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Tutela provisória no agravo de instrumento e a súmula 735/STF

Este texto pretende discutir a tutela provisória no agravo de instrumento e a interposição de recurso ao STF ou STJ, considerando o teor da Súmula 735/STF.

segunda-feira, 9 de junho de 2025

Atualizado às 14:58

Como é fato, para a concessão da tutela provisória de urgência é necessária a demonstração dos requisitos legais. De acordo com o caput do art. 300, do CPC/15, os positivos são: a) probabilidade do direito; b) perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Já o requisito negativo, especificamente para a tutela de urgência antecipada, está previsto no §3º, do art. 300, do CPC/15, a saber: perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Outrossim, a tutela provisória de urgência pode ser concedida de forma liminar (inaudita altera parte), após justificação prévia (art. 300, §2º, do CPC/15), ou em qualquer outra etapa durante o andamento do feito. A rigor, inexiste preclusão em relação ao momento de concessão da tutela provisória incidental.

Uma coisa é certa: nos casos de deferimento (ou indeferimento) da tutela de urgência no curso do processo, o interessado deve interpor Agravo de Instrumento (art. 1015, I, do CPC/15). Ao analisar o recurso, o Relator adotará uma das seguintes providências, considerando o poder geral de tutela provisória e desde que estejam presentes os requisitos de admissibilidade recursal (art. 1019, do CPC/15), a saber: a) concessão de efeito suspensivo; b) antecipação da pretensão recursal; c) apreciação monocrática para negar provimento (art. 932, IV, do CPC/15) ou, após o contraditório, para dar provimento ao apelo (art. 932, V, do CPC1/5).

É necessário destacar, o que diferencia o procedimento em caso de tutela provisória concedida na sentença, é que ocorrendo a apreciação da medida no curso do processo, o requerimento pautado no poder geral de tutela provisória (efeito suspensivo ou mesmo da antecipação da pretensão recursal - tutela de urgência recursal), deve ser formulado no próprio recurso (art. 1019, I, do CPC/15). Por outro lado, se a concessão da medida for um capítulo da sentença, o requerimento deve ser deve ser formulado nos termos do art. 1012, §3º, do CPC/15.

Portanto, estas são as variáveis do dia a dia forense: a) tutela provisória concedida no curso do processo - com impugnação, e requerimento de tutela provisória recursal, por agravo de instrumento (art. 1.019, I, do CPC); b) tutela provisória concedida (confirmada ou mesmo revogada) na sentença - irresignação em requerimento autônomo (tutela provisória recursal incidental ao recurso de apelação - arts. 1.012, V e §§3º e 4º, do CPC/15).

Na primeira situação, após o acórdão que aprecia o agravo de instrumento, é possível a interposição de RESp ou RE? Quanto ao ponto, inexistindo mais o Recurso retido nos autos, ao contrário do sistema processual anterior, entendo que não há óbice legal para a interposição de recurso ao STJ e ou STF, transferindo ao Tribunal Superior, diante de seu próprio poder geral de tutela provisória, a análise dos fundamentos para a sua eventual concessão, desde que atendidos os requisitos de admissibilidade específicos destes recursos, dentre os quais o prequestionamento, a violação à lei federal ou à CF/88, exaurimento de instância, repercussão geral, etc.

Contudo, não é este o entendimento previsto no enunciado 735/STF. A pergunta é: qual o motivo dessa vedação? Uma pesquisa nos sítios dos dois Tribunais Superiores é suficiente para encontrar vários precedentes, inclusive após a vigência do CPC/15, mantendo a vedação prevista no Enunciado em comento. Vale citar algumas passagens oriundas de julgados do STJ:

"3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que decisões proferidas em sede de tutela antecipada não configuram causa decidida, inviabilizando o conhecimento de recurso especial, conforme estabelecido na súmula 735 do STF". AgInt no REsp 1626589 / MG - Rel. Min. Daniela Teixeira - 3ª T/STJ - J. 28/04/2025 - DJEN 05/05/2025.

"O entendimento vigente nesta Corte é de que as decisões que concedem ou indeferem liminares ainda são passíveis de alteração no curso do processo principal, não podendo, por isso, ser consideradas de única ou última instância a ensejar a interposição dos recursos constitucionais. Isto posto, aplica-se, por analogia, o óbice da Súmula n. 735 do STF, no sentido de que, via de regra, "não é cabível recurso especial para reexaminar decisão que defere ou indefere liminar ou antecipação de tutela". Nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.972.132/SP, relator Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 31/3/2022". AREsp 2829485 / SP - Rel. Min. Francisco Falcão -2ª T/STJ - J. 09/04/2025 - DJEN 14/04/2025.

O STF também vem ratificando o enunciado 735/STF, inclusive após o início de vigência do CPC/15:

"AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MEDIDA LIMINAR OU TUTELA ANTECIPADA: ATO DECISÓRIO NÃO DEFINITIVO. SÚMULA 735 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1. Compete ao Supremo Tribunal Federal julgar, mediante recurso extraordinário, somente as causas decididas em ÚNICA ou ÚLTIMA INSTÂNCIA, diversamente do que ocorre na presente hipótese, em que há possibilidade de a decisão impugnada sofrer alterações durante o processo principal. Aplicação da Súmula 735/STF. 2. Agravo interno a que se nega provimento" (ARE 1178719 AgR / SP -1ª T - Relator Min. Alexandre de Moraes - J. em 29/03/2019 - Dje DIVULG 04-04-2019 PUBLIC 05-04-2019).

Como se pode observar, a justificativa para a vedação de recurso ao Tribunal Superior, neste caso concreto, seria de natureza constitucional, tendo em vista a expressão causa decidida indicar que a tutela provisória não teria por objeto a análise do mérito da demanda e que poderia sofrer modificação durante a tramitação processual. Contudo, parece-me que este entendimento deve ser revisto, tendo em vista que não há mais o recurso retido e, portanto, após o acórdão local que aprecia o agravo de instrumento, não há razão para a vedação de controle de acesso ao STJ ou STF.

Ademais, a tutela provisória pode ser concedida de forma liminar ou durante o andamento do processo, como capítulo da sentença ou mesmo em sede de recurso de apelação sendo situações não previstas na literalidade da previsão contida no Enunciado em questão.

De outro prisma e a título de recordação, no sistema processual anterior, o recurso contra o acórdão do Tribunal local que apreciava o agravo de instrumento contra tutela antecipada ou cautelar ficava retido nos autos, sendo utilizada a medida cautelar como instrumento de retirada do regime de retenção. Portanto, como no CPC/15 não há previsão para o regime de retenção, torna-se razoável afirmar que deve ser revista ou mesmo cancelado este enunciado - permitindo, em última análise, que o Tribunal Superior exerça o controle dos termos do acórdão local que apreciou a tutela provisória.

Em suma: o Poder Geral de Tutela provisória recursal (art. 932, II, do CPC/15) também deve ser garantido aos Ministros Relatores, no STJ e STF, nas ações originárias e também nos recursos de sua competência.

Mais um argumento é a previsão da tutela provisória incidental aos recursos especial e extraordinário (art. 1.029, §5º, do CPC), instituto que também deve ser consagrado nos casos de acórdãos locais que, por exemplo, nega provimento ao Agravo de Instrumento interposto contra tutela provisória de urgência concedida em 1º grau.

Não há qualquer restrição legal quanto ao cabimento da tutela provisória apenas como medida auxiliar de REsp ou RE interposto contra decisão final. O Poder Geral de Tutela Provisória recursal gera a superação do entendimento previsto na súmula 735/STF, portanto.

José Henrique Mouta

VIP José Henrique Mouta

Mestre e Doutor (UFPA), com estágio em pós-doutoramento pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Professor do IDP (DF) e Cesupa (PA). Procurador do Estado do Pará e advogado.

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