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Contas no exterior não comprovadas: Um novo foco de fiscalização?

Em razão da inclusão de ativos situados no exterior nas declarações de IR pré-preenchidas, entenda como saldos não comprovados podem ser tributados e gerar multas pesadas para os contribuintes.

quarta-feira, 23 de abril de 2025

Atualizado às 10:49

Uma das novidades da DIRPF - Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física de 2025 é a inclusão automática de saldos bancários de contas mantidas no exterior por pessoas físicas residentes no Brasil. Essa medida decorre de acordos internacionais de intercâmbio de informações fiscais, por meio dos quais a RFB - Receita Federal do Brasil tem passado a receber dados sobre o patrimônio mantido fora do país.

Na prática, observamos que a Receita Federal passou a incluir nas declarações os saldos bancários de contas correntes no exterior, informados com base em tais tratados de cooperação. Muitos contribuintes relataram que, ao optarem pela declaração pré-preenchida, encontraram saldos já lançados como existentes em 31/12/23. No entanto, em diversos casos, os valores apresentados não condizem com a realidade, seja por divergência cambial, seja por outros fatores.

Diante disso, é fundamental que o contribuinte revise cuidadosamente os valores informados, realize a conversão correta do câmbio e, sobretudo, esteja apto a comprovar documentalmente a origem desses recursos.

Isso porque, conforme o art. 42 da lei 9.430/1996, valores creditados em contas bancárias (inclusive no exterior) cujos titulares não consigam comprovar a origem, por meio de documentação hábil e idônea, serão considerados omissão de receita ou rendimento e, portanto, estarão sujeitos à tributação pelo imposto de renda. Ora, vejamos:

Art. 42. Caracterizam-se também como omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações.

§ 1º O valor das receitas ou dos rendimentos omitidos será considerado auferido ou recebido no mês do crédito efetuado pela instituição financeira.

§ 2º Os valores cuja origem houver sido comprovada, mas que não tenham sido computados na base de cálculo dos tributos devidos, estarão sujeitos à tributação específica prevista na legislação vigente à época em que auferidos ou recebidos.

§ 3º Para efeitos da determinação da receita omitida, os créditos serão analisados individualmente, não sendo considerados: I - os decorrentes de transferências entre contas da própria pessoa física ou jurídica; II - no caso de pessoa física, os créditos individuais de valor igual ou inferior a R$ 1.000,00, desde que o somatório no ano-calendário não ultrapasse R$ 12.000,00.

§ 4º Tratando-se de pessoa física, os rendimentos omitidos serão tributados no mês em que forem considerados recebidos, com base na tabela progressiva vigente à época do crédito.

É importante ressaltar que a lei não restringe sua aplicação a instituições financeiras localizadas no Brasil. Assim, contas mantidas em bancos no exterior também estão abrangidas pela norma, desde que o contribuinte seja residente fiscal no Brasil.

Caso o contribuinte não comprove adequadamente a origem dos valores (ou comprove apenas a origem, mas não demonstre que tais valores não decorrem de renda sujeita à tributação no Brasil), esses valores poderão ser incluídos na base de cálculo do imposto de renda como rendimento omitido.

A exceção ocorre se o contribuinte comprovar que o valor decorre de: (i) renda auferida enquanto ainda era não residente fiscal no Brasil; ou por exemplo, (ii) Valores oriundos de herança ou doação, que não constituem renda tributável pelo IR, desde que cumpridas as formalidades legais para sua caracterização.

Caso caracterizada a omissão de rendimentos, o contribuinte estará sujeito ao imposto de renda sobre os valores omitidos, com base na tabela progressiva vigente no momento do crédito, multa de ofício de 75%, podendo ser majorada para 150% se houver indícios de dolo, fraude ou simulação, e juros de mora calculados com base na taxa Selic.

Além disso, poderá haver responsabilização criminal por sonegação fiscal, conforme o art. 1º da lei 8.137/1990, caso fique comprovado que a omissão foi intencional com o objetivo de suprimir ou reduzir o pagamento do tributo.

Diante desse novo cenário de cruzamento de informações internacionais e automatização da fiscalização, tornar-se-á cada vez mais arriscado manter contas e investimentos no exterior não declarados.

Importante lembrar que existem mecanismos legais para regularização, inclusive com redução significativa de multas e exclusão de responsabilidade penal, por meio do (i) pagamento espontâneo do tributo antes do início de qualquer procedimento fiscal, o que reduz a multa para 20%; e (ii) parcelamentos e programas de regularização fiscal em vigor, por exemplo.

Por fim, contribuintes que possuem investimentos no exterior, que retornaram ao Brasil em 2024, e que passaram a ser residentes fiscais no país, têm obrigação de apresentar a declaração de ajuste anual do imposto de renda, conforme as regras aplicáveis.

A Receita Federal tem, de forma inequívoca, estreitado o cerco sobre ativos mantidos no exterior, o que exige dos contribuintes maior atenção e um melhor planejamento tributário se for o caso.

Iure Pontes Vieira

VIP Iure Pontes Vieira

Advogado. PhD em Direito pela Université Panthéon-Assas (Paris 2). Bacharel em contabilidade. Vencedor do prêmio : European Academic Tax Thesis Award, da European Commission .

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