M&A na era da reforma tributária: O que observar?
A reforma tributária redefinirá o cenário de M&As no Brasil. Valuation e due diligence exigem análise estratégica. Descubra os riscos e oportunidades nesta nova realidade.
sexta-feira, 14 de março de 2025
Atualizado às 10:34
A reforma tributária impactará de maneira significativa os negócios no Brasil. No contexto de reorganização empresarial, o M&A - Mercado de Fusões e Aquisições precisará avaliar o impacto financeiro de tais mudanças, que entrarão em vigor progressivamente a partir de 2026 até 2033. Dessa forma, qualquer aquisição de empresa deverá considerar os reflexos da reforma tributária no curto, médio e longo prazo.
Impacto por setor
Na regra atual antes da reforma, ICMS e IPI, mesmo sendo considerados não cumulativos, possuem regras específicas e restritas sobre creditamento. Para empresas do lucro presumido, PIS e Cofins são tributos cumulativos. Até mesmo as do lucro real sofrem com as limitações do conceito de insumo para fins de creditamento. Já na prestação de serviço tomada por qualquer empresa, o ISS é considerado como um custo em razão de sua não dedutibilidade. Em consequência disso, quanto maior é a cadeia econômica de um produto, maior é a sua carga tributária acumulada.
Mas com a nova sistemática, os créditos dos tributos sobre o consumo serão ampliados, reduzindo os resíduos tributários incorporados aos produtos e serviços. Certos setores serão beneficiados, enquanto outros enfrentarão maiores desafios. O setor industrial e de revenda de mercadorias, por exemplo, tendem a ser um dos mais beneficiados com a reforma, especialmente devido ao princípio da não-cumulatividade plena. As empresas poderão se creditar integralmente dos tributos incidentes na aquisição de bens e serviços, reduzindo assim a carga tributária sobre suas operações de venda. Por outro lado, empresas prestadoras de serviços poderão enfrentar um aumento da carga tributária nominal, já que terão menos créditos para compensar. Esse fator deverá ser levado em consideração em qualquer transação de M&A.
Benefícios fiscais e seus efeitos no Valuation
A reforma tributária, com base no previsto na Emenda Constitucional 132/23 e regulamentada pela LC 214/25, extinguirá gradualmente os incentivos fiscais concedidos pelos Estados.
Dessa forma, um potencial comprador deve avaliar se a lucratividade da empresa-alvo está vinculada a incentivos fiscais que serão extintos até 2033. Caso a rentabilidade esteja fortemente associada a esses benefícios, o valuation da empresa precisará ser ajustado para refletir a nova realidade tributária.
Localização das fábricas e centros de distribuição
Com a implementação do IBS e da CBS, a tributação passará a ser baseada no destino das operações, e não mais na origem. Isso levará à reestruturação das cadeias logísticas, com empresas priorizando estados que ofereçam melhor infraestrutura ou que estejam mais próximos dos mercados consumidores.
Atualmente, diversas empresas se instalam em Estados que oferecem incentivos fiscais, como distribuidoras de medicamentos situadas em Goiás ou empresas de desembaraço aduaneiro que vão para Santa Catarina. Com o fim dos benefícios tributários, a localização das empresas precisará ser reavaliada, pois custos logísticos sem vantagens fiscais podem impactar negativamente o valor de seus negócios.
Aproveitamento e uso de créditos tributários
A LC 214/25 prevê que os créditos de ICMS poderão ser compensados com o IBS (corrigidos pelo IPCA a partir de 2033), e caso não forem compensados, será possível solicitar o ressarcimento em dinheiro, mas os pagamentos serão feitos em até 240 parcelas. Assim, é essencial que um comprador avalie se a empresa-alvo possui créditos acumulados já que tal fato que poderá gerar impacto em seu caixa.
Cláusulas contratuais e ajustes de preço
Os contratos de aquisição deverão prever mecanismos para ajustar o preço da transação com base também no novo regramento trazido pela reforma tributária.
Cláusulas de earn-out deverão levar em consideração a transição tributária e seus efeitos sobre o desempenho da empresa adquirida. Além disso, revisões de preço deverão contemplar os impactos da tributação diferenciada para setores específicos.
Regimes específicos e reestruturação de suas atividades
É essencial avaliar se a empresa-alvo está sujeita a regimes especiais, se deverá pagar o IS - Imposto Seletivo ou o modelo em que está estruturado os negócios, pois as novas regras podem impactar significativamente seu valuation. Por exemplo:
- Empresas incorporadoras: O fim do RET - Regime Especial de Tributação pode afetar negativamente a rentabilidade e, consequentemente, o valuation.
- Se a empresa será submetida a tributação pelo Imposto Seletivo: tendo em vista que o mesmo será cumulativo sendo um custo a mais para as empresas.
- Empresas que prestam serviços financeiros, hotelaria, agências de turismo, dentre outras, deverão se enquadrar nos regimes tributários específicos com regras próprias que saem da regra geral do IVA Dual.
- Para os grupos empresariais que dissociaram suas atividades de revenda e de serviços, doravante, é necessário analisar se fará sentido ainda manter essa divisão.
- Com o split-payment: as empresas deverão analisar o impacto financeiro de suas condições de vendas à prazo de seus produtos em razão do descasamento entre o período de pagamento do tributo em razão do split, que nesse caso será automático, e período de recebimento pelo preço da venda de seus produtos, que em muitos casos, ocorre em 30, 60 ou por exemplo 90 dias.
Due diligence tributária no novo cenário
Com a reforma tributária, a due diligence precisará ser ainda mais detalhada, considerando alguns pontos relevantes assim considerados:
- Análise dos créditos tributários: Identificar saldos acumulados e sua possibilidade de compensação futura.
- Avaliação dos incentivos fiscais: Estudar o impacto da extinção progressiva dos benefícios até 2033.
- Revisão da estrutura de custos: Considerar o novo regime de tributação e impactos na precificação de produtos e serviços.
- Revisão de contratos e dos parceiros comerciais: Avaliar se os contratos vigentes podem ser renegociados ou adaptados para contemplar a nova sistemática tributária do IVA Dual. Como a tributação passará a ser calculada "por fora", com base no preço líquido dos produtos e serviços, será importante fazer uma revisão cláusulas de precificação e da possibilidade de repasse de custos. Empresas devem garantir que seus contratos estejam alinhados às novas regras, minimizando riscos e evitando distorções na formação de preços.
- Entender que o impacto tributário poderá ser em função de sua localização da empresa em uma cadeia econômica: Se vende seus produtos a consumidores finais, se está no meio de uma cadeia econômica, ou se vende ou compra de empresas do Simples Nacional.
A realização de uma due diligence tributária ainda mais detalhada será fundamental para mitigar riscos e garantir transações seguras no novo ambiente tributário brasileiro trazido pela reforma tributária
Considerações finais
Diante desse novo panorama, a avaliação criteriosa de todos os aspectos fiscais será determinante para a tomada de decisões estratégicas. O sucesso das operações de M&A dependerá não apenas de um planejamento tributário adequado, mas também da capacidade de antecipar os efeitos da reforma e reestruturar os negócios conforme as novas regras. E mais, será necessário avaliar os cenários durante e depois da transição, já que a alteração dos tributos atuais pelo IBS e CBS será feita progressivamente nos próximos oito anos.
Portanto, uma abordagem do impacto da reforma baseada em análises aprofundadas e uma due diligence tributária minuciosa será essencial para mitigar riscos, identificar oportunidades e garantir que a M&A ocorra da melhor forma possível.


