Bebês reborn: Direitos, partilha e acordos na dissolução conjugal
Bebês reborn: Além de bonecos, um desafio ao Direito! Como partilhar e criar acordos de posse na dissolução conjugal?
quinta-feira, 15 de maio de 2025
Atualizado às 11:51
Bebês reborn: Um desafio jurídico e emocional na partilha de bens e acordos de posse
Introdução: O vínculo que desafia o Direito
Os bebês reborn, bonecos hiper-realistas que imitam recém-nascidos, são mais do que objetos: são espelhos das emoções humanas, carregando significados que vão além do material. Para muitos, representam afeto, cuidado ou superação de perdas, desafiando o Direito a se adaptar às complexidades da sociedade contemporânea. Quando casais se separam, esses bens podem gerar disputas movidas não pelo valor financeiro, mas pelo apego emocional. Como o ordenamento jurídico, com sua lógica objetiva, pode responder a algo tão subjetivo? Inspirando-se em pensadores como Zygmunt Bauman, que descreve a "modernidade líquida" como uma era de relações fluidas, e Hannah Arendt, que destaca a necessidade de ação adaptativa frente às singularidades humanas, este artigo explora o status dos bebês reborn como bens móveis, sua partilha em dissoluções conjugais, a possibilidade de acordos de posse e a urgência de um Direito que se molde às necessidades individuais.
1. Bebês reborn: Um fenômeno social e jurídico
Os bebês reborn, produzidos artesanalmente ou pela indústria, são bens móveis com elevado realismo, usados como objetos de coleção, ferramentas terapêuticas ou símbolos de afeto. No Brasil, o mercado de reborns é ativo, com preços entre R$ 500 e R$ 10.000, conforme observado em plataformas como Mercado Livre e Etsy. Juridicamente, enquadram-se no art. 83 do CC brasileiro (lei 10.406/02), sendo sujeitos às regras de propriedade e posse. Contudo, seu valor sentimental os distingue de outros bens móveis, como eletrodomésticos, criando desafios em dissoluções conjugais, onde a partilha pode se tornar um campo de tensões emocionais.
Zygmunt Bauman, em Modernidade Líquida (2001), argumenta que as relações humanas, incluindo aquelas com objetos, tornaram-se fluidas, desafiando estruturas rígidas. Os reborns exemplificam essa fluidez, sendo tratados como mais do que coisas por seus detentores. Da mesma forma, Hannah Arendt, em A Condição Humana (1958), enfatiza que a pluralidade humana exige respostas adaptativas, sugerindo que o Direito deve se moldar às singularidades de cada indivíduo, incluindo suas conexões afetivas com bens como os reborns.
2. Direitos reais e a partilha de bebês reborn
No Direito Civil, os direitos reais conferem poderes diretos sobre coisas, como a propriedade (art. 1.228, CC) e a posse (art. 1.196, CC). O bebê reborn, como bem móvel, integra o patrimônio do casal e é partilhado segundo o regime de bens:
- Comunhão universal: Todos os bens, incluindo reborns adquiridos antes ou durante o casamento, são divididos igualmente (art. 1.668, CC).
- Comunhão parcial: Apenas os reborns comprados onerosamente na constância do casamento entram na partilha (art. 1.658, CC).
- Separação total: Cada cônjuge mantém os bens registrados em seu nome (art. 1.687, CC).
A partilha de reborns pode ser complexa devido ao seu valor sentimental, que frequentemente supera o econômico. O Judiciário aplica critérios objetivos, como titularidade ou comprovação de aquisição, mas pode acolher acordos extrajudiciais que respeitem a vontade das partes, conforme o art. 694 do CPC (lei 13.105/15). Aqui, a filosofia de Emmanuel Levinas, em Totalidade e Infinito (1961), é pertinente: a ética do encontro com o outro exige reconhecer as necessidades alheias, sugerindo que o Direito deve facilitar acordos que considerem o apego emocional de cada cônjuge.
3. A liberdade de sentir e o respeito à individualidade
O art. 1º, inciso III, da CF/88 consagra a dignidade da pessoa humana, que inclui o respeito às escolhas individuais, como o apego a um bebê reborn. Negar esse direito seria violar a autonomia. Bauman nos lembra que, na modernidade líquida, as relações com objetos ganham significados únicos, exigindo do Direito uma postura flexível. Arendt complementa, destacando que a ação humana, moldada pela pluralidade, deve guiar as normas para atender às necessidades específicas de cada sujeito.
No contexto da dissolução conjugal, o respeito à individualidade é crucial quando se disputam bens com valor sentimental. Embora os reborns sejam bens móveis, sua relevância emocional os aproxima de casos como a guarda de animais de estimação, que, desde a lei 14.228/21, são reconhecidos como seres sencientes. Levinas reforça essa ideia, ao propor que a responsabilidade pelo outro é o fundamento da ética, sugerindo que o Direito deve priorizar soluções que respeitem os vínculos afetivos de cada parte.
4. Acordos de posse: Uma solução extrajudicial
A metáfora da "guarda" para bebês reborn reflete a busca por soluções que conciliem normas e emoções. O art. 694 do CPC incentiva a mediação e a conciliação, permitindo acordos extrajudiciais para regular a posse de reborns, que podem ser:
- Unilaterais: O bem é atribuído a um cônjuge, considerando o maior vínculo emocional ou a aquisição com recursos próprios.
- Compartilhados: As partes estipulam alternância, permitindo que ambos mantenham contato com o bem.
Esses acordos, respeitando a ordem pública e os bons costumes (art. 104, CC), podem ser formalizados em escritura pública ou homologados judicialmente. A mediação é eficaz para evitar litígios, promovendo soluções que atendam aos aspectos jurídicos e emocionais. A filosofia de John Dewey, em Democracia e Educação (1916), apoia essa abordagem: as instituições, incluindo o Direito, devem evoluir para atender às necessidades práticas da sociedade, como a resolução consensual de conflitos envolvendo bens afetivos.
5. Desafios e o futuro do Direito
A ausência de jurisprudência específica sobre bebês reborn reflete a novidade do tema. Contudo, decisões que reconhecem a guarda compartilhada de animais, com base no bem-estar emocional dos tutores, sugerem que o Judiciário pode considerar o valor sentimental de bens. O desafio é equilibrar a objetividade das normas com a subjetividade das emoções, especialmente quando o apego a um reborn supera seu valor econômico.
Bauman, Arendt, Levinas e Dewey convergem na ideia de que as instituições devem se adaptar às mudanças sociais. Para o futuro, sugerem-se:
- Capacitação de mediadores: Profissionais devem ser treinados para lidar com disputas sobre bens afetivos, reconhecendo seu impacto psicológico.
- Estudos acadêmicos: Pesquisas sobre o papel dos reborns podem embasar decisões judiciais, oferecendo dados sobre sua relevância emocional.
- Foco na mediação: Fortalecer a mediação familiar pode reduzir a judicialização, promovendo acordos que respeitem a autonomia das partes.
Conclusão: Um direito que se transforma
Os bebês reborn desafiam o Direito a se moldar às necessidades humanas, como defendem Bauman, Arendt, Levinas e Dewey. Como bens móveis, seguem as regras de partilha do CC, mas seu valor afetivo exige soluções criativas, como acordos de posse. A dignidade da pessoa humana, que inclui a liberdade de sentir, deve guiar o Judiciário e as partes na busca por justiça. O Direito de Família deve evoluir para conciliar razão e emoção, promovendo não apenas a divisão de bens, mas a preservação dos laços que dão sentido à vida. Como podemos construir um Direito que acolha o que nos torna humanos? A resposta está na flexibilidade, no diálogo e no respeito às singularidades.
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1 BRASIL. Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).
2 BRASIL. Constituição Federal de 1988.
3 BRASIL. Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015).
4 BRASIL. Lei nº 14.228, de 20 de outubro de 2021.
5 TARTUCE, Flávio. Direito de Família. São Paulo: Método, 2023.
6 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
7 ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007 [1958].
8 LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Lisboa: Edições 70, 1988 [1961].
9 DEWEY, John. Democracia e Educação. São Paulo: Ática, 2011 [1916].


