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O ônus probatório e a teoria da verossimilhança preponderante

O estudo propõe a aplicação da teoria da verossimilhança preponderante para evitar injustiças diante de provas inconclusivas.

sexta-feira, 3 de maio de 2024

Atualizado em 2 de maio de 2024 14:54

1. Rápida reflexão sobre dever e ônus processuais

O estudo sobre a produção das provas pelas partes e sua avaliação perpassa ao redor da conceituação sobre ônus e dever. Ou seja, há que se definir, numa análise global normativa, se a produção de provas pelas partes consiste em dever ou ônus.

Diga-se, na tentativa de conceituar sob a ótica estritamente jurídica, que há dever ao sujeito quando existe encargo a si atribuído e em benefício de terceiro, com previsão de consequência negativa caso descumprido. O dever é uma imposição obrigatória e, se descumprido, pode prejudicar terceiro e criar-lhe um direito subjetivo contra o agente que descumpriu.

E, de outro lado, há ônus se o encargo atribuído, caso descumprido, prejudicar a si próprio. Logo, como não prejudica terceiro, é faculdade daquele a quem é direcionado.

Assim é que, por exemplo, o dever legal dos pais de criar e educar os filhos - art. 1634 I CC - pode trazer consequências aos menores e, se inobservado, pode ensejar a alteração da guarda (art. 1584 § 4º CC) ou a perda do poder familiar (art. 1638 CC). Ainda exemplificando, a quebra do dever do contribuinte de cumprir, perante o sujeito ativo da relação tributária, a obrigação principal ou a acessória, pode trazer a consequência de ver a efetuação de lançamento tributário e consequente cobrança em seu desproveito (art. 142 CTN).

De outro lado, a própria legislação processual estipula ônus aos litigantes que, se inobservados, não prejudicam terceiros, mas ao próprio onerado.  

A faculdade dada ao exequente de protestar o título (art. 517 CPC), se não colocada em prática, não prejudica terceiros e está longe de ser um ilícito. Na realidade, o ônus de protestar, se não implementado, prejudica ao próprio exequente. Eis - repita-se - um exemplo de ônus processual. De igual forma, o ônus de apresentar a memória de cálculos que evidencie o que o devedor acha ser o valor efetivamente devido (art. 917 § 3º CPC), se descumprido, apenas prejudica a si próprio (§ 4º).

Essa perigosa e tormentosa conceituação tem apenas o mérito de ajudar, de início, na identificação das consequências pelo (des)cumprimento dos encargos probatórios pelas partes. Dito de outra forma, o denominado - pelo próprio legislador - "ônus da prova" -, tendo em vista a distinção alhures realizada, prejudica, caso inobservado, apenas à parte onerada.

Com efeito, se a parte não prova aquilo que propõe em sua petição inicial ou contestação, o prejuízo é só dela e não estará prejudicando terceiro.

Em princípio, tal assertiva parece verdadeira e insofismável, mas vale refletir um pouco mais sobre certas situações específicas.

2. Distribuição dinâmica X carga estática

A regra da distribuição estática, ao menos na literalidade do CPC/73, era vigente. Assim é que, quase de forma matemática, dizia o art. 333 CPC competir ao autor a produção de prova sobre os fatos constitutivos do seu direito, enquanto ao réu demonstrar aqueles impeditivos, modificativos ou extintivos.

O aludido sistema não resolvia diversas situações, mormente aquelas que consubstanciavam a apelidada prova diabólica. Ou seja, muitas vezes o autor não tinha como provar determinado fato negativo, o qual era necessário para corroborar a constituição de seu direito, e, como consequência de sua inevitável inércia, teria que, como regra geral, sair derrotado da demanda.

Alguns diplomas legais específicos e a própria jurisprudência, diante dessa lacuna, foram agregando a ideia da inversão do ônus da prova. Ela - a inversão - ajudava no tocante a determinados casuísmos, porém, no fundo, trazia o sistema estático de forma invertida (o réu passava a obrigatoriamente ter o ônus de provar, sob pena de automática procedência do pedido).

Luiz Fernando Valladão Nogueira

VIP Luiz Fernando Valladão Nogueira

Advogado. Procurador do município de Belo Horizonte. Professor universitário em graduação e pós-graduação. Coordenador de pós-graduação em Direito Processual Civil. Advogado do escritório Valladão Sociedade de Advogados.

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