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Do privilégio dos grandes à liberdade de todos: a descentralização do mercado de energia elétrica

Abertura do mercado de energia empodera consumidores e exige atenção jurídica para garantir liberdade com segurança na escolha do fornecedor.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Atualizado em 21 de maio de 2025 11:06

Houve um tempo em que o mercado livre de energia era um clube seleto. Apenas grandes consumidores - geralmente indústrias com demanda contratada superior a 3 MW - podiam negociar sua energia diretamente com geradores ou comercializadoras. A liberdade de escolher o fornecedor era um privilégio restrito a poucos, enquanto a imensa maioria dos consumidores permanecia no ambiente cativo, com tarifas reguladas e pouca margem de escolha.

Esse cenário começou a mudar com a portaria 50/22 do MME - Ministério de Minas e Energia. A norma estabeleceu uma trajetória de liberalização gradual, reduzindo as exigências de demanda para acesso ao mercado livre. A chamada "escada da liberdade" começou com consumidores com carga contratada superior a 1 MW, passou pelos de 0,5 MW, e culminou, a partir de 1º de janeiro de 2024, com a liberação total de todos os consumidores do Grupo A (alta tensão) - independentemente de sua demanda contratada.

Vale destacar que essa liberação final não se refere mais à quantidade de energia contratada (medida em kW), mas sim ao nível de tensão da conexão: todos os consumidores conectados em alta tensão, ou seja, com fornecimento igual ou superior a 2,3 kV, passaram a poder migrar para o mercado livre.

Com essa abertura final, mesmo pequenos estabelecimentos comerciais e industriais ligados em alta tensão puderam migrar para o mercado livre, contando com a figura do comercializador varejista para viabilizar essa transição com menos burocracia.

Mas o processo de descentralização não para por aí.

A GD - Geração Distribuída também se consolidou como um vetor decisivo nessa transformação. Desde a regulamentação inicial em 2012 até os marcos mais recentes - como a promulgação da lei 14.300/22 -, o modelo permitiu que consumidores passassem a gerar sua própria energia, especialmente a partir de fontes renováveis como a solar fotovoltaica. Com isso, milhões de unidades consumidoras passaram a produzir e consumir energia localmente, injetando excedentes na rede em troca de créditos, e criando um novo paradigma de protagonismo do consumidor no setor elétrico.

Essa dinâmica não apenas desconcentrou a matriz elétrica, como também desafiou a lógica tradicional de suprimento unidirecional. Hoje, consumidores residenciais, comerciais e rurais exercem papel ativo, atuando como "prosumidores" - ao mesmo tempo produtores e consumidores de energia. A GD se mostrou, portanto, uma antecessora natural da abertura do mercado, antecipando no plano físico o movimento que, agora, se consolida no plano contratual com a liberalização do mercado livre.

Às vésperas de uma esperada reforma setorial, o setor elétrico se prepara para o último passo rumo à liberdade plena: a abertura do mercado também para os consumidores em baixa tensão, hoje completamente cativos. A expectativa é que, entre 2027 e 2028, consumidores comerciais e industriais de pequeno porte em baixa tensão passem a poder escolher seu fornecedor. E, até 2028, o movimento deve alcançar até mesmo o consumidor residencial.

Essa virada de chave tem o potencial de alterar de forma profunda a relação dos brasileiros com a energia elétrica. Mais do que uma questão técnica, trata-se de empoderar o consumidor, oferecendo liberdade de escolha, condições personalizadas e, em muitos casos, redução de custos.

Mas surge então a pergunta inevitável: Você está preparado para essa mudança?

Migrar para o mercado livre exige atenção a contratos, condições comerciais, riscos e obrigações. O consumidor ganha liberdade, mas também assume responsabilidades.

Nesse novo contexto, o apoio de advogados com conhecimento específico em regulação do setor elétrico passa a ser um diferencial importante. Ao analisar contratos de energia (PPAs - Power Purchase Agreements) e intermediar negociações com comercializadoras, esse profissional contribui para reduzir assimetrias de informação, proteger os interesses dos consumidores e garantir que a liberdade contratual venha acompanhada de segurança jurídica.

Daniel Steffens

Daniel Steffens

Sócio da Área de Energia e Infraestrutura no Urbano Vitalino Advogados. Tem experiência consolidada de 20 (vinte) anos na área jurídico - regulatória voltada para o Setor Elétrico. É pós-graduado em Business Law e em Direito Regulatório de Energia na FGV e Secretário Geral da Comissão de Direito de Energia da OAB/SP.

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