpretação do artigo 406 do Código Civil. No julgamento do REsp 1.795.982, a maioria dos ministros votou pela aplicação da taxa SELIC para a correção de dívidas civis, em detrimento do modelo de correção monetária somada a juros de mora de 1% ao mês.

O REsp foi interposto por Expresso Itamarati S.A. contra acórdão do TJSP que determinou que os juros moratórios fossem calculados à taxa de 1% ao mês, em razão do disposto no art. 406 do Código Civil, combinado com a previsão do art. 161, § 1º, do CTN - Código Tributário Nacional.

Em 1.3.23, a Corte Especial do STJ iniciou o julgamento do REsp 1.795.982 para fixar tese que solucionasse a controvérsia. Na sessão, o relator ministro Luis Felipe Salomão conheceu do REsp e negou-lhe provimento, sob entendimento de que a taxa SELIC seria inadequada para as dívidas derivadas de responsabilidade civil contratual ou extracontratual. Entendeu o ministro que o melhor critério para fins de correção monetária e juros de mora das dívidas civis é a utilização de índice oficial de correção monetária, somado à taxa de juros de 1% ao mês, na forma simples, como dispõe o § 1º do art. 161 do CTN.

O relator, em suas considerações, destacou que a taxa básica de juros estabelecida pelo Banco Central desempenha um papel crucial na política monetária para combater a inflação, porém, argumentou que sua aplicação não seria apropriada em situações de obrigações contratuais e extracontratuais, hipóteses nas quais os juros moratórios são contados a partir do evento danoso e da citação, respectivamente.

Além disso, ressaltou que a soma dos acumulados mensais da taxa SELIC resulta em percentuais inferiores em comparação com a variação entre o termo inicial e final do período considerado, de modo que os acumulados mensais não cobririam perdas inflacionárias. Também questionou a utilização da taxa SELIC, argumentando que a sua aplicação contraria a natureza punitiva dos juros moratórios determinados nas dívidas civis, pois a adoção dos acumulados mensais da taxa, em detrimento da multiplicação dos fatores diários, desestimularia o pagamento pelo devedor civil.

Em outro ponto, o ministro relator compreendeu que deveria haver distinguishing com relação ao entendimento firmado pela Corte Especial acerca nos EREsp 727.841, segundo qual a taxa dos juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil seria a SELIC, para destacar que essa compreensão se deu no âmbito do direito público e não se aplicaria necessariamente ao direito privado.

O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do ministro Raul Araújo e, em 7.6.23, a Corte Especial retomou o julgamento. Em nova sessão, o ministro Raul Araújo deu provimento ao REsp, abrindo divergência, para determinar que os juros de mora sobre o valor da condenação e a correção monetária sejam calculados pela taxa SELIC, a incidir desde a citação até o efetivo pagamento.

Em seu voto, o ministro Raul Araújo afirmou que as penalidades judiciais sujeitas a juros de mora de 1% ao mês somados a correção monetária, resultam em uma circunstância na qual o credor civil alcança remuneração substancialmente superior àquela proveniente de qualquer investimento financeiro. Argumentou que não há justificativa para impor ao devedor, em dívidas civis, taxa de juros de mora capitalizada mensalmente, juntamente com a atualização monetária do valor devido, nos casos em que tais consequências não encontram respaldo em previsões contratuais referentes à multa moratória.

Além disso, destacou que o Código Civil não demanda aplicação separada de juros de mora e correção monetária, mas atribui tratamento semelhante a ambos, a ponto de praticamente uni-los. Também enfatizou que a aplicação da taxa SELIC, que une a correção monetária e os juros, encontra-se alinhada com o histórico econômico do país e com o intuito do legislador quando da elaboração do Código Civil.

O ministro Raul Araújo prosseguiu argumentando que a correção monetária acrescida de juros era justificada em uma economia de hiperinflação, na qual teria razão a aplicação da regra autônoma de correção prevista no CTN. Adicionalmente, ressaltou que a Emenda Constitucional 113/21 estabeleceu a SELIC como única taxa vigente para a atualização monetária e a compensação da mora nas demandas envolvendo a Fazenda Pública, sendo a SELIC, atualmente, o principal indexador que governa o sistema financeiro brasileiro.

Após aberta a divergência, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista regimental do relator ministro Luis Felipe Salomão. Então, em 1.8.23, a Corte voltou a julgar o REsp. Na sessão, o ministro relator apresentou voto-vista, ratificando o voto anteriormente proferido, para negar provimento ao recurso.

Por sua vez, o ministro Raul Araújo manteve a divergência, ratificando o seu voto, para dar provimento ao recurso. A divergência foi acompanhada pelo ministro João Otávio de Noronha, enquanto o ministro Humberto Martins votou com o Relator.

O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves, pedido que, nos termos do art. 161, § 2º, do RISTJ, foi convertido em vista coletiva, e foi retomado em 6.3.24.

Na nova sessão os pedidos de renovação de sustentação oral foram inadmitidos e, após pedido de vista, o ministro Benedito Gonçalves acompanhou o voto divergente do ministro Raul Araújo, sob entendimento de que é impossível reaver um revogado sistema de juros fixos, quando a lei expressamente caminhou no sentido de atrelamento aos juros aplicáveis à Fazenda Nacional.

A divergência foi acompanhada pelas ministras Isabel Gallotti e Nancy Andrighi, enquanto os ministros Mauro Campbell, Antônio Carlos e Herman Benjamin votaram com o relator. Diante do empate, colheu-se o voto da presidente ministra Maria Thereza Assis Moura, que acompanhou a divergência instaurada pelo ministro Raul Araújo.

Desse modo, a maioria dos ministros da Corte Especial do STJ votou por dar provimento ao REsp 1.795.982, sob entendimento de que, nos termos da redação contida pelo art. 406 do Código Civil, deve ser aplicada a taxa SELIC na correção das dívidas civis. A ministra Presidente proclamou o resultado do julgamento, nos termos do voto do ministro Raul Araújo, acompanhado pelos Benedito Gonçalves, Maria Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, João Otávio de Noronha e Maria Thereza de Assis Moura, restando vencidos os ministros Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Antonio Carlos Ferreira, Humberto Martins e Herman Benjamin.

Entretanto, após a proclamação do resultado, o relator ministro Luis Felipe Salomão suscitou três questões de ordem. Primeiramente, suscitou a nulidade do julgamento, pois os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Sebastião Reis Júnior, ausentes no momento da conclusão, estariam presentes na parte da tarde para participar do julgamento, mas a Presidente optou por encerrar o julgamento com o quórum iniciado. Em seguida, destacou a necessidade de definir qual a taxa SELIC que a maioria da Corte deseja ver aplicada, se a taxa SELIC composta ou a taxa SELIC com a soma dos acumulados mensais. Por fim, ressaltou a importância de esclarecer como será aplicada a taxa SELIC nos casos em que o termo inicial dos juros de mora antecede a correção monetária.

Na sequência, o julgamento foi interrompido por pedido de vista antecipado do ministro Mauro Campbell Marques, para análise das questões de ordem suscitadas, conquanto os ministros Maria Thereza Assis Moura, João Otávio de Noronha e Nancy Andrighi tenham, desde já, proferido antecipadamente seus votos no sentido de rejeitar as questões de ordem suscitadas pelo relator.

Lucas de Castro Oliveira e Silva

Lucas de Castro Oliveira e Silva

Advogado no Terra Tavares Elias Rosa. Professor Substituto do Departamento de Direito Civil e Direito Internacional Privado da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). Doutorando em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Terra Tavares Elias Rosa Advogados Terra Tavares Elias Rosa Advogados
Gabriella Mendes Bento

Gabriella Mendes Bento

Colaboradora no Terra Tavares Elias Rosa. Graduanda em Direito pela UERJ.

Terra Tavares Elias Rosa Advogados Terra Tavares Elias Rosa Advogados

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca