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Tornando-se aliados-chave na luta contra a corrupção: O papel dos whistleblowers nos EUA

Os programas de incentivo aos whistleblowers dos EUA recuperaram mais de US$ 100 bilhões. O novo programa do DOJ é crucial na luta contra o crime corporativo e a corrupção.

terça-feira, 30 de abril de 2024

Atualizado às 09:10

Na semana passada, um júri em Miami considerou Carlos Ramón Pólit Faggioni, ex-chefe da Controladoria-Geral do Equador, culpado de conspirar com seu filho, um banqueiro em Miami, e com outros por lavagem de milhões de dólares em propinas da Odebrecht e de um empresário de resseguros equatoriano. Pólit, que fugiu para os EUA em 2017, foi condenado em 2018 à revelia no Equador a seis anos de prisão e a pagar 40 milhões de dólares em restituição. 

Este é apenas um de uma série de recentes processos por propinas estrangeiras movidos por agências de fiscalização dos Estados Unidos contra entidades que realizam negócios na América Latina. A tendência deve servir como um aviso: as autoridades competentes dos EUA estão atentas à práticas corruptas na América Latina que possam afetar os mercados globais ou os interesses comerciais dos EUA.   

Apenas nos três primeiros meses de 2024, o Departamento de Justiça dos EUA (DoJ, na sigla em inglês) resolveram três grandes casos de corrupção no Brasil, Equador e México. Em março, a empresa suíça de comércio de commodities a Trafigura Beheer BV se declarou culpada de violar a Lei de Práticas Corruptas no Exterior (FCPA, na sigla em inglês) dos EUA e concordou em pagar mais de 126 milhões de dólares para resolver alegações de que a empresa pagou propinas a funcionários brasileiros a fim de garantir negócios com a Petrobras.   

Também em março, como parte das resoluções criminais com as autoridades norte-americanas e  suíças, o Grupo Gunvor concordou em pagar cerca de US $ 661 milhões e admitiu conspirar para subornar funcionários no Equador a fim de garantir negócios com a empresa petrolífera estatal Petroecuador. 

Da mesma forma, em fevereiro, um ex-comerciante da empresa global de energia e commodities o Grupo Vitol foi condenado por violações da FCPA e lavagem de dinheiro após um longo julgamento sobre alegações sobre de que ele subornou autoridades no Equador e no México para ganhar US$ 500 milhões em negócios. Em 2020 Vitol concordou em pagar mais de US $ 135 milhões para resolver alegações de propina relacionadas. 

Embora não se possa saber com certeza se algum destes casos recentes foi resultado de um "whistleblower" (termo utilizado em inglês para o "insider" que faz uma denúncia), os programas dos whistleblowers da Securities and Exchange Commission (SEC, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA) e da Commodity Futures Trading Commission (CFTC, a Comissão de Negociação de Futuros de Commodities) estão criando incentivos poderosos para que indivíduos com conhecimento de irregularidades denunciem às autoridades dos EUA, oferecendo recompensas financeiras aos denunciantes. Até o momento, milhares de indivíduos estrangeiros participaram dos programas dos whistleblowers - muitos deles com grande sucesso. 

Os whistleblowers se tornaram parte integrante da luta contra a corrupção dos EUA. Na realidade, no início de março, o DOJ anunciou que irá incentivar os whistleblowers a denunciar crimes empresariais e financeiros, especialmente corrupção estrangeira, fornecendo incentivos monetários às pessoas que apresentem informações importantes sobre irregularidades.   

O novo programa destina-se a preencher lacunas nos atuais programas dos whistleblowers da SEC e da CFTC. As autoridades do DoJ identificaram especificamente violações da FCPA e as fraudes financeiras como áreas específicas de interesse. O DOJ manifestou particular interesse em casos da FCPA fora da jurisdição da SEC, incluindo violações por parte de empresas não registradas no mercao de capitais americanos e violações da recentemente promulgada Lei de Prevenção de Extorsão Estrangeira (FEPA, na sigla em inglês). Tanto cidadãos americanos quanto estrangeiros podem ser whistleblowers.

O iminente programa de whistleblower do DOJ deve sobrecarregar a fiscalização anticorrupção dos EUA. Mais de trinta anos de leis robustas dos whistleblowers nos EUA demostraram que as recompensas financeiras pelas informações dos whistleblowers são a maneira mais eficaz de combater a corrupção e as irregularidades. A corrupção prospera porque está enraizada no sigilo e há sérios déficits de informação para as agências de aplicação da lei. Evidências de qualidade são essenciais para descobrir todos os tipos de corrupção, e os whistleblowers estão muitas vezes em posição de fornecer o conhecimento interno que desvendará fraudes há muito enterradas.

Os programas dos EUA que oferecem incentivos financeiros aos whistleblowers alcançaram um sucesso notável, recuperando mais de US$ 100 bilhões em danos e sanções para os governos federal e estadual e para os investidores prejudicados. O novo programa de incentivo á whistleblowers do Departamento de Justiça é um desenvolvimento importante na guerra contra o crime corporativo e a corrupção e demonstra que o DOJ reconhece o poder de incentivar aqueles com conhecimento interno a avançar. O programa, juntamente com as iniciativas de denúncia existentes da SEC e da CFTC, será outra ferramenta poderosa para intensificar a fiscalização anticorrupção no Brasil e no mundo.

As empresas na América Latina devem ficar atentas e esperar mais ações de fiscalização por parte das autoridades dos EUA, à medida que esses programas de denúncia se tornam mais conhecidos por aqueles que têm conhecimento sobre má conduta.

Erika Kelton

Erika Kelton

Advogada internacional especializada na representação dos whistleblowers.

Dennis Blumenfeld

Dennis Blumenfeld

Advogado internacional especializado na representação dos whistleblowers.

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