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Saúde ocupacional e NR-01: Um enfoque integrativo do cuidado

O artigo integra teorias e políticas como a NR-01 para refletir sobre o cuidado ao cuidador, defendendo ambientes éticos, sustentáveis e humanizados como base do bem-estar e da vida coletiva.

quarta-feira, 2 de julho de 2025

Atualizado às 14:28

1. Introdução: O porquê do cuidado de quem cuida

A célebre frase de Viktor Frankl, em consonância com Nietzsche, "quem tem um porquê enfrenta qualquer como", orienta a reflexão civilizatória que aqui propomos: cuidar de quem cuida transcende a lógica de um tema periférico ou setorial; trata-se de uma necessidade ética, política e existencial fundamental para a sustentação da vida coletiva.

No centro dessa reflexão está a figura do cuidador, compreendido para além de categorias profissionais, mas como uma função social, relacional e profundamente humana. Cuidadores, sob uma ótica macropolítica e integral, são todos aqueles que sustentam a vida alheia - física, emocional, espiritual ou organizacional - por meio de vínculos de responsabilidade, afeto, liderança ou proteção. Essa definição abrange desde os profissionais de saúde (médicos, cirurgiões, médicos veterinários, equipes de enfermagem, oncologistas, socorristas), até os cuidadores informais, como mães e pais solo, tutores de pets, avós, cuidadores de idosos, babás, padrastos ou madrastas, e profissionais em funções de liderança e cuidado simbólico, como educadores, líderes religiosos e líderes organizacionais.

Trata-se, portanto, de uma condição transversal a diversos setores e realidades, muitas vezes invisibilizada pelo seu caráter de entrega constante. Esses cuidadores enfrentam um paradoxo central: o compromisso intenso com o bem-estar do outro, que, se não for sustentado por estruturas adequadas de reconhecimento, apoio e cuidado recíproco, ameaça sua própria saúde física, emocional e moral. Essa sobrecarga, crônica e mal endereçada, repercute diretamente em esferas macroestruturais: evidencia-se no colapso progressivo do SUS, no esgotamento dos planos de saúde suplementares, no aumento de afastamentos por adoecimento psíquico na Previdência Social e nas taxas crescentes de absenteísmo e presenteísmo no setor corporativo - indicadores alarmantes de um sistema que adoece silenciosamente aqueles que o sustentam.

Este artigo oferece uma análise integrativa, que articula perspectivas psicológicas, filosóficas, sociológicas e espirituais, em diálogo com normas e políticas públicas contemporâneas - especialmente a NR-01 -, a fim de construir um arcabouço robusto que apoie a promoção do cuidado humanizado e sustentável. O estudo concentra-se, de forma específica, nos cuidadores inseridos no contexto laboral, com ênfase na saúde ocupacional e na saúde mental - temas críticos e centrais dentro das exigências da NR-01. Parte-se do entendimento de que o cuidado começa, necessariamente, com quem cuida.

2. O paradoxo da sobrecarga do cuidador: Síndrome, normalização e invisibilidade

A sobrecarga do cuidador manifesta-se em exaustão emocional, esgotamento físico e deterioração da qualidade de vida, condição amplamente reconhecida como "síndrome do cuidador". O paradoxo reside no fato de que o cuidador, ao priorizar o cuidado do outro, negligencia suas próprias necessidades essenciais, impactando sua motivação e resiliência. A hierarquia das necessidades de Maslow (1943) ajuda a iluminar esse processo: a não satisfação das necessidades fisiológicas e psicológicas básicas compromete o acesso a níveis superiores de equilíbrio emocional, autorrealização e sentido.

No entanto, a sobrecarga também é resultado da normalização institucional e cultural da opressão subjetiva, conceito alinhado à "normose" descrita por Pierre Weil (2014) - a adaptação a práticas sociais que, embora aceitas, causam adoecimento. Cuidadores são frequentemente invisibilizados em seu sofrimento, e seu trabalho reduzido a um dever unilateral, que desconsidera reciprocidade e reconhecimento legítimo. Isso gera um ciclo vicioso de desgaste, perpetuando a síndrome e limitando políticas públicas e organizacionais que promovam suporte efetivo.

3. Bases teóricas e modelos integrativos para o cuidado sustentável

3.1 Cuidado mútuo e teoria dos jogos

Campos (2021) enfatiza que, no ambiente de trabalho, o cuidado não deve ser unilateral, mas compartilhado, criando uma rede de suporte interno. A teoria dos jogos de Nash (1950) esclarece que estratégias cooperativas, baseadas em equilíbrio e reciprocidade, propiciam benefícios mútuos sustentáveis, rompendo com modelos individualistas que podem aprofundar a exaustão e o isolamento.

3.2 Psicologia positiva, resiliência e o modelo PERMA

A resiliência emerge como uma resposta ativa à sobrecarga, promovida por práticas sustentadas de psicologia positiva. A teoria do desamparo aprendido de Martin Seligman (1967; 2022) demonstra que o otimismo realista e a busca ativa por estratégias de enfrentamento fortalecem o cuidador, prevenindo passividade e burnout. Seu modelo PERMA - Positive Emotion, Engagement, Relationships, Meaning, Accomplishment oferece uma estrutura prática para cultivar o bem-estar subjetivo e fortalecer a resiliência em contextos desafiadores.

3.3 Experiências autotélicas e a teoria do Flow

Csikszentmihalyi (2020) aponta que experiências de flow - estados em que o indivíduo está totalmente imerso e motivado intrinsecamente - funcionam como mecanismos poderosos de autorregulação emocional. Para cuidadores, que lidam com o sofrimento alheio, esses momentos atuam como renovadores psíquicos e fontes de prazer e significado, essenciais para sustentar práticas compassivas.

4. Dimensões éticas, espirituais e filosóficas do cuidado integral

4.1 Reconhecimento mútuo e dignidade relacional

Axel Honneth (1995) propõe que o reconhecimento autêntico é fundamental para a construção da identidade e da dignidade do cuidador. Essa ética relacional se opõe à cultura do sacrifício silencioso e da invisibilidade, propondo a construção de ambientes que validem o ser e o fazer do cuidador, fortalecendo sua autoestima e resiliência.

4.2 A evolução da consciência e alinhamento de valores

Richard Barrett (1998) apresenta um modelo de desenvolvimento da consciência humana e organizacional que perpassa níveis desde necessidades básicas até transcendência e serviço. O alinhamento dos valores pessoais do cuidador com os valores organizacionais é um vetor decisivo para o florescimento interior e a sustentabilidade do cuidado.

Ken Wilber (2001), por sua vez, amplia a abordagem para uma visão integral, considerando dimensões internas e externas, individuais e coletivas, destacando que o cuidado do cuidador deve ser holístico, envolvendo intervenções múltiplas e integradas.

4.3 Espiritualidade laica e sentido existencial

Autores como Leloup (2012), Weil (2014) e Crema (2019) ressaltam a importância da espiritualidade - entendida de forma não confessional - como fonte de sustento vital e reconstrução do sentido para o cuidador. O cultivo de práticas de silêncio, autocuidado, contemplação e reconexão interna é vital para restaurar a energia e evitar a perda de si mesmo.

5. Impactos organizacionais e políticas públicas

5.1 NR-01 e a saúde integral no trabalho

A NR-01 estabelece diretrizes para a gestão da segurança e saúde no trabalho, demandando que organizações desenvolvam políticas que garantam suporte físico, emocional e social ao trabalhador. No contexto dos cuidadores, isso significa investir em ambientes que promovam equilíbrio, salários justos, reconhecimento e apoio, minimizando riscos psicossociais e burnout.

5.2 Exemplos práticos de suporte e sustentabilidade

Vale destacar alguns exemplos concretos e sustentáveis de suporte ao cuidador, que demonstram caminhos efetivos para promover o equilíbrio e a resiliência nas diferentes realidades do cuidado:

i. Clínica veterinária com escalas justas e apoio psicológico

Em uma clínica de grande movimento, os médicos veterinários viviam sob forte pressão emocional e física. Com a implantação de escalas de plantão justas, remuneração equilibrada, rodízio de tarefas e um programa contínuo de apoio psicológico, a equipe sentiu uma mudança real: o ambiente tornou-se mais cooperativo, o desgaste diminuiu e a qualidade do cuidado aumentou - inclusive entre os próprios cuidadores.

ii. Equipes de emergência e espaços para resiliência

Nas urgências, onde a exaustão é regra, um hospital criou grupos de apoio emocional e coaching interno. Com sessões regulares de mentoring, cursos de fortalecimento da resiliência e espaços físicos dedicados à descompressão emocional, os profissionais passaram a lidar melhor com o estresse diário e demonstraram maior engajamento e saúde mental no médio prazo.

iii. Redes de apoio para mães solo

Diante da invisibilidade estrutural, surgiram iniciativas comunitárias e corporativas que ofereceram suporte às mães solo: auxílio financeiro proporcional à jornada de cuidado, atendimento psicológico contínuo e, sobretudo, flexibilidade nas condições de trabalho. Esses pilares permitiram uma conciliação mais humana entre vida pessoal e responsabilidade com o outro.

iv. Oncologia e a cultura do cuidado compartilhado

Em um hospital oncológico de referência, o médico chefe propôs uma iniciativa inovadora: convocar os familiares da equipe de enfermagem e assistência para rodas de conversa sobre saúde mental, carga emocional e a importância do reconhecimento mútuo. O projeto despertou nos lares a consciência de que o cuidado se estende para além do hospital, gerando empatia e colaboração familiar como parte da sustentabilidade do sistema de cuidado.

Esses exemplos revelam que, quando as organizações e comunidades investem em estratégias com ações simples que colocam o cuidador no centro do cuidado, o impacto transcende o indivíduo. A criação de ambientes justos, acolhedores e resilientes fortalece a saúde física e emocional dos cuidadores, bem como a qualidade do cuidado prestado. Assim, práticas sustentáveis de suporte quando bem estruturadas e ancoradas na escuta ativa, produzem mudanças significativas e se mostram fundamentais para transformar desafios em oportunidades de crescimento, promovendo uma cultura de cuidado mútuo que beneficia toda a coletividade.

Em suma, a partir da decisão de colocar o cuidador no centro da estratégia e estruturação de ações práticas, cria-se um ecossistema de bem-estar que beneficia quem cuida e toda a rede interligada ao seu redor.

6. Cultivando culturas organizacionais humanizadas

6.1 Práticas de presencing e escuta profunda

Otto Scharmer (2019) propõe a Teoria U, que promove o "presencing" - junção do estado de presença consciente com o profundo sentir que permite ao cuidador reconectar-se com seu propósito, transformando respostas automáticas em ações intencionais, criativas e regenerativas.

6.2 Dinâmica da Espiral e adaptação evolutiva

O modelo da Dinâmica da Espiral, de Beck e Cowan (1996), reforça que cuidadores e organizações operam em níveis variados de valores e consciência, exigindo abordagens contextuais e flexíveis que respeitem sua etapa evolutiva, promovendo progresso para níveis mais integrativos e colaborativos.

7. Reflexões metafísicas e filosóficas para o cuidado contemporâneo

7.1 O cuidado como prática ética de resistência

Foucault (1988) destaca o "cuidado de si" como prática ética que resiste às pressões utilitaristas e mecanicistas das instituições modernas. Essa abordagem é fundamental para reconceber o cuidado do cuidador como um ato de empoderamento e autonomia. A partir da integração dessa perspectiva com a ética aristotélica das virtudes, compreende-se que o cuidado de si não é um gesto egoísta, mas uma prática contínua de excelência moral - um caminho para a realização da eudaimonia, onde o florescimento individual está intrinsecamente ligado ao bem comum.

Cabe ao Estado e às organizações liderarem uma mudança estrutural sustentada pela ética das virtudes, onde o cuidado é reconhecido como valor estratégico, prática institucional e compromisso com o bem comum. Promover uma cultura organizacional humana, Chaplin e Chisholm (2025) alertam para a gratitude trap - a armadilha emocional em que a gratidão, mal compreendida ou instrumentalizada, transforma-se em mecanismo de aceitação passiva e autoanulação - a partir da teoria do desamparo aprendido conforme preconiza Seligman (2022). Nessa dinâmica, o cuidador silencia suas próprias dores, acreditando que qualquer reivindicação comprometeria a nobreza de sua entrega pela necessidade de auferir lucros com plantões diversos, por exemplo. Essa distorção afasta o diálogo institucional e impede o reconhecimento justo das suas necessidades, criando um ciclo de invisibilidade e desgaste progressivo. (CHAPLIN E CHISHOLM, 2025)

Essa lógica se intensifica em contextos socioculturais marcados pelo excesso de dever e pela repressão emocional, como demonstrado no fenômeno emergente do "care killing" no Japão - termo que vem sendo utilizado para nomear casos em que cuidadores, submetidos a exaustão extrema, acabam cometendo homicídios seguidos de suicídio. Pesquisas recentes apontam que, nesses casos, o esgotamento não é apenas físico, mas também existencial: trata-se de uma falência do sistema de apoio que deveria sustentar o ato de cuidar. Nesse contexto, ao internalizarem expectativas irreais de renúncia absoluta e perfeição moral, muitos cuidadores chegam a um ponto de colapso, resultado direto de uma cultura que romantiza o sacrifício e minimiza a reciprocidade.

A armadilha da gratidão e o care killing compartilham o mesmo pano de fundo: a naturalização da sobreposição do cuidado como um dever incondicional, unilateral e silencioso. A problemática tende a se agravar à medida que a população do país envelhece sem o devido avanço na cultura do cuidado em todas as suas dimensões. Superar essa distorção requer coragem institucional para reconhecer que o verdadeiro cuidado não floresce da abnegação sem limites, mas do equilíbrio entre doação e sustentação - entre o valor da entrega e a dignidade de quem entrega.

Como visto, essa realidade não se restringe aos cuidadores formais, como médicos, enfermeiros ou psicólogos, mas também afeta profundamente os cuidadores informais - mães e pais solo, avós, tutores de pets, cuidadores de idosos, líderes comunitários ou religiosos, entre tantos outros. Ambos os grupos compartilham a vivência de um cuidado que, ao ser reiteradamente desprovido de suporte estrutural, reconhecimento simbólico e equilíbrio relacional, converte-se em fonte de adoecimento. A fronteira entre o formal e o informal se dilui quando observamos que a lógica da sobrecarga, da invisibilidade e da "gratidão sufocante" opera de maneira semelhante em diferentes contextos. Portanto, qualquer política, cultura organizacional ou proposta de transformação precisa reconhecer essa interdependência e atuar de forma sistêmica e integrada, promovendo a reciprocidade como fundamento ético universal do cuidado.

Considerações finais: O cuidado do cuidador como pacto civilizatório

Cuidar de quem cuida deve ser entendido como uma responsabilidade ética, política e social que transcende respostas reativas à síndrome do burnout. É um compromisso com a construção de um futuro onde o cuidado mútuo, a resiliência, o reconhecimento e o sentido existencial sejam pilares da vida coletiva.

A integração das teorias abordadas revela que cuidar de quem cuida envolve múltiplas dimensões - fisiológica, psicológica, relacional, espiritual e ética - que exigem abordagens inovadoras, multidisciplinares e integrativas. O convite aqui é evitar o mais do mesmo: ultrapassar as soluções paliativas e os discursos normativos que romantizam a abnegação, para promover transformações reais nas estruturas institucionais, nas práticas formativas, nas políticas públicas e também nas políticas organizacionais. É preciso criar ambientes onde o autocuidado seja legitimado, o reconhecimento seja cotidiano, os salários sejam justos e o florescimento humano se torne parte intrínseca da cultura do cuidado.

A NR-01 e as transformações da saúde ocupacional contemporânea oferecem uma oportunidade histórica para ressignificar o cuidado, promovendo culturas organizacionais e políticas públicas que reconheçam o cuidador como sujeito integral, digno de cuidado, respeito e desenvolvimento. Essa ressignificação implica ir além da mera conformidade normativa, promovendo ambientes de trabalho que integrem saúde física, bem-estar emocional, propósito, pertencimento e reconhecimento. Trata-se de consolidar uma ética organizacional pautada na interdependência, na escuta ativa e na corresponsabilidade - pilares fundamentais para sustentar práticas de cuidado mais humanas, resilientes e eficazes ao longo do tempo.

A mesma lógica aplica-se aos lares, onde muitas vezes a cultura do cuidado é romantizada e pouco estruturada. A conscientização sobre a importância do cuidado mútuo nas relações familiares e afetivas exige o cultivo de uma cultura de reciprocidade, com equilíbrio entre o dar e o receber. Quando o cuidado se torna unilateral ou imposto como dever moral absoluto, ele gera sobrecarga, adoecimento, invisibilização e esgotamento. Fomentar espaços domésticos que valorizem o reconhecimento, o diálogo e a divisão justa das responsabilidades é essencial para que o cuidado, tanto no trabalho quanto em casa, seja uma prática sustentada por vínculos saudáveis, dignidade e respeito mútuo.

Dessa perspectiva, torna-se imperativo imputar às empresas e às políticas públicas a responsabilidade de promover essa cultura do cuidado de forma transversal, contínua e estruturada - desde a tenra infância. Isso significa investir, simultaneamente, em estratégias pedagógicas e andragógicas que cultivem o valor do cuidado como competência essencial à vida em sociedade. Escolas, ambientes corporativos, espaços de formação profissional e políticas sociais devem integrar em seus currículos e práticas o desenvolvimento de habilidades emocionais, dinâmicas colaborativas, éticas e relacionais que sustentem o cuidado mútuo como eixo civilizatório.

Nesse esforço, os planos de parentalidade ganham destaque como instrumentos fundamentais: eles reconhecem e apoiam os desafios vividos por mães, pais e cuidadores em suas múltiplas configurações familiares, promovendo corresponsabilidade no cuidado com crianças e adolescentes e viabilizando uma conciliação mais saudável entre vida profissional e pessoal. A partir da legitimação do cuidado como valor e prática desde os primeiros vínculos sociais, esses planos contribuem para a formação de sociedades mais justas, empáticas e resilientes. Com esse novo paradigma, torna-se possível transformar o cuidado de quem cuida de uma demanda emergencial em um compromisso estrutural e permanente com o bem-estar coletivo, articulado por meio de um sistema multiportas que integra políticas públicas, práticas organizacionais e iniciativas comunitárias.

Por fim, destaca-se a urgência de enfrentar o fenômeno do "care killing", emergente no Japão, como alerta global sobre os efeitos extremos da negligência institucional frente ao sofrimento dos cuidadores. Os casos de homicídios seguidos de suicídio, protagonizados por cuidadores exauridos, evidenciam a falência de sistemas que romantizam a renúncia e ignoram os limites humanos. Superar esse cenário exige, além de políticas de contenção, a promoção ativa de ambientes sustentadores, nos quais o cuidado seja compreendido como via de mão dupla. Isso demanda o fomento de pesquisas interdisciplinares que explorem a correlação entre cultura, saúde mental, espiritualidade e políticas de suporte ao cuidador.

Neste contexto, o papel do Estado torna-se decisivo: cabe ao poder público assegurar a efetiva aplicação da NR-01 e liderar a formulação e a implementação de políticas públicas estruturantes que promovam o cuidado integral de quem cuida. Isso implica revisar e atualizar legislações, regulamentações e diretrizes que tratam da saúde ocupacional e mental, reconhecendo o cuidador como sujeito de direitos e promotor da vida coletiva. Políticas de prevenção, formação continuada, apoio psicossocial, reconhecimento institucional que inclui melhor remuneração e incentivos às organizações que adotam práticas sustentáveis de cuidado precisam ser ampliadas e fortalecidas.

Avançar nessa seara é, acima de tudo, reafirmar que o pacto civilizatório do nosso tempo começa - e se sustenta - por quem cuida.

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Luana B. Lourenço

Luana B. Lourenço

Mestre em Administração pelo IAG PUC-RIO, graduada em Direito e fundadora da Ocean Governança Integrada, da Ecoar Gente & Gestão e da Ecoar Escola de Negócios. Professora de pós-graduação e conselheira de administração da Rede Governança Brasil (RGB), é referência em Governança Humanizada no país. Possui sólida formação executiva pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e especializações em áreas estratégicas como Compliance, Direito Empresarial, Liderança, Psicologia Organizacional, Psicologia Positiva e Bem-Estar, Neurociências e Transformação Digital. Atuou no Conselho Consultivo do Pró Criança Cardíaca e liderou diversas iniciativas voltadas à governança pública e privada. Atua como mentora-docente no IGCP, coordena o PRONAGOV (Programa de Mentorias para Prefeituras Brasileira

Nelson Teich

Nelson Teich

Médico oncologista, ex-Ministro da Saúde do Brasil e coordenador do Comitê de Políticas Públicas da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). É consultor nas áreas de estruturação, operação, fusões e aquisições de empresas de saúde, além de atuar como advisor em Parcerias Público-Privadas e em startups do setor. Membro de conselhos empresariais, é professor da EBRADI, IGCP e do Instituto Israelita Albert Einstein. Possui MBA em Gestão de Saúde (COPPEAD/UFRJ), mestrado em Economia da Saúde (Universidade de York, Reino Unido) e formação executiva em Gestão e Empreendedorismo pela Harvard Business School. Fundador e ex-presidente do Grupo COI e do Instituto COI de Gestão, Educação e Pesquisa, integra também o corpo editorial do American Journal of Medical Quality.

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