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Da Constitucionalidade da lei 15.109/25 - Mudança do momento de pagamento das custas

O §3º do art. 82 do CPC autoriza a cobrança de honorários sem o recolhimento antecipado das custas.

quinta-feira, 3 de julho de 2025

Atualizado em 29 de julho de 2025 13:33

Com a publicação da lei 15.109/25, o art. 82 do CPC passou por uma alteração, para a inserção de uma previsão1 que autorizou que os advogados pudessem deixar de recolher custas para a propositura de ações e incidentes para a cobrança de honorários (sejam contratuais e/ou sucumbenciais).

Antes desta modificação, os advogados que desejavam ingressar com ações de cobrança de honorários (monitórias, cobranças, execuções e outras), deveriam recolher custas iniciais para o prosseguimento do feito, assim como os advogados que ingressassem com cumprimento de sentença para a cobrança de honorários sucumbenciais (honorários advindos das decisões judiciais), deveriam promover o recolhimento destas custas de forma prévia.

Independentemente de qualquer forma de cobrança, os valores relativos a estas custas recolhidas são objeto de reembolso pela parte vencida (réu/executado), conforme disposição do §2º2 do art. 82 do CPC.

Tal alteração foi amplamente festejada pelos advogados brasileiros que em diversos casos, eram obrigados a pagar e/ou adiantar valores para a cobrança de créditos inadimplidos de seus honorários.

Da divergência de aplicação

Com a modificação do art. 82 do CPC, observou-se uma dispensa legal de recolhimento prévio das custas, no momento da distribuição de ações e/ou em cumprimento de sentença, impondo ao juízo que promova a intimação do devedor para responder ao pedido, contudo, em alguns casos não é isso o que acontece. Isso por que, tem se tornado recorrente, a prolação de decisões judiciais que tem afastado a aplicação da regra prevista no art. 82, §3º do CPC, por entender que esta regra padece de inconstitucionalidade.

Há uma série de interpretações para se fundamentar a inaplicabilidade da norma, em grande parte o ratio decidendi que prevalece é de que as custas processuais gozam de natureza tributária e, portanto, a União não teria competência para legislar sobre tributos estaduais, por reconhecer que tal regra deve ser interpretada como sendo uma espécie de isenção, a exemplo:

Primeiramente, viola a autonomia federativa e a vedação à isenção heterônoma, insculpida no art. 151, inciso III, da CF/88, uma vez que a União Federal não detém competência para legislar sobre tributos estaduais, concedendo isenção ou qualquer outra forma debenefício fiscal, ainda que sob a roupagem de dispensa de adiantamento.3

Todavia, de acordo com o art. 151, III, da CF/88, é vedado à União "instituirisenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos municípios" (isenções heterônomas). As normas de isenção tributária, portanto, devem ser editadas pelo ente federadocom competência tributária para a instituição do tributo.4

Tal interpretação tem gerado diversas decisões reconhecendo a inconstitucionalidade do §3º do art. 82 do CPC e determinando que os advogados promovam o recolhimento das custas processuais nas demandas que tem como objeto a cobrança de seus honorários.

Neste contexto, temos um cenário em que embora o §3º do art. 82 do CPC seja expresso e taxativo sobre a dispensa do recolhimento das custas aos advogados, tal regra vem sendo afastada pela interpretação de que há uma inconstitucionalidade.

Do conceito de isenção

Com o devido respeito aos posicionamentos contrários, tal regra não pode ser interpretada como sendo uma hipótese de isenção, pelo motivo de que o conceito de isenção deriva de uma hipótese de exclusão5 (art. 175, I do CTN), na medida em que o beneficiado por esta hipótese fica dispensado do cumprimento desta obrigação.

Em atenção ao tema exposto, não há qualquer dispensa de recolhimento de custas nas ações em que há cobranças de honorários, uma vez que o legislador elegeu como o momento do seu recolhimento, o final do processo, cujo pagamento deve ser realizado pelo réu/executado, a saber: o advogado ficará dispensado de adiantar o pagamento de custas processuais, e caberá ao réu ou executado suprir, ao final do processo, o seu pagamento, se tiver dado causa ao processo (§3º, art. 82 CPC).

Nota-se que a redação da norma destaca que a "dispensa" é acompanhada de disposição sobre o momento em que o ato seria cumprido "adiantar", afastando a interpretação de que houve qualquer hipótese de seu afastamento e/ou exclusão de cumprimento desta obrigação de pagamento.

Quando se trata de isenção, o texto da norma deve ser interpretado de forma incondicional e literal6, que obriga o intérprete a observar não apenas o fragmento da norma mais seu conceito em sua completude.

Observa-se que, embora não esteja expresso na norma, o legislador trouxe o conceito de diferimento do momento de recolhimento das custas processuais, que passa a ser devida ao final do processo, por quem perdeu!

Importante destacarmos que não há dúvidas sobre a posição de quem sucumbe, isso porque, na hipótese de cobrança de obrigações inexigíveis, por exemplo, quem der causa a demanda permanece responsável pelo seu pagamento, seja de custas, seja de novos honorários.

Logo, se o advogado promove execução de direito inexigível, a regra de sucumbência se mantém vigente, uma vez que o art. 82, §3º do Código de Processo Civil trouxe apenas a modificação do momento do pagamento das custas e a sua responsabilidade, determinando que quem sucumbir, ao invés de reembolsar, deve arcar!

As custas são devidas pelas partes, com o objetivo de custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça (§2º, art. 98 da CF), podendo a regra processual (Federal) eleger tanto o momento (ao final), quanto por quem esta obrigação deve ser cumprida (pelo réu), sendo vedada a sua dispensa, de modo que somente o ente federado em atenção a sua competência (art. 24, IV da CF), pode exigir e/ou dispor.

Tal interpretação se faz necessária, pois afasta a atração dos precedentes do STF, que vem sendo amplamente suscitados, na medida em que diferentemente dos casos enfrentados pela Suprema Corte, em que houve a declaração de inconstitucionalidade de normas que continham em seu texto normativo a expressão literal de "isenção" (ADI 3.629, ADI 3.260 e ADI 6.859), estamos diante de uma hipótese de diferimento (recolhimento ao final).

Observa-se que, por se tratar de uma competência privativa da União Federal (art. 22, I, da CF), temos a autorização para que esta disponha sobre, dentre outra matérias, as regras processuais, incluindo o diferimento do recolhimento das custas processuais, que em sua aplicabilidade não tem o condão de mitigar a precisão contida no parágrafo 2º ao art. 98 da CF, que determina que ''as custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça''.

Da conclusão

Conclui-se, portanto, que não estamos diante da exclusão da obrigação de pagamento de custas processuais, mas sim de seu diferimento, não sendo uma hipótese de isenção, assim como, não há qualquer invasão ao campo de competência sobre a exigência de custas de seu destino.

A jurisprudência já começa a delinear o seu entendimento, conforme interpretação do desembargador Tavares de Almeida, que afastou a interpretação de hipótese de isenção, reconhecendo tal hipótese como sendo uma forma de diferimento, uma vez que a nova legislação não cria, majora ou isenta a taxa. Apenas altera o prazo para pagamento.7

Diante deste cenário, não há elementos para se discutir a constitucionalidade e/ou a legalidade da regra prevista no §3º do art. 82 do CPC.

_______

1 CPC. Art. 82. § 3º Nas ações de cobrança por qualquer procedimento, comum ou especial, bem como nas execuções ou cumprimentos de sentença de honorários advocatícios, o advogado ficará dispensado de adiantar o pagamento de custas processuais, e caberá ao réu ou executado suprir,ao final do processo, o seu pagamento, se tiver dado causa ao processo.

2 CPC. Art. 82. § 2º A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou.

3 1ª vara Cível da Comarca de Ibitinga. Processo n. 0001023-78.2025.8.26.0236, decisão de fls. 58/60

4 2ª vara Cível da Comarca de Monte Alto. Processo n. 0000980-36.2025.8.26.0368, decisão de fls. 65/67

5 CTN. Art. 175. Excluem o crédito tributário:

I - a isenção;

6 CTN. Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

II - outorga de isenção;

7 TJSP; Agravo de Instrumento 2149611-22.2025.8.26.0000; Relator (a): Tavares de Almeida; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ibitinga - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/05/2025; Data de Registro: 22/05/2025

Harrisson Barboza de Holanda

Harrisson Barboza de Holanda

Advogado. Pós-Graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas - SP. Sócio do escritório Holanda Advogados.

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