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Voto facultativo versus voto obrigatório: O que é melhor para o Brasil?

O debate sobre voto obrigatório ou facultativo no Brasil reflete a busca por maior engajamento eleitoral, equilibrando participação quantitativa e consciência política.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Atualizado em 19 de fevereiro de 2025 09:09

A discussão sobre a obrigatoriedade do voto versus o voto facultativo oferece um rico campo de análise constitucional e política. No Brasil, o voto é uma obrigação legal, resultando em penalidades financeiras para os que não comparecem às urnas. Em contraste, nações como Canadá, Estados Unidos, Reino Unido e Japão adotam o voto facultativo, notando-se um enfoque diferente com relação ao papel do eleitorado na democracia.

Nos sistemas onde o voto não é obrigatório, o voto facultativo transcende a simples prática eleitoral: é um direito exercido por eleitores comprometidos. Nesses contextos, a presença nas urnas de cidadãos informados e realmente interessados tende a ser marcante, embora exista um risco inerente de desmotivação eleitoral e amplos índices de abstenção, que frequentemente precisam ser abordados por campanhas robustas de engajamento e educação política.

A dicotomia entre obrigatoriedade e voluntariedade no voto revela distintas dimensões de participação cidadã. O obrigatório promove altos níveis de participação quantitativa, mas pode mascarar desinteresse genuíno, ao passo que muitos eleitores se dispõem apenas a evitar penalidades (quando muito!). No cenário de voto facultativo, mesmo que a quantidade de votantes seja inferior, a natureza qualitativa do envolvimento tende a ser superior, destacando-se a consciência política e o desejo proativo de influenciar decisões governamentais.

A penalização por não votar no Brasil - calculada conforme os arts. 127 e 129 da resolução-TSE 23.659/21 - funciona mais como um incômodo administrativo do que como um incentivo real à participação significativa. O valor base da multa por ausência injustificada no Brasil é de R$ 35,13 - Apenas a título comparativo, a multa por não pagar um ticket de trem no Reino Unido varia de R$ 700,00 a 840,00 (raramente alguém não possui o ticket). Convenhamos, o exercício da democracia é muito importante para ter uma penalidade de 6 latinhas de cerveja. Não obstante, eleitores que declaram seu estado de pobreza ficam isentos dessa penalidade, o que levanta questões sobre a real eficácia desse sistema punitivo. Certo é, que mesmo com a sanção monetária não modifica a desconexão e desinteresse em relação às práticas eleitorais, revelando-se insuficiente para consolidar uma democracia participativa.

O Brasil, nesse sentido e ante um quadro de falta de representatividade do eleitorado poderia tirar proveito de uma transição para o voto facultativo, priorizando a qualidade da consciência eleitoral ao invés da compulsividade numérica. Ademais, é possível permitir que o poder de escolha traga eleitores motivados e engajados propiciando um processo mais representativo, onde o envolvimento é ditado pela vontade e pela identificação pessoal com os temas debatidos. Isso permitiria que o processo eleitoral refletisse verdadeiramente os interesses populares, ao invés de se restringir a uma formalidade obrigatória.

É certo que, revisar o sistema de voto obrigatório no Brasil demanda uma análise cuidadosa das disposições constitucionais pois, a Constituição Federal ressalta o sufrágio universal, secreto e direto como direitos fundamentais, mas não especifica a obrigatoriedade do voto como cláusula pétrea. Assim, reexaminar essa imposição coerente com os princípios da democracia moderna é vital.

Nesse contexto, modelo atual carece de flexibilidade, restringindo-se ao procedimento mais do que à essência do exercício de cidadania genuína, sendo possível no atual contexto, a transição para um sistema de voto facultativo alinhado aos direitos políticos fundamentais expressos nos artigos 14 e 60 da Constituição, que tratam dos direitos políticos e do processo de emenda constitucional.

Contudo, privilegiar o voto como um direito e uma forma de expressão consciente, em vez de um dever, promove um eleitorado mais comprometido, que de fato influencia as decisões políticas por desejo e convicção genuína, reforçando tanto a legitimidade do mandato eleitoral quanto a saúde democrática do país. Finalmente, tal transição, não só encorajaria um engajamento mais realista e proativo, como também permitiria que o processo eleitoral melhor refletisse os verdadeiros interesses e responsabilidades cidadãs, afastando-se do artificialismo do cumprimento meramente formal imposto por exigência legal.

Só se levantar do sofá aos domingo e "ir lá votar" não funciona mais, aliás, de umas boas décadas pra cá, afinal, em 2022, 20% dos "obrigados" se abstiveram de votar - São 31 milhões de desinteressados ou inconformados com o atual sistema político obrigatório.

Artur Ricardo Ratc

Artur Ricardo Ratc

Advogado na Ratc & Gueogjian Advogados.

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