MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. O agravo do art. 1.042 do CPC/15: Técnica, obstáculos e racionalidade recursal

O agravo do art. 1.042 do CPC/15: Técnica, obstáculos e racionalidade recursal

Advogado, atenção ao art. 1.042: o agravo que pode (ou não) abrir as portas dos tribunais superiores. O erro na via recursal ou impugnação genérica pode sepultar seu recurso.

quarta-feira, 16 de julho de 2025

Atualizado às 11:27

A partir da reforma operada pela lei 13.256/16, consolidou-se no sistema processual brasileiro uma etapa de controle mais rigorosa para o acesso aos Tribunais Superiores.

É nesse contexto que se insere o agravo previsto no art. 1.042 do CPC/15, instrumento destinado a desafiar a decisão da presidência ou vice-presidência do Tribunal recorrido que inadmite o recurso especial ou extraordinário.

Não se trata de um recurso voltado à reapreciação do mérito da controvérsia, mas de um mecanismo de superação do juízo negativo de admissibilidade, operado em sede de controle prévio pelo tribunal de origem.

A questão do cabimento do agravo do art. 1.042 do CPC

Seu cabimento está condicionado à inexistência de fundamento baseado na jurisprudência vinculante (repercussão geral ou recursos repetitivos). Nesses casos, a sistemática recursal transfere ao jurisdicionado o ônus de manejar agravo interno (art. 1.021 do CPC), dentro do próprio tribunal local.

Em razão disso, a correta identificação dos fundamentos da decisão agravada é etapa técnica essencial. 

A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem reiteradamente afastado a aplicação do princípio da fungibilidade entre os dois tipos de agravo, considerando erro grosseiro a utilização inadequada da via recursal, o que, por si só, acarreta a preclusão recursal.

O duplo fundamento de inadmissibilidade

A matéria torna-se ainda mais delicada quando se trata de decisão complexa, com duplo fundamento de inadmissibilidade. Suponha-se, por exemplo, que a presidência do Tribunal local afirme, simultaneamente, a ausência de prequestionamento e a incidência de entendimento vinculante.

Nesse caso, entende-se que a parte deve interpor dois recursos distintos: agravo interno quanto à aplicação do precedente obrigatório, e agravo nos próprios autos quanto aos demais fundamentos da inadmissibilidade. Essa duplicidade, tem sido reafirmada pela jurisprudência e por enunciados como o 77 das jornadas de direito processual do CJF, que aponta que:

Para impugnar decisão que obsta trânsito a recurso excepcional e que contenha simultaneamente fundamento relacionado à sistemática dos recursos repetitivos ou da repercussão geral (art. 1.030, I, do CPC) e fundamento relacionado à análise dos pressupostos de admissibilidade recursais (art. 1.030, V, do CPC), a parte sucumbente deve interpor, simultaneamente, agravo interno (art. 1.021 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos recursos repetitivos ou repercussão geral e agravo em recurso especial/extraordinário (art. 1.042 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos fundamentos de inadmissão por ausência dos pressupostos recursais.

Necessidade de impugnação específica

Outro ponto sensível é a exigência de impugnação específica de todos os fundamentos da decisão agravada. A Corte Especial do STJ, por exemplo, tem entendido que a decisão que inadmite o recurso especial não se estrutura em capítulos autônomos, mas em um único dispositivo, de modo que o agravante deve atacar integralmente os fundamentos utilizados.

É dizer, "a decisão de inadmissibilidade do recurso especial não é formada por capítulos autônomos, mas por um único dispositivo, o que exige que a parte agravante impugne todos os fundamentos da decisão que, na origem, inadmitiu o recurso especial" (AgRg nos EAREsp 1.872.085/SP, relator ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Corte Especial, julgado em 9/11/21, DJe de 24/11/21).

Logo, a inobservância desse ônus argumentativo compromete o conhecimento do agravo, à luz de súmulas como a 283 do STF e 182 do STJ.

Processamento do agravo do art. 1.042 do CPC

O próprio processamento do agravo revela peculiaridades: a petição é dirigida ao presidente do tribunal de origem, que apenas poderá retratar-se. Em caso negativo, os autos devem ser remetidos ao tribunal superior, não cabendo ao tribunal de origem realizar novo juízo de admissibilidade.

Ainda assim, admite-se, de forma excepcional, a recusa do processamento em hipóteses de manifesta inadmissibilidade, conforme decidido pela Corte Especial do STJ na Rcl 41.229/DF.

Nesse caso, diz o STJ que, guardadas as devidas proporções, possibilita-se, excepcionalmente, ao tribunal recorrido obstar o seguimento do agravo em recurso especial, quando configurado evidente erro grosseiro e, desse modo, o seu manifesto descabimento, sem que isso caracterize usurpação de competência (Rcl 41.229/DF, relator ministro Marco Aurélio Bellizze, 2ª seção, julgado em 11/5/22, DJe de 17/5/22).

Por fim, destaca-se a previsão do § 5º do art. 1.042 do CPC/15, que permite o julgamento conjunto do agravo com o recurso especial ou extraordinário, assegurando à parte a prerrogativa de sustentação oral, conforme previsto no Estatuto da Advocacia.

No entanto, tal faculdade ainda encontra resistências práticas, sobretudo nos casos em que o agravo é julgado monocraticamente, sem cognição de mérito.

De todo modo, como se pode imaginar, em um sistema marcado por filtros, precedentes e multiplicidade de controvérsias, a utilização do agravo do art. 1.042 exige técnica, precisão e leitura atenta das decisões de admissibilidade.

Manasses Lopes

VIP Manasses Lopes

Advogado e professor universitário. Especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), em Brasília.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca