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IOF em foco: Recuo político e recalibragem com a MP 1.303/25

A MP 1.303/25 e o decreto 12.499/25 redesenham a tributação de ativos financeiros, com fim de isenções, nova alíquota de IRRF e impactos para investidores e instituições.

domingo, 29 de junho de 2025

Atualizado em 27 de junho de 2025 14:19

No último dia 11, o poder executivo Federal publicou a MP 1.303/25 que "Dispõe sobre a tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais", além do decreto 12.499/25, que alterou algumas disposições do IOF. De forma mais detalhada, as medidas tratam de (i) aplicações financeiras, (ii) ganhos líquidos em bolsa, (iii) ativos virtuais, (iv) empréstimos de títulos e valores mobiliários, (v) fundos de investimento, (vi) títulos incentivados e (vii) investidores não residentes.

Ainda, a MP 1.303/25 também altera regras de tributação aplicáveis às pessoas jurídicas, incluindo o aumento das alíquotas (i) da CSLL - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido para determinadas instituições financeiras e demais entidades reguladas e supervisionadas pelo Banco Central do Brasil e (ii) do IRRF - Imposto de Renda Retido na Fonte incidente sobre a distribuição de JCP - juros sobre o capital próprio, (iv) bem como modifica as regras de compensação de tributos administrados pela Receita Federal do Brasil.

A despeito das modificações formais trazidas, que apresentamos de forma resumida e estruturada em uma tabela ao final desse texto, vale retomar um pouco das movimentações recentes e analisar essas modificações em conjunto com a MP para entender o contexto de compensação de arrecadações no qual ela está inserida.

1. Introdução: IOF, mudança de rota e nova estratégia de arrecadação

A proposta inicial de aumento do IOF, anunciada por meio de decretos com vigência imediata, gerou forte reação dos mercados. Um dos pontos mais sensíveis dizia respeito à elevação da alíquota sobre aplicações de fundos nacionais no exterior. Horas após o anúncio, o governo recuou parcialmente, revogando esse aumento específico - medida que, segundo estimativas, reduziria o potencial arrecadatório em cerca de R$ 1,4 bilhão.

Esse movimento de recuo parcial sinalizou uma mudança de estratégia. Em vez de insistir em aumentos lineares de IOF, o governo passou a trabalhar com ajustes seletivos e compensações por meio de outros tributos. Essa reorientação materializou-se na MP 1.303/25 e no decreto 12.499, publicados em 11/6/25, e que propõem uma recalibragem das medidas anteriores e novas fontes alternativas de arrecadação.

As disposições normativas vêm para reequilibrar a carga fiscal e introduzir ajustes mais palatáveis do ponto de vista político e econômico.

Entre as medidas de recalibragem do IOF e compensação fiscal propostas, destacam-se:

  • Redução do IOF Crédito para empresas;
  • Redução de 80% na alíquota para operações de risco sacado;
  • Redução do IOF sobre o seguro de vida com prêmio por sobrevivência (VGBL);
  • Cobrança de alíquota mínima sobre FIDC - Fundos de Investimento em Direitos Creditórios;
  • Isenção de IOF no retorno de investimentos estrangeiros diretos no país, nos moldes já aplicáveis ao mercado de capitais;

Propostas para compensar a perda de potencial arrecadação

Com a opção por não seguir com os aumentos de IOF inicialmente previstos, o governo propôs medidas para compensar a potencial perda de arrecadação decorrente das mudanças nos decretos. Dentre as principais propostas, destacam-se:

  1. Tributação de criptoativos auferidos por residentes ou domiciliados no exterior (nos termos do art. 36 da MP 1.303/25);
  2. Aumento da tributação de apostas eletrônicas (bets), agora quase no mesmo patamar de aplicações financeiras;
  3. Padronização e tributação uniforme de instrumentos do sistema financeiro;
  4. Fim da isenção para diversos títulos e valores mobiliários incentivados;
  5. Regras mais rígidas para compensação de créditos tributários e compensação de perdas no mercado financeiro;
  6. Reestruturação das alíquotas da CSLL para instituições financeiras;
  7. Unificação em 17,5% da alíquota de IR sobre aplicações financeiras;
  8. Aumento da alíquota do IR sobre JCP - juros sobre capital próprio de 15% para 20%;
  9. Harmonização das regras de hedge no exterior às aplicadas em bolsa;
  10. Atualização legal das regras sobre aluguel de ações.

Em síntese, a MP 1.303/25 representa uma estratégia de substituição de receitas, com menor desgaste político, buscando preservar arrecadação sem comprometer setores estratégicos.

2. Destaques de principais medidas e impactos

a) Redução do IOF Crédito para empresas

O decreto 12.499 prevê a redução do IOF incidente sobre operações de crédito contratadas por pessoas jurídicas. A alíquota fixa do IOF foi reduzida de 0,95% para 0,38%, diminuindo o custo de capital para empresas e buscando estimular o ambiente de negócios e investimentos. A mudança tem efeito direto no custo das operações financeiras de capital de giro, investimentos e reestruturação de passivos empresariais.

b) Redução do IOF sobre operações de risco sacado

O decreto 12.499 extingue a alíquota fixa de 0,95% anteriormente cobrada sobre operações de risco sacado, mantendo apenas a cobrança da alíquota diária de 0,0082%. Essa operação ocorre quando uma empresa solicita a um banco que antecipe o pagamento de obrigações assumidas com fornecedores, com a quitação posterior à instituição financeira. A medida busca facilitar o acesso ao capital de giro e reduzir o custo financeiro dessas transações, especialmente em cadeias produtivas que dependem de liquidez imediata.

c) Redução e reestruturação do IOF sobre seguros de vida empresarial (VGBL)

O decreto 12.499 reestabelece a alíquota zero do IOF para os seguros de vida em grupo (empresariais), desde que o VGBL seja utilizado exclusivamente como instrumento previdenciário ou de proteção a empregados e sócios. Além disso, o limite de incidência foi alterado de R$ 50 mil mensais para R$ 300 mil até o final do ano, e R$ 600 mil anuais a partir de 2026, o que reduz o impacto para a cerca de 99% dos investidores.

d) Mudanças na CSLL para instituições financeiras

A MP 1.303/25 altera a CSLL - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido para fintechs e instituições de pagamento. Até então, essas entidades podiam recolher a contribuição à alíquota de 9%, 15% e 20%. A partir da nova norma, essa alíquota mínima é extinta, e todas passam a contribuir com 15% ou 20% - mesmo patamar das instituições de médio porte. A medida entra em vigor quatro meses após a publicação da MP e busca corrigir distorções no tratamento tributário entre fintechs e bancos tradicionais, que continuam sujeitos à alíquota de 20%.

e) Fim da isenção de IR para títulos incentivados: Nova alíquota de 5%

A MP 1.303/25 cria a incidência de IRRF à alíquota fixa de 5% sobre diversos títulos e valores mobiliários que, até então, eram isentos:

  • LCI e CRI (crédito imobiliário);
  • LCA, CRA, CDCA e CPR com liquidação financeira (crédito agropecuário);
  • LIG e LCD (letras do desenvolvimento e garantidas);
  • Debêntures incentivadas para projetos de infraestrutura.

A alíquota incide sobre os rendimentos auferidos, independentemente do prazo da aplicação. Embora inferior à tributação usual da renda fixa (15% a 22,5%), representa perda de atratividade para investidores e impacto no custo de captação para emissores.

f) Incidência de IRRF sobre aplicações financeiras e criptoativos

A MP 1.303/25 amplia significativamente o escopo de incidência do IRRF ao prever, em seu art. 36, a tributação dos rendimentos de aplicações financeiras e ativos virtuais auferidos no país, tanto por residentes quanto por não residentes:

  • Os rendimentos obtidos ficam sujeitos ao IRRF conforme as alíquotas aplicáveis às pessoas físicas residentes no Brasil;
  • O imposto será definitivo, não admitindo qualquer forma de compensação de perdas ou deduções com outros rendimentos;
  • Para os investidores domiciliados em jurisdições de tributação favorecida, aplica-se uma alíquota majorada de 25%;
  • Especificamente para pessoas físicas, pessoas jurídicas isentas e optantes pelo Simples Nacional, os rendimentos com ativos virtuais (incluindo criptoativos e criptomoedas) passam a ser tributados à alíquota de 17,5%;

A nova sistemática afeta especialmente investidores e empresas que operam com estruturas digitais descentralizadas, exigindo atenção à classificação dos ativos, à identificação da jurisdição do beneficiário e ao cumprimento de obrigações acessórias específicas. A Receita Federal ainda deverá editar normas complementares para disciplinar esses aspectos.

g) Reforço na tributação sobre apostas eletrônicas (bets)

A MP 1.303/25 reforça a tributação das apostas eletrônicas sob dois aspectos principais:

1. Imposto sobre os prêmios pagos:

  • Prêmios individuais acima de R$ 2.000 pagos por plataformas de apostas ficam sujeitos ao IRRF, com alíquotas escalonadas conforme o valor e o tipo de aposta;
  • Não será permitida a compensação com perdas de outras apostas.

2. Aumento da carga tributária sobre a receita das plataformas:

  • A alíquota incidente sobre a receita líquida das bets (apostas esportivas) sobe de 12% para 18%;
  • Do total arrecadado, 6% serão destinados a ações na área da saúde;
  • Essa medida entra em vigor quatro meses após a publicação da MP.

Cabe ressaltar aqui essa alíquota não interfere na tributação de renda IRPJ do regime propriamente adotado pela plataforma enquanto empresa.

h) Unificação da alíquota do IR sobre aplicações financeiras: 17,5%

A MP 1.303/25 também propõe uma importante mudança na sistemática de tributação dos rendimentos obtidos com aplicações financeiras. Atualmente, o imposto de renda incidente sobre esses rendimentos varia de acordo com o tipo de aplicação e o prazo de permanência dos recursos.

A nova proposta é unificar essas diferentes faixas em uma alíquota única de 17,5%, aplicável a todas as modalidades de aplicação financeira, com exceção das regras específicas para investidores estrangeiros, criptoativos e instrumentos incentivados já mencionados. Ademais o movimento de padronização pareça simplificador, ele retira incentivos dos fundos nacionais a manter aplicações de longo prazo. A nova alíquota entra em vigor a partir de janeiro de 2026.

3. Conclusão: Mudança de estratégia e necessidade de planejamento

A MP 1.303/25 introduz uma nova rodada de medidas fiscais que reconfiguram o ambiente de captação e investimentos no Brasil. Após o recuo parcial no aumento do IOF, a MP foi apresentada como uma estratégia de compensação, com foco em elevar a arrecadação por meio de novos instrumentos.

As medidas adotadas concentram-se no aumento do IRRF sobre aplicações financeiras e criptoativos, no fim da isenção para títulos incentivados, na reestruturação da CSLL para fintechs e na ampliação da carga tributária sobre plataformas de apostas, entre outras providências. Também propõem a unificação da alíquota do IR sobre investimentos a partir de 2026, o que exigirá ajustes operacionais por parte de instituições e investidores.

Em suma, as mudanças trazidas pela MP 1.303/25 e pelo decreto 12.499 não representam apenas uma recalibragem técnica, mas sim uma nova lógica de arrecadação. Setores afetados devem se alinhar com urgência às novas exigências e reavaliar estratégias de médio e longo prazo para garantir competitividade, segurança jurídica e conformidade fiscal.

Tabela comparativa com as mudanças trazidas

Categoria

Como era antes

Como fica com a MP/decreto

LCI, LCA, CRI, CRA, LCD, LIG, debêntures infra

Isentas de IR para pessoas físicas

Passam a pagar IRRF de 5% sobre rendimentos (novas emissões a partir de 01/01/2026)

CDB, RDB, debêntures, títulos públicos e privados, swaps etc.

IR regressivo de 22,5% a 15%

IRRF fixo de 17,5%

Ações, opções, futuros e swaps listados (engloba Day Trade)

IR de 15% + isenção até R$ 20 mil/mês (vendas à vista)

IRRF fixo de 17,5% para ganhos. Isenção para vendas < R$ 60 mil/trimestre mantida

Aluguel de ações (BTC)

IR de 15% (com base em entendimento da RFB)

IRRF de 17,5% direto pela clearing; tomador recebe líquido

FIDC, FIA, FIM, ETFs de crédito/renda fixa

IR conforme regras gerais da renda fixa (regressiva)

IRRF fixo de 17,5%

FIIs e FIAGRO

IR de 20% em alguns casos; dúvidas sobre bitributação

Distribuição com IRRF de 17,5%, podendo cair para 5% se for listado, houver 100 cotistas e não tiver PF =10%. Na venda de cotas, ganho a 17,5%.

FIP-IE, FIP-PD&I e FIP-Infra

Isentos de IR

IRRF 5%; para PF, cotas emitidas até 31/12/25 preservam 0%.

Juros sobre Capital Próprio (JCP)

IR de 15%

IR de 20%

Criptoativos e tokens

Isenção em muitos casos; IR apenas no resgate

IRRF de 17,5% inclusive para residentes; 25% para paraísos fiscais

Compensação de perdas financeiras

Restrita à renda variável

Permitida em todas as operações, válida por até 5 anos

CSLL de fintechs

Alíquota de 9%, 15% ou 20%

Fim da alíquota de 9%; passa a ser 15% ou 20%

Apostas eletrônicas (bets) - receita bruta

Taxa de 12%

Taxa de 18%;

IOF - crédito PJ

0,95% + diária de 0,0082%

0,38% + 0,0082% ao dia (unificado)

IOF - risco sacado

0,95% fixo + 0,0082% ao dia

Apenas 0,0082% ao dia

IOF - VGBL

5% para aportes > R$ 50 mil/mês

Piso passa a ser R$ 300 mil até o final de 2025; R$ 600 mil/ano a partir de 2026. Taxa de 5% considera o excedente

IOF - FIDC (cotas primárias)

Não havia incidência

0,38% sobre aquisição primária, inclusive por bancos

Lucas F. G. Bento

Lucas F. G. Bento

Sócio das áreas de Societário e Mercado de Capitais do TN Advogados. Advogado e estudante de Finanças e Negócios pela USP, com passagens pela University of Illinois e University of Chicago, ambas nos EUA.

Vitor Nogueira Dextro

Vitor Nogueira Dextro

Advogado especialista em Direito Tributário em Thielmann Advogados, pós-graduado pela Fundação Getulio Vargas

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