Transparência como princípio fundamental do Direito Administrativo
A Transparência é essencial no Direito Administrativo, promovendo o controle social e eficiência pública, para além da publicidades, sendo crucial para accountability e Estado Democrático de Direito.
terça-feira, 22 de abril de 2025
Atualizado às 14:39
No cenário jurídico contemporâneo, a transparência se impõe como exigência não apenas procedimental, mas ética e democrática. No Direito Administrativo, esse princípio vai além da divulgação formal dos atos públicos, abarcando o dever do Estado de prestar contas de suas decisões e ações de maneira clara e acessível à sociedade. Com o advento das novas tecnologias e a ampliação do acesso à informação, verifica-se uma transformação profunda na dinâmica entre o poder estatal e os cidadãos, que se reconfiguram como protagonistas do controle social. Este artigo pretende oferecer uma análise detalhada desse princípio, à luz do ordenamento jurídico brasileiro, e refletir sobre seus impactos e desafios no cotidiano da administração pública.
Historicamente, a transparência no âmbito administrativo está intrinsecamente ligada à ideia de publicidade dos atos estatais, conceito que remonta às premissas do direito romano, mas que ganhou novo vigor com a consolidação dos Estados Democráticos modernos. A necessidade de tornar o poder público sujeito ao crivo da sociedade impulsionou a incorporação, ainda que de forma implícita, da transparência nos sistemas jurídicos, elevando-a a um status quase axiológico.
No contexto brasileiro, a Constituição Federal de 1988 não menciona de forma explícita o termo "transparência", mas embute seu espírito em diversos dispositivos, tais como o princípio da publicidade (art. 37), o dever de motivação dos atos administrativos. Doutrinadores têm ampliado essa perspectiva, argumentando que a transparência exige a disponibilização proativa e sistemática de informações, integrando aspectos de eficiência, moralidade e controle democrático.
Dessa forma, a transparência é vista como instrumento indispensável para a construção da confiança entre Estado e sociedade, garantindo a legitimidade dos atos administrativos. A transparência não se resume a um mero procedimento burocrático, mas se configura como elemento dinâmico que impulsiona a accountability e aproxima a ação estatal da sociedade.
A implementação prática do princípio da transparência tem sido impulsionada, sobretudo, pela Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), que obriga a administração pública a atender aos pedidos de informação de maneira célere e eficaz. Paralelamente, os avanços tecnológicos têm possibilitado a criação de portais digitais e bases de dados abertos, que facilitam o acompanhamento dos atos administrativos por parte dos cidadãos e dos órgãos de controle.
Nesse cenário, os tribunais de contas, as corregedorias e outros mecanismos de fiscalização desempenham papel crucial para assegurar não apenas a divulgação, mas também a interpretação crítica das informações. Além disso, a sociedade civil organizada emerge como agente fiscalizador ativo, utilizando ferramentas digitais e redes sociais para monitorar e discutir a atuação estatal, contribuindo para a construção de um ambiente de maior confiança e participação democrática.
Apesar dos avanços, persistem desafios significativos. Dentre eles, destaca-se a padronização dos dados divulgados, a superação da burocracia interna e a necessidade de equilibrar a transparência com a proteção de informações sensíveis, sobretudo no que tange à privacidade dos indivíduos.
O cenário tecnológico em constante evolução demanda adaptações legislativas e regulatórias, que visem não apenas à ampliação do acesso à informação, mas também à sua efetiva compreensão e utilização para o controle social. A digitalização dos serviços públicos proporciona um cenário sem precedentes de acesso à informação.
Todavia, essa mesma tecnologia pode gerar desafios, como a disseminação de dados desestruturados ou a sobrecarga informacional, que dificultam a interpretação adequada e o exercício pleno do controle social.
Neste sentido, é necessário investir em capacitação técnica para os agentes públicos e em mecanismos de filtragem e curadoria de informações, garantindo que a transparência seja realmente efetiva e acessível. Outro ponto crucial é o equilíbrio entre a necessidade de transparência dos atos administrativos e a proteção dos dados pessoais e estratégicos.
As recentes discussões em torno da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ilustram a complexidade deste desafio. A compatibilização desses dispositivos legais com o princípio da transparência demanda uma abordagem meticulosa, na qual o acesso à informação é ampliado sem comprometer a segurança e os direitos individuais dos cidadãos.
A construção de um ambiente de transparência robusto passa pela intensificação dos mecanismos de controle interno e externo, pelo aperfeiçoamento dos instrumentos de prestação de contas e pela promoção de uma cultura organizacional comprometida com a ética e a responsabilidade. A participação cidadã e o fortalecimento dos canais de comunicação entre o Estado e a sociedade são, sem dúvida, elementos essenciais para consolidação de uma governança pública verdadeiramente democrática.
A transparência, enquanto princípio fundamental do Direito Administrativo, constitui a espinha dorsal de uma administração pública digna do ideal democrático. Ao promover a divulgação clara e proativa dos atos e decisões governamentais, ela fortalece a accountability, estimula a participação cidadã e contribui para a construção de um Estado mais eficiente, ético e responsivo às demandas da sociedade.
Diante dos desafios impostos pelas transformações tecnológicas e pelas complexidades inerentes à proteção de dados, torna-se imperativo que o direito e a prática administrativa se reinventem continuamente, a fim de assegurar que a transparência permaneça no cerne do processo decisório e da prestação de contas públicas.


